Cartas a MV – 51

Francisco Martins Rodrigues 

Carta a MV (54)

14/2/1997

Caro M:

Estamos apreensivos pela tua falta de notícias. Temos recebido alguns materiais teus (com destaque para os do negacionismo) mas nada de cartas nem de notícias.

Temos sido abordados por alguns assinantes do “Contraponto” que estranham que não tenha saído mais nenhum número e se sentem defraudados. Tens o nº 3 em preparação? Precisas de algum apoio em traduções, etc.? Diz alguma coisa.Mando junto algumas publicações que te podem interessar e uma carta para ti.

A PO 58 será expedida na próxima semana. Teve algum atraso devido a acumulação de trabalho e também a problemas familiares que me têm ocupado demasiado. De qualquer forma, conseguimos recuperar colaboradores que ultimamente estavam a falhar. Acho que não está mal. Fiz um bocado à pressa, como de costume, um artigo lançando alguma polémica com o Bitot, que, a meu ver, desvaloriza enormemente a questão do imperialismo. Espero que ele reaja bem e que a polémica se desenvolva.

Pelo lado da Dinossauro é que não vamos bem. Depois do enorme esforço que representaram para nós os últimos lançamentos (anunciados na PO 57) fizemos contas com a distribuidora e chegámos à conclusão de que temos que parar, pelo menos por alguns meses. As tiragens são pequenas, a tipografia leva muito dinheiro pela impressão e encadernação e a distribuidora já exige 54/o do preço de capa e alargou o prazo de pagamento de 60 para 90 dias, quando não são 120… Tirando a Viagem pela América de Che Guevara, todos os outros nossos títulos saem mal. Mesmo Os meus anos com o Che, em que púnhamos esperanças de recuperar algum dinheiro, está a vender pouco. Esperemos que com o correr do ano e o aniversário da morte do Che, haja maior interesse.

Tem havido alguma agitação operária, sobretudo no Norte, sobretudo mulheres, por causa dum célebre decreto “socialista” da “semana de 40 horas” que, em concreto, está a levar os patrões a considerarem como paragem do trabalho as pausas que até aqui eram pagas. Mas o panorama geral continua o mesmo. Os camionistas estão a contagiar-se um pouco com a greve que agora passou para Espanha mas uma tentativa de bloquear a estrada, ontem, perto de Vilar Formoso, foi logo reprimida com GNRs e cães. Fora disso, são os desfalques e roubos do costume, a bola e a bola…

Quando pensas vir a Portugal? Manda notícias. Abraços para ti e para a V.

Cartas a MV – 48

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (53)

16/1/1995

 Caro M:

Continuo a receber materiais teus a um ritmo estonteante, o que é óptimo. Só me falta uma prosa tua para a próxima P.O., será que ainda desenrascas algo? Fecho impreterível no dia 24 do corrente.

E uma bela notícia, essa de que virás para cá por um ano. Decerto vão-se arranjar tarefas para te ocupar: o nosso glorioso partido é vasto e conduz actividades em muitas frentes, desde a teoria da revolução ao anti-racismo, desde uma empresa de edições a comités regionais em quase todo o território…

Por agora podes parar com o envio de originais para eventual tradução, pois o nosso conselho de leitura (que por sinal é formado pelas mesmas pessoas que compõem o conselho de redacção da P.O., o corpo de funcionários políticos, a equipa técnica, a contabilidade e o serviço de distribuição) já está submergido por materiais a examinar. Temos a sair um livro dum autor brasileiro-moçambicano[1], que é uma recolha de depoimentos sobre a guerra colonial, em cujo lançamento vamos apostar em força. É a guerra vista pelo outro lado, com episódios tenebrosos mais do que suficientes para deixar engasgados os patriotas cá do sítio que já se aventuram a falar outra vez do “espírito universalista dos portugueses”. Do livro do Thomas[2] envio-te 5 exemplares, para as primeiras impressões. Vou mandar também 3 para o autor (foi o que ele pediu). Do livro “Coração Forte”, igualmente cinco exemplares.

Acabo de receber o teu postal alarmado. Não, não estou doente. Estou em pânico, porque tenho falta de material para fechar a P.O. Desencava aí por favor uma prosa urgente e brilhante. Estou a ver se amanho um artigo sobre o “Marx em liberdade vigiada”, a propósito dos rapazes intelectuais que começam a conceder que “o velho até acertou nalgumas coisas”, desde que se dê como assente que a revolução proletária nunca mais! Também quero ver se faço alguma coisa à altura dos últimos movimentos operários, na Marinha Grande e Pejão (mineiros), deves ter lido algo: cargas da polícia, respostas duras dos operários, marchas sobre Lisboa. Parece haver sinais de que algo muda na disposição dos proletas, fartos de fome e pontapés. Veremos se tem sequência.

Escreve. Um abraço

——————-

[1] Licínio de Azevedo, autor de Coração Forte, ed. Dinossauro, 1994. O título da edição original moçambicana é Relatos do povo armado, ed INLD, Maputo, 1976 (N. de AB)

[2] A Ecologia do absurdo, ed. Dinossauro, 1994. (N. de AB)

Cartas a MV – 45

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (50)

8/8/1994

Caríssimo:

Será que o selo [1] não vale mesmo ou és tu que queres ficar com o tesouro só para ti? Eis a dúvida pungente que não me deixa dormir. Mas eu vou aí a Paris tirar a coisa a limpo, podescrer! Quando menos esperares, bato-te à porta. E quando te vir a viver à grande e à francesa, já sei que foi o fruto do meu selo.

