Cartas a JV – 14

Francisco Martins Rodrigues

Carta a JV – 14

14/2/1997

Caro Amigo:

Os teus materiais cá chegaram em boa ordem. No nº 57 metemos um extracto das “Chinoiseries”, dum tal Charles Reeve, conheces? Elucidativo. Sobre a greve dos condutores de camiões, tivemos um artigo programado para o nº 58 (está a sair), demos os teus e outros elementos ao MC (suponho que conheces), mas ele envolveu-se de tal forma num comentário a um recente livro do Dr. Álvaro Cunhal que acabou por nos deixar descalços quanto aos camionistas. Cunhal é fundamental, claro, mas não sei se foi boa a troca. Eu não li o livro do homem, mas a televisão tem-lhe dado algum reclame e ouvi que vai sair uma grande entrevista com ele no Jornal de Letras. O homem quer acabar a carreira como literato, pulir a imagem para a posteridade. E ele e o Soares, a tomarem as últimas disposições para garantir que o funeral será muito concorrido. Aprenderam com o Mitterrand.

Voltando aos camionistas. Agora são os espanhóis que estão a bloquear as estradas. Âs novas realidades proporcionam possibilidades inesperadas de paralisar e economia dum país. E se uma (futura) Federação dos Camionistas Europeus resolvesse bloquear as estradas do continente? O que a televisão dá da greve em Espanha são os protestos dos nossos compatriotas camionistas, ansiosos por trabalhar e indignados com os grevistas que lhes partem vidros, furam pneus, etc. Ontem, dia 13, estimulados pelo ambiente, alguns dos nossos camionistas tentaram bloquear a estrada à entrada de Vilar Formoso mas a GNR atirou-lhes com os cães para cima e a tentativa fracassou, pelo menos para já. Dizia um deles no telejornal: “Não está certo; em França e em Espanha bloqueia-se as estradas e a polícia não intervém; aqui atiram-nos logo com os cães”. É que ele não sabe que à Europa só vamos buscar o que é bom, não os hábitos relaxados. Polícia aqui não brinca. Apareceu mais um rapaz morto, depois de ter sido levado para a esquadra, em Vila Franca. Parece que estava bêbado num bar e molhou um guarda com cerveja. O que é que ele queria? De resto, os polícias juram que não lhe fizeram mal nenhum. Aguarda-se o resultado da autópsia.

Quanto ao material sobre a Guiné-Bissau, lamentavelmente não temos para lá contactos, não lhe pudemos dar destino. As nossas edições é que estão a coxear dos dois pés. O distribuidor impõe-nos condições cada vez mais duras, quer asfixiar-nos, e nós não vemos possibilidade de lançar nada novo pelos tempos mais próximos. O livro do Che “Viagem pela América” vendeu razoavelmente, mas já o último, “Os meus anos com o Che”, da ex-mulher, está a sair pouco. Cada livro é um agravamento dos prejuízos, nada a fazer. Precisávamos de uma rede alternativa de distribuição, apontada para o público que ainda consome coisas destas. A revista é que não pode falhar; por acaso, este número vai sair com duas semanas de atraso, porque os meus problemas familiares têm-me bloqueado.

Se calhar queres que te fale da actualidade nacional, mas não estou em condições. Entre enredos da bola, enredos internos dos partidos, enredos da droga, os telejomais são desmobilizadores. PS e PSD ultimam o acordo para a revisão da Constituição; reina um saudável consenso democrático, pelo menos… Podes pelo menos dormir descansado: quando vieres a férias encontras tudo na mesma. E quando vens? Dá notícias. Abraços nossos para ti e cumprimentos para a S.

Cartas a JV – 11

Francisco Martins Rodrigues

Carta a JV – 11

9/2/1994

Caro Amigo:

Agradeço os jornais e documentos que tens mandado.. A P.O. deve vir hoje da tipografia e ficamos com um breve período de pausa, para respirar e sobretudo ler material que se vai acumulando. O teu reparo sobre o homossexualismo chegou quando se estava a fechar a redacção e ainda deu para o metermos em carta do leitor. Aguardemos as reacções. Se queres que te diga, nunca nos dedicámos a discutir muito o assunto e creio que existem opiniões diferentes entre nós. Talvez a tua carta nos obrigue a discutir o problema. A posição que saiu no artiguinho que referes não pretendeu obviamente dizer que a homossexualidade seja uma doença, mas apenas apontar o seu florescimento nas prisões como um dos índices da situação degradante em que os presos se encontram, privados duma vida sexual normal. Não concordas?

Por cá, a situação económica agrava-se lentamente, embora não tanto como alguns previam. O desemprego oficial é de 6% mas este número tem pouco a ver com a realidade. Será 8%, 10%? O funcionalismo público vai fazer a segunda greve no espaço de um mês, porque o governo pretende dar-lhe um aumento de 0% a 2%, omitindo a inflação, ou seja, um “aumento” negativo. Dos sectores operários há algumas acções de protesto, mas até agora dispersas. As duas centrais estão a radicalizar a linguagem mas não mais do que isso, é só para absorver o descontentamento. Qualquer delas, mas sobretudo a UGT, estão escandalosamente vendidas às verbas da Comunidade, a pretexto dos cursos de formação profissional, e ficam na dependência do governo para embolsar as massas. De modo que berram muito mas arrastam os pés e procuram dispersar as lutas. É a modernização que chega à ocidental praia lusitana.

Será que nos encontramos na sessão do aniversário da Batalha em 26 deste mês? Eu vou lá. Abraços meus,  da Ana e da Beatriz, para ti e para a S.

Cartas a JV – 10

Francisco Martins Rodrigues

Carta a JV – 10

8/12/1993

Caro Amigo:

Não sei donde partiu o atraso mas a tua carta datada de 22 Novembro só me foi entregue no Correio em 6 Dezembro. Já temos a P. O. na tipografia e não nos foi possível incluir nada dos elementos que mandaste. Sobre a greve da Air France, felizmente, o MV mandou uns comentários que publicámos com destaque. Aqui também houve “bernarda” com os trabalhadores da TAP, mas o pessoal mostrou muito menos combatividade que o daí. De qualquer modo, o apertar da crise obriga o ambiente social a mudar lentamente. Para já, quem aparece na ribalta são os estudantes, cujas manifestações devem ter obrigado o Cavaco a uma remodelação governamental,, que deu um sinal de fraqueza. O homem até agora fazia gala da sua firmeza de rocha, de modo que esta cedência talvez lhe vá tirar muita da confiança quase supersticiosa que a pequena burguesia tinha nele – a admiração pelo “homem forte”. A oposição está ao ataque, tentando capitalizar tudo o que puder dos resultados das eleições autárquicas – a campanha eleitoral, desta vez, é um carnaval imbecil, com “debates” na televisão com as claques a gritar por um ou por outro dos candidatos e a agitar bandeirinhas, numa algazarra infernal em que se faz tudo menos debater seja o que for. Um espectáculo miserável, que dá bem a medida da democracia a que temos direito.

De qualquer modo, por enquanto é cedo para saber se é irreversível a crise do governo. Só se a situação económica tiver agravamentos dramáticos. Para já, além da TAP, houve alguns protestos operários (que a imprensa, como de costume, “desdramatiza” o mais possível), nomeadamente uma marcha de fome de vidreiros da Marinha Grande para Lisboa e uma greve “selvagem” dos portuários de Setúbal, greve na Lisnave, etc. As centrais não assinaram a concertação social (ou 4% ou nada, disse o governo) e falam em greve geral mas de forma mole e indecisa. Em Espanha já está marcada para Janeiro, mas lá a situação é sempre mais agitada e desperta do que aqui. Aqui, num resumo que pode ser muito subjectivo, eu diria que o governo está mais ameaçado pelos estudantes, médicos, juízes, empresários agrícolas, do que pelos operários e assalariados. E no entanto, a situação destes vai-se tomando dramática. Coisas…

Pela nossa parte, de novo apenas um convite que recebemos, a Ana e eu, para intervirmos numa semana de debates sobre o centenário de Mao, realizada pela Biblioteca-Museu da Resistência, organismo dependente da Câmara de Lisboa. Outros participantes (em dias diferentes!) são o Arnaldo de Matos, Pacheco Pereira e Pedro Baptista (ex-OCMLP). Pelo menos, estão convidados, não sei se vão. Decidimos aceitar, embora o público seja restrito, para valorizar o Mao revolucionário dos primeiros anos e fazer fogo contra a bronca ironia com que os tipos do PS e do PC falam da revolução chinesa, como se fosse uma anedota.