Por aqui, tudo calmo. De novo, apenas uma tentativa para formar uma Associação de
Antigos Desertores da Guerra Colonial, de que te mando o texto convocatório, feito pelo Zé Mário Branco. Se tiveres aí possíveis interessados, informa-os. Bem se precisam apoios, porque a iniciativa por enquanto está muito restrita. Poderia ser uma boa plataforma para fazer fogo contra a faxaria que não desperdiça nenhuma ocasião para refazer a história, dizer que “a guerra estava quase ganha”, “os cabo-verdianos não queriam a independência”, o “Conselho da Revolução foi uma cambada de traidores”, etc.

As minhas actividades têm estado reduzidas ao mínimo, infelizmente por causa da doença de uma minha irmã, que acabou por falecer recentemente. Estou a ver se me relanço ao trabalho mas primeiro quero arranjar meia dúzia de dias de férias, que estas últimas semanas têm sido bem pesadas.

Recebeste os 5 volumes do “Futuro”? Penso meter as tuas “bocas” ao Sousa Tavares nas cartas dos leitores do próximo número, mas, à parte disso, não me arranjas uma carta de Paris? Cá fico à espera. Um abraço.

[1]  Segundo MV, em carta de 21/6/94:

Cem vítimas do fascismo

Francisco Martins Rodrigues

Distribuído no 1º de Maio de 1994

O regime de Salazar-Caetano foi ou não fascista? A PIDE foi ou não
uma organização de assassinos? Estas parecem ser as grandes questões
em debate, neste 209 aniversário do 25 de Abril. Para avivar a memória
dos “distraídos”, recordamos os nomes de cem vítimas, extraídos de um
folheto publicado em 1974 pela Associação de Ex-Presos Anti-Fascistas.
Com uma pergunta: os que se sacrificaram pela liberdade merecem
o espectáculo vergonhoso a que se assiste de reabilitação do
fascismo?
Continuar a ler

Anti-história

Francisco Martins Rodrigues

Quem deve assumir as culpas pela fácil vitória da direita no 25 de Novembro: o PCP ou a extrema-esquerda? O debate, que alguns tomam como quezília inútil entre vencidos, vem muito a propósito neste 20º aniversário da queda do fascismo. Continuar a ler

O Futuro Era Agora

Agora em https://www.marxists.org/portugues/tematica/livros/futuro/index.htm

O Futuro Era Agora
O movimento popular do 25 de Abril

Edições Dinossauro


Primeira Edição: 1994
Coordenador: Francisco Martins Rodrigues

Colaboraram na recolha e tratamento dos textos : Ana Barradas; Angelo Novo; António Barata; António Castela; Beatriz Tavares; Filipe Gomes e Rogério Dias Sousa

Capa: António Barata

Transcrição e HTML: Fernando Araújo.

Direitos de Reprodução: © Edições Dinossauro


Índice

capa
Baixe o livro em pdf

Os 580 dias

Prefácio

Cronologia

Molotovs no Palácio de Cristal, Rogério Dias de Sousa

O mestre disse que a Pide tinha fugido, Maria Luísa Ernesto

As perdizes, Cândido Ferreira

Durante três dias mandámos no quartel, Manuel Figueira

Toda a gente empenhada em mudar a vida, Jorge Falcato Simões

Obrigámos o Jaime Neves a recuar, Manuel Monteiro

Da JUC para a fábrica, Berta Macias

O assalto à esquadra das Antas, José Carretas

Sindicalismos em conflito, Custódio Lourenço

Foi a minha universidade, Maria de Lurdes Torres

A “revolução” no Estado Maior, António S

Autogestão na Sogantal, José Maria Carvalho Ferreira

Assobiámos o Spínola no 25 de Abril, Amílcar Sequeira

Um jornal diferente, Júlio Henriques

Sem o 25 de Abril seria uma patetinha, Helena Faria

Revistar os carros da polícia, Luís Chambel

Meu saudoso PREC, João Azevedo

Despertar dum sindicato, Vítor Hugo Marcela

Ambição era tomar o poder, Joaquim Martins

Alegria e candura, José Manuel Rodrigues da Silva

Tudo era tratado na comissão, Maria da Graça Duarte Silva

O “Che” a falar na praça, pendurado num eléctrico, Paulo Esperança

Alegria nos arrabaldes, Fernando Dias Martins

Confrontos nas ruas do Porto, Alberto Gonçalves

Os partidos não me diziam grande coisa, Maria Amélia da Silva

Passámos de caçados a caçadores, António José Vinhas

Não soubemos explorar a crise de poder, Mariano Castro

O único perigo era para a direita, Vitorino Santos

Primeiros passos da Reforma Agrária

Fazer frente aos pcs não era pêra doce, José Paiva

Lisboa – Luanda, Orlando Sérgio

Foi uma descoberta, Bárbara Guerra

Reunião de prédio, Pedro Alves

O Pires Veloso dormia na cave, José Guedes Mendes

A militância era uma festa, Nela

Os soldados não ligavam aos oficiais, Manuel Borges

Vivi por antecipação a derrocada, Helena Carmo

Sempre atrasados, José Manuel Vasconcelos Rodrigues

Uma estranha liberdade, Rita Gonçalves

Falharam os três D, Mário Viegas

O povo à porta do quartel a pedir armas, José Manuel Ferreira

Despertei no 25 de Novembro, Altamiro Dias

O povo em armas? Uma fraude, Tino Flores

Como entrei nas “catacumbas”, “Brezelius”

Andei a vasculhar a sede da PIDE, Avelino Freitas

Comecei a pensar no que poderia vir, Maria da Glória R. Borges

Dormir ao relento à porta da fábrica, Maria Luísa Campina Segundo

O poder parecia tão próximo…, Fernando Reis Júnior

Um cabo-verdiano em Lisboa, Álvaro Apoio Pereira

Os polícias de braços no ar, António Castela

Uma burguesa entre operários, Marta Matos

Recordando o soldado Luís, Valdemar Abreu

Greve aos bilhetes, João Marques

Falar de Abril

25 de Abril: transformações nas escolas e nos professores, Eduarda Dionísio….