Espero que a Fora do Texto mande o teu livrinho (costumam mandar sempre) e far-lhe-emos referência sem falta. Também espero poder aproveitar a tua sugestão de publicar algum extracto dos teus artigos como carta. Faço votos por que tudo vos corra bem. A P.O. deve estar a sair da tipografia. Abraços para ti e para a S. de todos nós.

Cartas a HN – 17

Francisco Martins Rodrigues

Carta a HN – 17

9/2/2002

Velho H

Tenho aqui duas cartas tuas recentes e vou tentar responder às questões que colocas e dar-te algumas notícias.

Teu artigo – Parece-me extenso mas ainda não tive oportunidade de o estudar. Vou ler e dir-te-ei depois o que penso.

Curso de marxismo em Bruxelas – O MV já me falou com interesse desse curso onde esteve há dois anos, julgo. Leio aqui o jornal desse partido, que é de facto radical, dentro da área dos “revisas duros”, muito mais consistente por exemplo do que o Avante do meu amigo Cunhal. De qualquer modo, sendo claramente anti-imperialistas, não temos dúvidas de que são reformistas e que têm uma ideia muito sinistra do que seja o socialismo. Isso basta para sabermos que não são do nosso campo. Terá interesse o curso? Eu, se tivesse disponibilidade, ia assistir, pela curiosidade de ver como expõem as questões centrais do marxismo e até para activar as objecções e críticas do nosso lado. Nesta época de deserto quase total no campo do marxismo, tudo o que proporcione debate e luta de ideias pode ser frutuoso. Era bem bom se tu ou o Manuel, ou os dois, redigirem um comentário sobre o que viram, o que vos pareceu aceitável e o que acham errado, etc. Era uma boa malha para a PO. Agora tu é que verás se compensa a deslocação, a despesa e o tempo gasto.

Voz do Trabalho – São naturais as tuas preocupações com o andamento do projecto. De facto, as coisas têm patinado um bocado, houve uma doença e ausência do M (já voltou), afastamento (temporário?) dos elementos ligados ao Bloco de Esquerda e que se meteram a fundo na campanha eleitoral deles (e agora já estão metidos noutra) e uma certa indefinição sobre o carácter da folha, com discussões sobre se devia ser mais política ou mais dedicada às lutas económicas.

Por tudo isto a correspondência, os envios do jornal, etc., têm andado um bocado ao deus-dará. Saiu em Dezembro o n° 4 (que pelos vistos não recebeste) e está a sair o n° 5. Vou fal ar com eles para transmitir as tuas preocupações e pedir que te enviem exemplares do 4 e do 5.

Af, Leo – Numa reunião de redacção da PO, em Novembro, foram feitas algumas criticas a artigos que eles tinham escrito: o do Leo sobre o 11 de Setembro, e o do Af sobre um subsídio de Natal igual para todos. Os camaradas reagiram mal às críticas e não quiseram alterar os artigos. Depois disso não vieram a mais reuniões. Lamentamos e esperamos que reconsiderem. São poucos os que participam no colectivo e não gostamos de ver camaradas afastarem-se mas não podemos prescindir de discutir abertamente as colaborações de cada um.

 Entrevista Argentina – É pena que não se consiga. Como verás na PO 83, que aí chegará dentro de uma semana, juntámos um comentário vindo do Brasil com um artigo que a Ana fez a partir de textos que nos chegaram pela Internet. O assunto ainda talvez mereça mais análise na próxima PO.

(…)

Leituras – Não conheço nenhum dos dois livros que estás a ler sobre a I Internacional e o movimento operário francês. Também não prevejo tão cedo disponibilidade para me dedicar ao assunto. São tantos os livros, artigos, etc. que vão ficando para trás que às vezes desespero, mas sou obrigado a fazer opções todos os dias entre o que gostaria e o que posso fazer.

PO – Vais recebê-la por estes dias. Tem uma declaração do colectivo sobre as eleições, justificando por que não votamos, a política que vai ser seguida já está feita pelas “instâncias superiores”    e os partidos  são  os comissários políticos ás ordens de Bruxelas. A possibilidade de mudança não está no voto, está na intervenção directa dos trabalhadores, e essa é que tem faltado de há bastantes anos para cá, etc.

Galiza – Nos dias 13-15 Fevereiro reúne-se na Galiza uma Cimeira dos ministros da Justiça e do Interior da UE para tratar da “segurança”. Os camaradas galegos do NÓS Unidade Popular (que vieram ao nosso encontro de Dezembro) organizam uma contracimeira nos mesmos dias, com debates e manifestações. Vão estar presentes 2 ou 3 camaradas nossos para intervir no terceiro dia, sobre questões laborais. Mando-te aqui o último número que recebemos do jornal do partido ML deles, para teres uma ideia. São pelo menos bastante activos.

Por agora é tudo. Um abraço e até breve  

Cartas a HN – 8

Francisco Martins Rodrigues

Carta a HN – 8

21/10/1996

Caro Camarada:

Estou a responder às tuas cartas de 3 e 6 de Setembro, desejando que te encontres de saúde e com a energia do costume. A P.O. 56 está na tipografia, esperamos poder fazer a distribuição amanhã. Como verás quando a receberes, houve desta vez acumulação de textos grandes, que nos obrigaram a retirar várias colaborações, entre elas o depoimento que enviaste. Fica para a próxima, tal como um artigo meu que tenho vindo a trabalhar, sobre o tema do Imperialismo. O Bitot é muito interessante e esclarecedor, mas no segundo livro dele, “Le Communisme n’a pas encore commencé” (que só existe em francês), apresenta, quanto a mim, uma forte incompreensão do fenómeno do imperialismo. O AN, embora lhe faça algumas críticas acertadas, na troca de cartas que publicamos nesta P.O., também acaba por lhe fazer algumas concessões e desvaloriza o trabalho de Lenine a este respeito. Espero por isso poder publicar na próxima P.O. um artigo claro sobre este assunto. Se se percebe a mecânica da concentração do capital mas se omite a espoliação e opressão dos países ricos sobre os países pobres, vamos por mau caminho. E muito fácil a quem vive na Europa esquecer-se que o avanço capitalista repousa sobre biliões de miseráveis do Terceiro Mundo.

Quanto ao depoimento-proposta que assinas em conjunto com o JM, ele retoma uma preocupação que já exprimiste anteriormente numa outra colaboração saída na P.O.: tomar medidas práticas para sair do impasse a que chegámos, atrevermo-nos a criar um núcleo orgânico, mesmo pequeno como seria esse Centro Marxista Popular, para tentar crescer a partir daí. Só posso apoiar a ideia e espero que a publicação do artigo desperte algumas vontades adormecidas. Tencionamos fazer até ao fim do ano um encontro com alguns camaradas e aí tentaremos ver a receptividade à ideia. Mais não te posso dizer, pois como deves ter constatado quando da vossa visita a Portugal, o problema actual do grupo P.O. é estar reduzido a tão poucas pessoas activas que fica esmagado só pelas tarefas da edição da revista, de um ou outro livro e da gestão da gráfica. Fizemos em Junho uma pequena reunião e os resultados não foram nada animadores, pois amigos que outrora já foram activos e agora estão desmobilizados só abrem a boca para pôr defeitos à P.O. e quando solicitados a colaborar no melhoramento, respondem que a sua vida não permite…