25 de Novembro: como a esquerda foi encurralada, Francisco Rodrigues

Autonomia dos trabalhadores, Estado e mercado mundial, João Bernardo

Brandos costumes & maus hábitos antigos, Manuel Vaz

Siglas

Bibliografia


Agruras da esquerda brasileira

Francisco Martins Rodrigues

Agruras da esquerda brasileira

A tradicional e salutar abertura à crítica reinante no PT confirma-se neste número da sua revista oficial, Teoria & Debate, agora a cumprir dez anos de publicação. A pouco mais de um ano de distância da eleição em que Lula disputará de novo a presidência, é visível a ansiedade nos meios partidários acerca do desfecho de uma aposta em que o PT joga as últimas esperanças de se afirmar como partido credível de governo. No centro dos debates a questão de saber se o PT deve ampliar mais o leque de alianças a sectores do PSDB e do PMDB, os dois grandes partidos do centro, ou se deve, pelo contrário, buscar alargar a sua base eleitoral própria dedicando-se com mais afinco à mobilização das massas pobres.

Todavia, nesta polémica parece não haver consciência, mesmo da parte dos “radicais”, do plano inclinado em que o PT mergulhou ao pôr-se como meta a conquista de posições sucessivamente mais altas no aparelho de Estado burguês. O mais que se consegue obter é a confissão algo eufemística de um dirigente de que “o grande problema que vivemos hoje no PT é que não estamos conseguindo fazer acompanhar o crescimento eleitoral e institucional pelo necessário avanço na coesão programática, pela manutenção da ética interna, pelo reforço da identidade ideológica”.

Um diagnóstico bem mais severo – e ao que nos parece mais certeiro – dos males do partido é traçado na revista Em Tempo, órgão da tendência Democracia Socialista (trotskista). A esquerda do PT, lê-se num documento aí reproduzido, “não soube compreender o quanto o poder real do partido já se havia deslocado das estruturas normais de direcção para centros autónomos em torno de personalidades, sindicatos, parlamentares e executivos eleitos pelo partido”.

Vai mais longe: “Se as instâncias de base há muito deixaram de existir, agora são as instâncias de direcção que começam a desaparecer ou a transformar-se em meros aparelhos para legitimar posições. As direcções das campanhas eleitorais são exemplos gritantes disso”.

Por último: “O carácter socialista do PT está sendo questionado dentro e fora do partido. A deia da transição e da socialização dos principais meios de produção desaparece e a lógica do mercado surge como inevitável.”

Apesar disto, e reflectindo as incuráveis ambiguidades do trotskismo, o documento considera impossível a repetição no Brasil do processo de social-democratização verificado nos partidos operários europeus e acredita numa “alteração radical do curso do Partido” pela mudança na composição da direcção. Críticas “principistas” “implacáveis” e manobras entristas “audaciosas”: Trotski não deixaria de aprovar…

Por muito que doa aos que depositaram grandes esperanças o “carácter novo” do PT, é a sua transformação plena num “partido burguês para operários” que está em curso. Não cremos que esse rumo possa ser mudado.

Submarinos

Do PT passemos a uma força menor mas com tradições na esquerda brasileira, o Partido Comunista do Brasil. É sempre com interesse que lemos a sua revista Princípios, já que nos permite – para além de informações sobre a situação política interna – fazer o ponto da deriva desse partido.

A imagem que nos fica do PC do B actual a partir dos principais artigos deste número é a de uma extrema corrupção oportunista – o que de forma alguma nos surpreende. Recorde-se que este partido teve há vinte e tal anos pretensões a “farol” do movimento comunista revolucionário e a esse título interferiu na nova corrente comunista nascente no nosso país, causando-lhe sérios prejuízos pela desagregação a que conduziu o PC(R).

Ficamos a saber através de dois artigos de fundo que o partido tem em curso uma campanha pela “intervenção cívica” das Forças Armadas nos grandes problemas do país. Segundo o deputado Haroldo Lima, a “melhor tradição” das Forças Armadas brasileiras sempre teria sido a “unidade nacional”. Nada justificaria pois o silêncio a que estão remetidos os militares e Lima desafia-os a libertarem-se de complexos… Basta que “deplorem publicamente o tratamento desumano dado a opositores do regime” (note-se o termo arrepiante: “deplorar”) e nada impedirá que reassumam o protagonismo. Num outro artigo, “Forças Armadas, poder naval e soberania nacional”, Aldo Rebelo, dirigente e também deputado federal do partido, defende que

“se é verdade que o golpismo, o caudilhismo e o partidarismo que envolveram as Forças Armadas na América Latina são experiências condenáveis, tais factos não podem ser usados como pretexto para excluir os militares da reflexão sobre os rumos do Brasil”.

E adianta propostas concretas para a Marinha e a Aeronáutica: “Uma marinha forte, versátil, adestrada e valorizada é uma garantia para a realização das aspirações nacionais e dos interesses geopolíticos do Brasil. Cuidemos, pois, da nossa marinha”. “O submarino nuclear e o caça AMX são produtos de um pioneirismo e persistência louváveis” que “devem merecer o incentivo, o apoio e o amparo de todos os brasileiros sinceros.” “O Brasil precisa do submarino nuclear. Se por um lado festejamos a certeza de construí-lo, por outro lamentamos as dificuldades orçamentais que têm atrasado o seu calendário”.