Enfim, creio que a atitude destas pessoas só se modificará quando algum acontecimento da luta de classes, nacional ou internacional, as sacuda do torpor e desânimo em que caíram. Há que confiar que gente nova também aparecerá, por força. Mas voltando ao teu artigo: proponho-me portanto incluí-lo na próxima P.O., fazendo alguns melhoramentos de redacção, desde que me dês autorização para isso. Para além das emendas que indicas na tua carta, eu aconselhar-te-ia, em futuros escritos, a usares mais a frase curta, porque as ideias encadeadas umas nas outras em frases muito extensas obrigam o leitor a muito maior atenção e daí até ao cansaço e ao pôr a leitura de lado vai só um passo…

A entrevista com a MM vem já neste número. Peço que lhe dês as minhas saudações e o pedido de que nos prepare um artigo sobre a condição da mulher trabalhadora na Suíça, como ela diz no fim da entrevista. Factos concretos, sem preocupações de teorizar muito. Pode ser bem interessante.

Assinatura P.O. — a tua assinatura está válida até ao nº 59, não precisas de te preocupar. Quando estiver prestes a caducar receberás um postal de renovação. Espero que nessa altura decidas assinar, caso contrário vou aí ajustar contas contigo.

Livro soviético sobre a religião — não sei do que se trata, lamento não te poder ser útil.

História do PC — já vem neste número um primeiro artigo, agora quero ver se mantenho a passada; material não me falta, com base na minha experiência. Vamos a ver se os artigos não ficam muito chatos, os leitores de hoje já pouco se interessam por essas histórias de outros tempos.

Dinossauro — o monstro sai da toca na próxima quinta-feira, para apresentar mais um trabalho: a novela “Kianda – O Rio da Sede”, do capitão Álvaro Fernandes, que foi pessoa muito em destaque na altura do Verão Quente de 75 pelo seu apoio à corrente da extrema-esquerda. São episódios da guerra colonial contados por quem lá esteve; a piada é ele dar alternadamente a luta vista do lado dos portugueses e do lado dos guerrilheiros. Pode ser que mais algumas cabeças deste país comecem a perceber que aquilo foi um crime colectivo em que não só o Salazar teve culpas. Agora que o ambiente por aqui é todo de regresso a África, creio que o livro é oportuno. Mando-te para já 3 exemplares, para tu e o Z angariarem por aí alguns compradores. As próximas edições Dinossauro ainda não se sabe quais são e quando são, tudo depende das massas, que estão curtas…

Jornais suíços — recebemos a batelada e vi que o Quotidien é progressista, mas para a próxima agradeço que mandes só os recortes do que te parecer mais útil para nós. Recebemos vários números do Solidarité mas só o que tu nos mandaste, não temos nenhuma assinatura.

Contraponto — Combinámos com o MV Vaz ele continuar em Paris a coligir os materiais, fazer e expedir pelo correio (o que ele diz que pode conseguir sem grande despesa), dando-nos a conhecer previamente o conteúdo de cada número. Aguardo agora notícias dele a este respeito, vou-lhe escrever.

Máquina de escrever eléctrica — Esse artigo está muito desclassificado nesta era dos computadores. Ainda não me informei mas vou saber e digo-te.

Marx e Engels em português — Conhecermos o seguinte, além do Capital . ——————- . Queres algum   deles?

Por agora é tudo. Aceita um abraço

Cartas a JM – 3

 

Francisco Martins Rodrigues

Carta a JM – 3

24/5/1986

Camarada:

Respondemos à tua carta de 3/3 que recebemos com muito atraso porque tinha ido para a Rua de São Tomé, donde já saímos há uns meses. Mudámo-nos para uma casa maior, mas onde trabalha exclusivamente a nossa empresa gráfica. Deves por isso dirigir toda a correspondência a (…).

Também nós lamentamos muito o atraso em estabelecermos um contacto mais estreito. Quando o ZB esteve aí a trabalhar no Verão, mandámos um telegrama para a tua antiga morada a propor um encontro, mas veio devolvido com a indicação de “desconhecido”. O B chegou a procurar-te lá mas não conseguiu nenhuma informação a teu respeito. De modo que ficámos à espera que desses notícias. Actualmente, o B já regressou e a possibilidade de contacto entre nós será precisamente nas tuas férias, se te deslocares a Portugal. Seria muito importante conseguir discutir um bocado.

Tínhamos inicialmente a nossa 3ª Assembleia anual marcada para 27/28 de Junho, mas devido ao período eleitoral que se aproxima e que vai exigir de nós algum esforço, resolvemos adiá-la para Outubro. Não será por isso viável a tua participação na assembleia (supomos que vens em Agosto?) mas isso não impedirá de fazermos umas reuniões de debate, conheceres uns tantos camaradas e aperceberes-te melhor da situação por cá, do que é a OCPO e do que andamos a fazer. As condições de trabalho para uma força comunista revolucionária são neste momento péssimas em Portugal, devido ao ambiente de desmoralização que atravessa o movimento operário e a debandada reformista geral, que também já mina as fileiras do PC(R) e UDP. Cá vamos resistindo e tentando abrir espaço, baseados no debate teórico da PO e nalguma actividade sindical. O que é importante é não darmos o flanco a tendências de capitulação e aguentarmos o tempo que for preciso até a onda virar. Penso que temos um núcleo capaz de aguentar e furar.

Tudo isto teremos que discutir calmamente para tu saberes até onde deve ir a tua ligação à OCPO e o que poderás fazer em apoio deste projecto. É claro que o ideal seria tu fixares-te aqui em Portugal mas possivelmente não terás segurança de emprego. Assuntos para discutir, diz-nos rapidamente quando pensas chegar aqui e como nos poderemos encontrar. Um sítio aonde te poderás dirigir é à empresa, na Rua Frof. Sousa da Câmara, 166, Lis- boa (às Amoreiras-Campolide). Se houver desencontro, deverás ligar para … (empresa) ou para minha casa, …. Quanto aos materiais que pedes, fizemos seguir uma encomenda que já deves ter recebido, com factura junta. O valor do teu cheque foi de 5.520$00. Da “Tribuna Comunista” só enviámos o nº 9, com as resoluções da 2ª Assembleia; como os outros tratam de questões internas, não achámos bom enviá-los pelo correio. Poderas lê-los aqui, assim como obteres toda a informação sobre a nossa vida. Quanto ao jornal “Tribuna Operária”, não registámos a assinatura que pedes porque tem por enquanto uma saída irregular. Está agora para sair um nº que te enviaremos.

Enviamos junto um manifesto que distribuímos aqui e a que alguns jornais se referiram, propondo uma coligação eleitoral de esquerda. Não tivemos força para aglutinar os pequenos grupos de esquerda nesta coligação, como seria de prever. Os revisas, assim que souberam das negociações, trataram de ganhar um dos grupos (trotskista) oferecendo-lhe lugar nas suas listas; os outros dispersaram-se, por sectarismo de grupo e rivalidades, mas fundamentalmente por recearem aparecer a disputar publicamente espaço à esquerda do PCP. Enfim, estamos muito crus em todos os sentidos e somos ainda muito poucos para dar batalha a sério ao reformismo. Mas estamos na brecha.

No plano internacional, temos contacto com alguns partidos e grupos comunistas que romperam ou estão a romper com a corrente albanesa, cada vez mais amorfa. Contudo, também nessa frente as perspectivas são de uma luta prolongada, com poucas vitórias e curto prazo.

É tudo por agora. Ficamos a espera de notícias tuas, e sobretudo que nos apareças por aí um dia destes para discutirmos um bom bocado. Um grande abraço

 

PS – Se passares em Paris, poderias contactar o MV (conheces?). Mora na (…) Paris.

 

Francisco Martins Rodrigues

Carta a LC – 7

31/1/1996

Caro Amigo:

Tenho recebido as tuas cartas, recortes e os 100 marcos, que foram para renovação da tua assinatura. Já tens a revista assegurada pelos próximos dois anos! Aproveitei alguns dos elementos que mandaste para a P.O. 53, que está pronta e vai amanhã para a tipografia. Depois me dirás se te agrada.