Lê-se e não se acredita! Estão assim tão longe os anos negros da ditadura militar? Não vamos ao ponto de supor que a direcção do PC do B esteja financeiramente interessada nas encomendas militares que tão ardorosamente defende. Admitimos que tudo se resuma a um caso de cretinismo patriótico, na linha do “nacional-comunismo” propugnado por João Amazonas. Como argumenta a revista: os Estados Unidos boicotam o reforço militar dos países latino-americanos, que não lhes convém nesta era de “globalização”; logo, devem os patriotas e progressistas bater-se por essas mesmas forças armadas!

Uma outra componente forte da política actual do PC do B transparece num editorial de João Amazonas, intitulado “Socialismo no século XXI”, triste peçazinha no estilo de “incentivo e confiança no futuro” onde, entre outras coisas, somos informados de que “o socialismo sofreu derrota passageira na União Soviética e no Leste europeu” mas que “é possível que os comunistas voltem ao poder na Rússia”; a China “acabará consolidando o regime socialista”, assim como o Vietname. Este namoro descarado ao bastião chinês (que é a actual esperança desesperada para que se volta esta corrente – veja-se a postura de Cunhal e do PCP) leva inclusive a revista a reproduzir um editorial do Diário do Povo de Pequim, “A luta Norte-Sul sobre os direitos humanos”, no qual a condenação da hipócrita campanha imperialista dos “direitos humanos” serve como álibi para fazer passar os atropelos do poder na China.

 (1997)

Carta a SV

Francisco Martins Rodrigues

Carta a SV

13/5/1992

Caro Amigo:

Registei a renovação da sua assinatura por 10 números (dois anos) e inscrevi o restante do seu cheque como apoio à revista, que agradeço. As dificuldades financeiras são grandes mas tencionamos continuar, graças ao apoio de assinantes e amigos como é o seu caso.

Transcrevemos na próxima «P.O.», na secção de Cartas, a sugestão que faz quanto a uma candidatura de esquerda à presidência. Infelizmente, não creio que seja viável, porque se chegou a uma situação de completa dispersão. Vão passar alguns anos antes que as ideias de esquerda recuperem influência nos trabalhadores.

A propósito, não sei se viu um programa de televisão recente em que o marechal Costa Gomes, ao mesmo tempo que fazia críticas certeiras ao Spínola, falava da sua intervenção pessoal nas guerras coloniais em termos bastante reaccionários, sem qualquer autocrítica pelo papel que teve no tempo da ditadura fascista. São muito poucos hoje os militares de Abril que assumem posições de esquerda.

Mando junto a P.O. nº 34 que suponho que já não recebeu por ter caducado a assinatura. Por agora, é tudo. Aceite as minhas saudações.

 

 

Cartas a FR – 2

Francisco Martins Rodrigues

Carta a FR (13)

5/1/1990

Caríssimo Camarada

Só agora tive ocasião de responder à tua carta de 2 de Novembro. Espero que tenhas tido boas entradas no ano de 1990.

Como certamente sabes, está a decorrer uma greve de fome iniciada pelo Ramos dos Santos e apoiada por outros (cinco até à data. O Ramos completou três anos de prisão preventiva em 30 de Novembro; deveria ter sido libertado, como fizeram com o Otelo e os outros, mas recusam-se a libertá-lo. Já foram metidos dois habeas corpus, até agora sem resposta favorável. Ele está bastante enfraquecido, já perdeu quilos e está sujeito a uma crise cardíaca. Tem sido visitado por todos nós e por diversos médicos e está bastante animado.

Fiz um pedido para sermos recebidos pelo Presidente Bochechas, mas o pulha até agora não deu resposta. Vamos lá no princípio da próxima semana, assim como ao Provedor, Assembleia da República, PS, PCP, etc.

Com tudo isto e com o esforço para manter a saída regular da revista, já calculas que não proposta sobre a posso pensar na tua Associação do Ateísmo. Somos poucos para tantos problemas.

E que me dizes à crise do Leste e do PC? Os falsos comunistas e socialistas estão a abrir falência, o que é bom, mas o pior é vermos os americanos a fortalecerem-se com tudo isto. O caso da invasão do Panamá é impressionante. Quem será a próxima vítima?

Por agora é tudo. Já sei que não deixarás de fazer aí tudo o que estiver ao teu alcance em apoio dos companheiros. O Carlos Antunes está-se a portar muito mal neste caso.

Um grande abraço e desejos de muita saúde

Carta a FR (14)

6/12/1993

Caríssimo Camarada

Gostei muito de ter notícias tuas e de saber que continuas cheio de força. O meu projecto de te visitar tem sido sucessivamente adiado, porque me desloco cada vez menos e até o LGo há muito que não vai ao Norte. Registámos a tua assinatura e publicamos a tua carta. Nada temos a opor às tuas propostas, a não ser a nossa falta de qualificação para promover essa união dos revolucionários e dos ateus que propões. Vamos editando a revista com bastantes dificuldades e na esperança de que gente jovem desperte para as questões da emancipação social e faça aquilo que não somos capazes de fazer. É bem verdade, como escreves, que a burguesia só se derruba com armas na mão e não com palavras. Mas para que surjam pessoas dispostas a pegar em armas, muitas palavras terão ainda que ser impressas. Não nos envergonhamos por este nosso modesto trabalho de propaganda – ele é indispensável. O que é preciso é que as palavras esclareçam e animem vontades revolucionárias em vez de semearem a confusão e o conformismo, como fazem quase todos por aí. Esperamos sinceramente que a revista te agrade e que a leves ao conhecimento de amigos teus.