É claro, sabemos que a nossa posição abstencionista desagradou a bastantes leitores, que achavam que o voto no PS se justificava para assegurar a derrota do Cavaco. Nós, sendo anticavaquistas ferrenhos e participando em todas as campanhas para deitar o PSD abaixo, só não participamos nessa de ir pôr o voto pelo PS, em que não acreditamos nem um poucochinho. A política é toda a mesma – é a que vem de Bruxelas. Agora mesmo, nas negociações da concertação social, o novo governo fez o que faria o Cavaco: 4,5% de aumentos, a troco da flexibilização dos horários e da polivalência de funções. Uma sacanice para agrdar aos grandes capitalistas. Por cá, tudo bem. E continuo à espera dos teus recortes e informações. Um abraço

Cartas a LC (5)

Francisco Martins Rodrigues

Carta a LC – 5

9/2/1994

Caro L:

As tuas notas vieram bem a propósito e foram publicadas como carta de Hamburgo. Se quiseres continuar, teremos todo o interesse em manter uma pequena secção. Seria interessante que contasses algo dos trabalhadores portugueses aí, como vivem, como se dão com a crise, que interesses políticos e culturais têm, etc. O comentário sobre os turcos (assinado com pseudónimo) teve que ser retirado por falta de espaço, pois chegaram colaborações à última hora; espero que saia no próximo número. Dentro de dias receberás a revista e depois dirás as tuas impressões. Recebemos os 50 marcos e renovámos a tua assinatura, que fica válida até ao nº 47, ou seja, por mais um ano). Agradecemos a tua mensagem de Ano Novo.

Não publicámos o conto do teu amigo brasileiro e espero que ele compreenderá que não nos dedicamos à literatura, apenas estamos a manter a secção de poesia na contracapa. Já não é a primeira colaboração literária que recusamos mas não queremos entrar por um espaço que não é o nosso.

E a tua saúde? Espero que depois de tantos contratempos, estejas a recuperar de vez. Aceita um abraço amigo

Cartas a PA – 6

Francisco Martins Rodrigues

Carta a PA (6)

14/12/1986

Caro Camarada:

Há muito que não nos escrevemos. Como vais? A nossa revista tem continuado a sair, vai ser posto agora à venda o nº 7. Decidi enviar-te este número, até porque gostaria de conhecer as tuas opiniões acerca de um artigo sobre Staline que publicámos. Esforçámo-nos por fazer uma crítica pela esquerda ao stalinismo, sem concessões à posição habitual de social-democratas, trotskistas, etc. Veremos se o conseguimos.

Não te temos enviado a revista regularmente porque as despesas são muitas e esperávamos que tu fizesses uma assinatura. Infelizmente, aquele amigo de que tinhas falado que estava em Lisboa e tinha umas libras para nós não nos contactou. Não podes enviar-nos a importância de uma assinatura?

 Também gostaríamos de continuar a receber a “New Left Review” que há muito não vemos. E também, se possível, o seguinte que vimos anunciado num jornal inglês:

The revolutionary road to communism in Britain (Manifesto do Revolutionary Communist Group, Larkin Publications – BCM Box 5909, London VCIN 5xx

Eizemos o pedido pelo correio mas até agora não obtivemos resposta.

Enviamos juntamente com a “PO” nº 7 exemplares do jornal “Tribuna Operária”, cuja publicação iniciámos, e do boletim “Denúncia”, de solidariedade com os presos políticos, iniciativa em que colaboramos.

Quando teremos ocasião de nos ver? Pensas vir a Lisboa? Escreve a dar notícias da tua vida e actividades. Com os desejos de um bom Ano Novo, aceita um abraço

Cartas a MV – 29

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (34)

15/4/1992

Caríssimo:

Agora que a P.O. 34 foi para o correio, já posso pôr a correspondência em dia. Estás recomposto do desastre de ter perdido a bagagem? E de saúde, tudo bem? Eu continuo na maior.

P.O. – Espero que já tenhas recebido os 2 exemplares pedidos da P.O. 33. Da P.O. 34 seguiram 5 para a tua morada, mais um para o “Albatroz”. Como deves observar, estamos com dificuldade para fazer avanços teóricos. Falta de tempo, falta de gente. Aproveitei as tuas notas sobre o Amazonas e pus o teu nome a assinar comigo um artigo sobre o assunto. Correcto? Agora fico à espera de mais produção tua para o próximo nº, até 15 de Maio. Não esqueças!