Aceita um abraço e até um dia.

Carta a FR (15)

28/4/1994

Caro Camarada:

Só agora posso responder às tuas cartas. O trabalho de preparação do livro tem-nos ocupado bastante nas últimas semanas. Já mandei o teu exemplar pelo correio e fico à espera da tua apreciação. Se conseguires angariar aí (…) mais algum comprador, será uma forma de nos ajudares a recuperar a despesa da edição. Temos muito mais vantagem nos exemplares vendidos directamente por nós do que naqueles que entregamos à distribuidora, que abocanha logo 55% do preço de capa. Também, nas livrarias vai vender-se a 2.300$00 + IVA, é a única maneira de recebermos algum.

Ainda bem que te agradam os artigos que tenho feito na P.O., o que é preciso é malhar na burguesia; o bicho tantas há-de levar que algum dia há-de ir abaixo, não te parece? Agora, quanto à campanha que pedes para desenvolvermos, de denúncia do assassinato do teu filho, talvez tu não tenhas uma ideia actual das nossas forças, que são muito limitadas. Dão para irmos editando a revista e nada mais. A pouco e pouco, as pessoas que alinhavam nas posições revolucionárias foram escasseando e agora encontramo-nos reduzidos a um pequeníssimo núcleo. Vamos a ver quantos aparecem depois de amanhã para segurar a nossa faixa na manifestação do 1º de Maio. A faixa diz: “Nós também somos culpados do 25 de Abril”. Que achas? Foi a maneira que encontrámos de protestar contra o descaramento de trazerem um pide à televisão nas vésperas do 25 de Abril e não só: toda a casta de salazaristas são agora ouvidos como grandes autoridades para explicar a queda do regime, falar dos sentimentos democráticos do Marcelo Caetano, atribuir a democracia ao mérito do Spínola, etc. Ninguém diz a verdade simples: o país estava na posse duma associação de bandidos e os pides eram os que faziam o trabalho mais sujo e repugnante ao serviço dos outros.

Em conclusão: para além do que já temos feito várias vezes, ou seja, publicar artigos na P.O. lembrando as circunstâncias suspeitíssimas da morte do teu filho[i], nada mais podemos fazer. Eu sei que é muito pouco porque a circulação da revista é muito reduzida. Mas talvez nem seja isso o mais necessário, porque o caso é já hoje do conhecimento de muita gente, graças aos artigos que tens conseguido fazer sair em grandes órgãos de imprensa. Talvez o mais importante para desbloquear o processo fosse um advogado que tomasse o caso a peito, como fez o Brochado Coelho com o assassinato do padre Max (e mesmo assim sem conseguir resultados até à data). Que pensas disso? Duma coisa podes estar certo: da nossa solidariedade em tudo o que estiver ao nosso alcance.

Aceita as nossas saudações revolucionárias e desejos de boa saúde.

Carta a FR (16)

6/6/1994

Caro Camarada:

Com base nos documentos que mandaste sobre o caso do teu filho, fiz um artigo que sai nesta P.O. (amanhã ou depois estará na rua). Reproduzimos a fotocópia dos despachos contraditórios do Hospital Militar, para não deixar dúvida de que houve grossa tramóia em todo o caso. Espero que os argumentos com que apresento o assunto estejam correctos, tu verás se o assunto foi bem tratado.

Já enviaste essas fotocópias para a grande imprensa? Pode ser que algum jornalista se decida a agarrar novamente no assunto e quebre a barreira do silêncio, agora que estão a vir ao de cima vários casos de ilegalidades. (…)

Aceita um grande abraço meu, com desejos de coragem para continuar a luta.

Carta a FR (17)

16/1/1995

Camarada:

Lamento muito o novo golpe que sofreste e espero que mantenhas ânimo para enfrentar mais esse grande desgosto. Eu, infelizmente, tive que acompanhar nos últimos meses a doença e morte duma irmã minha e sei as marcas que isso nos deixa.

Faço seguir pelo correio o livro que encomendaste. A revista deverá estar pronta na primeira semana de Fevereiro e lá vem o comentário acerca da morte do teu filho. Aceita abraços de todos nós, com desejo de muita saúde e coragem.

Carta a FR (18)

6/10/1995

Caro Camarada:

Desculpa a demora em responder-te, mas aproveitei para tirar umas férias e só agora retomo actividades. Não tenho dúvida em dar-te apoio na questão dos processos que queres consultar mas creio que isso passa em primeiro lugar por uma procuração tua e mesmo assim, sendo como são os gajos que tomam conta da Torre do Tombo, é de duvidar que atendam o pedido. Julgo que tens lido os artigos do Fernando Rosas e de outros professores que protestam porque o facho que lá está em director daquilo arranja sempre pretextos para não permitir a consulta dos documentos. Em todo o caso, se me passares uma procuração, eu vou atacar o animal no seu esconderijo. Nome: Francisco Martins Rodrigues, B.l. 6481598, Arquivo de Lisboa, 7/5/84. Creio que é suficiente.

Espero que a tua saúde vá menos mal. Aceita um abraço do camarada

Carta a FR (19)

19/5/1996

Caro Camarada:

Estou a preparar um artigo para a próxima P.O. com base nos dados que me enviaste sobre a morte do teu filho. Sei que é pouco mas é o que está ao nosso alcance. Tudo mostra que existe de facto uma conspiração em alto nível para bloquear as investigações em tomo do caso – quando estão em jogo os comandos da tropa, os juízes metem o rabo entre as pernas. A impunidade é tão grande que agora até já gajos da GNR chegam ao ponto de matar, decapitar e enterrar um preso (um negro?) para esconder o crime, à moda do Brasil. É o que está hoje a rádio a noticiar. Era motivo mais que suficiente para o ministro se demitir de imediato, mas envolvem tudo em palavreado chocho e lá vai tudo andando como se fosse o incidente mais natural desta vida.