Caso Joel Lamy – Fiz um artigo na P.O. 34 e enviei-lhe um postal para a prisão.

Marrocos – Com os materiais que me enviaste, fiz cartas às “forças vivas” cá da terra, desde o presidente da República, Assembleia, Amnistia Internacional, agência Lusa, jornais, denunciando as torturas, etc. e pedindo divulgação. Silêncio sepulcral! Ninguém disse nada, deve haver recomendações para não desfeitear sua majestade o torcionário em vésperas de visita (ainda não foi marcada data). Entretanto, recebi mais correspondência de Marrocos e vou fazer mais uma circular, a ver se furo o bloqueio.

Albatroz – suponho que estejas a lutar para o pôr na rua. Não escrevi nenhuma colaboração porque também não me deste um ultimatum com uma data precisa, e a tendência é para ficar à espera do último prazo. Francamente, também não estou a ver o que interesse mais para os teus leitores. Dá-me um palpite. Diz-me o que há.

Assinatura – Talvez tenhas recebido um aviso de fim de assinatura, enviado pelos nossos zelosos serviços administrativos. Não ligues.

PC(R) – seguem junto recortes do “Expresso” e da “Sábado” com entrevistas do Eduardo Pires, sobre a dissolução do partido. Lamentável. A “Sábado” tem umas declarações minhas, muito truncadas e com a cara do Tomé!

Situação política – Da situação internacional não digo nada; tu é que tens obrigação de me informar. A situação nacional está bastante repugnante: só se fala de altos negócios, corrupções, e intriguinhas políticas reles. As velhas famílias de tubarões, Mello, Champalimaud, Espírito Santo estão a refazer os seus impérios graças às privatizações. O governo, que andou uns anos a subornar os eleitores com concessões, para garantir a vitória nas eleições, agora está a pôr as contas em dia: aumento de preços e de impostos, tecto salarial. As pessoas não protestam; queixam-se, lamentam-se, e daí não passam.

 Em 21 de Março houve uma manifestação de protesto da CGTP; não chegou a mil pessoas. Um fiasco como nunca se tinha visto. Acho que já ninguém espera nada da CGTP. Quanto à UGT, além de furar as reivindicações, anda envolvida em casos mafiosos de roubos, que comentámos na última P.O., mas as pessoas verificam que é aceite pelo poder e portanto aceitam-na! De referir apenas uma boa e longa greve do Metro, com uma unidade fora do vulgar e contrariando inclusive decisões amarelas das duas centrais. Protestos há, sim, mas de sectores da burguesia que estão a ser atropelados pela integração europeia: professores, agricultores, magistrados, pequenos industriais… Os estudantes animaram o ambiente durante umas semanas com os seus protestos contra as restrições de acesso à Universidade e o aumento das propinas, mas é sol de pouca dura. Para onde vamos? Se a recessão europeia comprometer os planos de ajuda ao capitalismo nacional, as falências das pequenas e médias empresas podem tomar um ritmo assustador, e não sei como conseguirá o poder reintegrar toda a gente que está a ser mandada para a rua: têxteis, calçado, metalurgia, etc. Por enquanto o desemprego ainda não assusta. Seja o que deus quiser.

Os dissidentes social-democratas do PCP (Judas, Barros Moura) vão constituir um grupo político. Será a semente dum PS “de esquerda”, mais vocacionado para receber a herança do PCP quando o velho arrumar as botas? Em princípio, parece ter um espaço, mas não lhes vejo genica para isso. Por nós, seria bom que se metessem todos a negociantes e não viessem criar novas expectativas em alguns trabalhadores. O terreno da esquerda está quase todo varrido. Agora só falta nós tomarmos posse dele…

Quando cá vieres temos que trocar ideias sobre a hipótese duma revista não partidária, de esquerda, para penetrar mais longe do que a P.O., que continuaria, mais vocacionada para o debate ideológico. Não sei se estás a ver a ideia. Só falta dinheiro e gente… Um abraço, até breve.