Tens mais que razão quando propões a formação de associações de ex-presos políticos e de ateus. São mais do que necessárias para fazer contracorrente neste clima podre de pretensa normalidade democrática, em que o grande capital manipula as pessoas a seu bel-prazer. O nosso problema, já te tenho dito, é a escassez de pessoas dispostas a empenhar-se. Vamos editando a nossa revista com grandes dificuldades, lançando um ou outro livro de denúncia do capitalismo e esperando por melhores dias, que outros venham ajudar-nos para o nosso lado. Algum dia será.

Sobre a tradução do “Trabalho Assalariado e Capital” de Karl Marx, gostaria que a enviasses quando possível para o nosso apartado. É uma obra fundamental e poderiam proporcionar- se condições para a editarmos num livrinho.

Junto envio um livro de poesia recentemente editado pela Dinossauro[ii], com um grande abraço solidário e desejos de boa saúde

Carta a FR (20)

14/7/1996

Caríssimo:

Só agora respondo à tua carta de 26 de Junho. Desculpa o atraso mas meti umas curtas férias, para relaxar. Recebi o texto mas, por coincidência, encontrei-o, poucos dias depois, na Feira do Livro. Existe numa edição do PC, Editorial Avante, e barata. Concluímos que não teríamos saída para o livro e que seria só despesas. Desistimos, portanto da ideia e só é pena não nos termos informado primeiro, escusavas de ter o trabalho e a despesa de nos mandar o original. Se quiseres que to devolva, diz.

Quanto aos outros projectos, só te posso repetir o que já tenho dito: não temos contacto com gente interessada em criar as associações que propões. O P há muito que o não vejo. Aquilo pelo lado deles também não anda fácil. Por muito que nos custe, será necessário aguardar que surjam melhores condições, uma corrente de interesse que dê força a essa ideia. Não deixaremos de fazer a propaganda possível na P.O.

O que responderam os partidos à tua última carta sobre o teu filho? Nada, natural­mente. Precisavas que a televisão se interessasse, daria outro impacto. Já tentaste escrever ao Carlos Narciso, que faz os “Casos de Polícia” na SIC? Se ele te entrevistasse, a coisa dava barulho e teria que haver alguma resposta do poder.

Dá sempre notícias. Aceita um abraço do camarada

————–

[i] Júlio Pires Ribeiro, capitão da Força Aérea, que apareceu morto na Base 3 de Tancos depois de cinco dias de prisão por ter ajudado para-quedistas revoltosos. (Nota de AB).

[ii] AAVV, “Notícias da Raiva”. (Nota de AB).

Cartas a FR – 1

 

Francisco Martins Rodrigues

Carta a FR (1)

19/9/1988

Caro Camarada R:

Na ausência momentânea do L, respondo à tua carta de 12/9, para não ficares a aguar­dar resposta.

(…) Quanto às verbas que tens enviado para a Solidariedade, têm sido devidamente registadas. Mas como houve interrupção das reuniões devido às férias, o próximo “Denúncia” só deve sair em Outubro e aí virão as verbas que falta mencio­nar.

Sobre a questão do ateísmo, julgo que há algumas pessoas interessadas (é o nosso caso na P.O.) mas a sobrecarga de trabalhos é já tão grande que não vejo que possamos para já dar ajuda. Seria preciso reunir mais pessoas interessadas, reunir materiais de propaganda, fazer um boletim, etc.

A minha visita ao Otelo está marcada para amanhã. Espero também quo um dia destes, ou eu ou o LGo possamos visitar-te aí (…), para conversarmos sobre os nossos tra­balhos.

Aceita um abraço e desejos de boa saúde

Carta a FR (2)

10/10/1988

Caro Camarada:

Em resposta à tua carta de 22/9, que agradeço: estive com o Otelo[i], gostei de ver que se mantém com o moral elevado, mas receio que ele esteja iludido sobre a boa vontade que julga haver de muitos sectores para resolver o caso das condenações. Ele diz sempre clara­mente que não aceita soluções individuais só para ele, o que é muito justo. Espero voltar a ter ocasião de o visitar brevemente.

Quanto à entrevista que referes no “Expresso”, li-a de facto e, embora não esteja por dentro dos assuntos que há entre os presos, acho que levanta questões sérias que devem ser ponderadas. Como deves calcular, a posição em que se colocam esses dois presos tem afinidades com as opiniões que a OCPO tem defendido na revista. Pessoalmente, acho que houve um erro de início na ideia arreigada de que Se poderia formar uma espécie de frente de pessoas de es­querda, sem definições ideológicas rigorosas. oou adepto da necessidade de constituir um partido comunista (não comodista), que possa ser como uma espécie de coluna vertebral de todo o imenso trabalho que é preciso fazer para uma revolução ter êxito. É natural que esta minha opinião se afaste muito do que tu defendes na actualidade, suponho. Mas isso não impede que troquemos ideias em busca do que a todos nós interessa alcançar. Aguardo com muito interesse a tua opinião sobre a nova série da “Política Operária”, que te será enviada na próxima segunda-feira.

Li a cópia da carta do VG. Como te disse antes, o terreno da propa­ganda ateísta é um dos que, quanto a mim, mais estão a precisar de intervenção organizada.

Sem darmos por isso, estamos já todos cobertos de teias de aranha e os tipos cada vez são mais arrogantes. Espero bem que em breve haja forças disponíveis para darmos una bofetada na cara dessa gente, acabando com o argumento (inventado pelo PCP) de que não se pode falar contra a religião para não ofender os católicos honestos. E eles podem ofender-nos a nós?

Até breve, espero. Um grande abraço

Carta a FR (3)

15/11/1988

Caro Camarada:

Desculpa só hoje responder às tuas cartas de 27/10 e 8/11, mas a preparação da nossa festa ocupou-nos todo o tempo. Felizmente correu tudo bem, foi um êxito, e espero que alargue a difusão da revista.

A “Denúncia”[ii] nº 9 deve ficar hoje aprovada e será rapidamente impressa. Tem demorado por causa das discussões sobre como devemos comentar as iniciativas e declarações recentes sobre o ca­so Otelo, que deves ter lido nos jornais. Está a haver uma manobra para resolver o caso Otelo à parte (declarações de Soares e Eanes, pedido de indulto do PCP). Inclusive vou agora escrever uma carta para o “Jornal” rectificando por terem posto o meu nome entre os apoiantes da “solução política” do caso.

Por tudo isto, não sei se as nossas opiniões sobre o assunto são coincidentes. Estamos a preparar um artigo da redacção criticando o caminho que as coisas levam. Em todo o caso, se quiseres escre­ver uma carta com as tuas opiniões, será certa­mente publicada no próximo número.

Por favor, escreve-me depois a contar o que pensa o Otelo destas jogadas e como vai impedir que sigam por diante. Uma declaração pública dele podia ter um efeito importante.

O Lgo não chegou a ir a Ovar e portanto não fez a entrega que lhe pediste. Es­tamos a pensar, ele ou eu, ir aí de novo em Dezembro. Depois escrevo-te.

Por hoje, é tudo. Até breve, um abraço deste camarada e amigo

Carta a FR (4)

12/12/1998

Caro Camarada:

Respondo mais uma vez a duas cartas tuas juntas, pelo que peço desculpa. A tua sugestão de irmos oS dois visitar o Otelo não me chegou a horas de eu te responder dentro do prazo. Como só vou ao apartado uma vez por semana, não dá para recados urgentes. Além disso, as declarações mais recentes dele (“O Jornal” e “Diário de Lisboa”) vieram ao encontro do que queríamos: ele rejeita mais uma vez claramente a oferta de in­dulto ou amnistia separada. Para já, fica cortada a manobra, mas os gajos decerto vão voltar ã carga.

Quanto às tuas sugestões para acordos com o Sampaio do PS, com gente do PC e formação dum mo­vimento de esquerda, seria preciso primeiro que os grupos de esquerda existentes chegassem a es­se acordo e tivessem objectivos comuns. Não pen­so que a situação seja essa; cada grupo está nu­ma fase de tentar definir-se e juntar forças e não se consegue por agora ir além de pequenas ac­ções em comum, como é o caso da SCR. Por nós, “P.O.”, ainda não nos sentimos capazes de grandes voos. Uma acção que já propusemos e que nos pa­rece possível seria uma candidatura conjunta da extrema-esquerda ao Parlamento Europeu. Aguarda­mos resposta dos outros grupos, que te parece a ideia? Seria possível mobilizar gente para apoiar essa candidatura? O objectivo não seria, claro, eleger nenhum deputado (o que é impossível na situação actual) mas aproveitar para fazer pro­paganda na televisão e na rádio e denunciar os grandes negócios da CEE. Que te parece?

Fui ao almoço da “Versus”, correu bem, e houve quem comentasse a tua ausência, haverá outras ocasiões para nos encontramos e deba­termos ideias. Continuo com o projecto de ir aí, mas tenho sido obrigado a adiar tudo quanto a deslocações porque a artrose está-me a atacar em força desde há mais de um mês.

Por hoje é tudo. Até breve e aceita um grande abraço deste camarada

Carta a FR (5)

21/3/1989

Camarada:

Respondo às tuas cartas de 8 e 16 do cor­rente, desejando-te melhor saúde. O Encontro de activistas teve mais de cem pessoas e correu bastante bem, tendo ficado decidida a constituição e legalização duma Frente da Esquerda Revolucio­nária, para intervir nas eleições do Parlamento europeu. Continuam as conversações com a FUP e o PSR para a eventualidade duma coligação, mas ain­da sem resultado. A UDP não respondeu, Se não houver acordo, iremos sozinhos, que remédio, o que importa é aproveitar para fazer propaganda das ideias revolucionárias. Quanto a candidatos, nada se adiantou por enquanto. Já sondei pessoas pró­ximas do Otelo que me dizem que ele não está in­teressado em ser candidato. Também sei que o PSR o visitou recentemente, talvez para o convidar, mas duvido que ele aceite.

Dei conhecimento aos camaradas da tua car­ta e desejam-te as melhoras e que possamos contar com o teu apoio na campanha que se vai iniciar. Vamos fazer um comício na Voz do Operário na noi­te de 24 de Abril, para apresentação pública da candidatura. Espero que nessa ocasião poderemos ter cá a tua presença. Também evidentemente teremos que estudar as possibilidades duma sessão aí (…), mesmo modesta, que dizes?

(…) Mando junto o texto do Apelo que foi aprovado no encontro. Vamos começar imediatamente a recolher assinaturas de apoio para depois divulgar em anúncios pagos na imprensa. Podemos contar com a tua colaboração? Trata-se de reco­lher nomes de personalidades mas também nomes de toda a gente que esteja de acordo e que se pode mobilizar para colaborar. Vamos também man­dar listas para recolha de fundos. Enfim, o car­ro está em andamento, vamos a ver se acelera.

Espero ver-te brevemente (deste vez é que cumpro) quando for ao Norte. Escrevo depois ou telefono a confirmar. Grande abraço e de­sejos das tuas melhoras.

Carta a FR (6)

1/4/1989

Caro Camarada:

Respondo è tua carta da 23/3, só para te confirmar que precisamos de mais assinaturas de apoio à PER, que poderiam ser trazidas quando viesses ao comício da Voz do Operário, dia 24 de Abril. Seria muito importante trazeres nesse dia uma delegação de (…) e apresentarem uma curta mensagem de apoio à candidatura, que dizes?

Está-se a reunir nomes para a lista de candidatos e desde já preciso que me digas se o teu nome pode ser incluído (nós da PO vamos propô-lo aos outros) e se deveria ser como indepen­dente. Quanto ao Otelo vai amanhã domingo uma pessoa falar com ele.

Peço também que me mandes dizer os nomes que vêm ilegíveis na lista que mandaste, porque pensamos divulgá-los em anúncio a publicar nos jornais. Sobretudo interessa o nome do dirigente do Sindicato dos Cerâmicos. Todos os nomes repre­sentativos que possas obter interessem, como com­preendes. Para já é tudo.

No dia 7 há uma sessão da SCR na Amadora pela Amnistia. Vai sair o “Denúncia”.

 Um abraço

Carta a FR (7)

8/5/1989

Caro Camarada:

Respondo às tuas cartas (em seguimento da nossa conversa telefónica. Recebemos as 4 listas de apoio, seria bom que viessem assim de outras partes. 0 comí­cio da Vos do Operário foi um pouco fraco mas correu bem. Vamos enviar-te materiais da FER para distribuição. Será possível organizar aí uma pequena sessão de esclarecimento? Haverá um almoço de apoio à candidatura em Lisboa a 3 de Julho, gostaríamos de contar com a tua presença e de mais alguém que viesse contigo.

0 comício de encerramento é a 16 Junho na Voz do Operário. O L estará aí contigo brevemente e poderá informar-te melhor sobre o andamento dos trabalhos. Envio-te a última P.O. e a lista dos candidatos.

Sobre o Otelo e companheiros, continua a arrastar-se a solução. Fizemos bas­tante barulho nas manifestações do 25 Abril e 12 de Maio, Vamos continuar a martelar com co­municados à imprensa. Um abraço

Carta a FR (8)

14/5/1989

Camarada:

Espero que estejas bem de saúde e que te­nhas recebido a minha carta de 8 do corrente, as­sim como a encomenda cora os manifestos. Corrigin­do o que te dizia nessa carta: o almoço que esta­va previsto para 3 de Junho foi antecipado para dia 28 de Maio domingo. Pretende-se transformá-lo numa acção de protesto contra a recuperação do bandido Salazar que por aí está a ser feita. Tentaremos obter cobertura na imprensa e rádio e prevê-se uma intervenção do Varela Gomes como re­sistente antifascista de longa data. Isto ainda torna mais importante a tua comparência. Pensas que será possível ultrapassar os teus problemas de deslocação? Diz-me alguma coisa, certo?

Fizemos uma queima dum boneco representan­do o fascista Blas Pinar, na Praça da Figueira, deu na televisão, rádio e alguns jornais, viste?

A tónica do antifascismo tem que ser bem martelada durante a campanha para despertar a juventu­de. Podes ter um papel nisso. Vamos também dar destaque aos dois presos políticos que entram na nossa lista, a HC e o DL.

Um abraço

Carta a FR (9)

14/6/1989

Caro Camarada:

Já terás conhecimento pela imprensa de mais informações sobre a nossa desistência. Receberás dentro de dias a PO 20, que expõe o caso em por­menor. Não foi de ânimo leve que chegámos a esta medida, porque sabíamos o descrédito que estes incidentes trazem à esquerda, mas não vimos outra alternativa em face da deslealdade total dos ra­pazes da LST. Não lançámos s público essa ques­tão para não entrar era “lavagem de roupa suja” mas quando um de nós aí for poderemos conversar. Segue comunicado de imprensa.

Recebi as tuas cartas e o cheque de 1.600$ e espero que este incidente não afecte a nossa colaboração. Hoje penso que foi um erro ter ten­tado esta coligação com gente que vê a política como uma brincadeira. Fica-me de emenda.

Um grande abraço e até breve

Carta a FR (10)

27/6/1989

Caro Camarada:

Respondo à tua carta de 15/6 e aproveito para saber se te faz jeito receberes-me aí no sá­bado dia 9 Julho ou na segunda dia 10, visto que terei que ir ao Norte e cumpria finalmente a pro­messa de te visitar para falarmos um bocado. Agora que já passou a trapalhada das eleições, que me deixou más recordações, poderemos falar de outras. Só é preciso que me digas o dia que te convém (…).

Houve anteontem aqui um jantar dos pre­sos, famílias e amigos com o Otelo. O S es­teve lá. Parece que o tom dos discursos foi um bocado pró-PS (falou o Edmundo Pedro), pelo menos para o meu gosto. Tu que sonhas com uma união da gente das esquerdas talvez te alegres. Mas eu com o PS, nem pintado. E com o PC também não. Enfim, coisas para debatermos.

Um grande abraço

Carta a FR (11)

1/8/1989

Caro Camarada:

Respondo às tuas cartas de 22/6 e 3/7 pe­dindo desculpe pelo atraso que já é habitual mas não é por mal… Espero que a tua saúde esteja boa. Infelizmente ainda não foi desta que te visitei, pois já tinha tudo marcado e à última hora telefonaram-me do Porto a adiar o encontro e ficou tudo suspenso. Quando tiver algo concreto telefo­no-te, mas só depois das férias com certeza.

(…) Quanto às nossas infelizes experiências eleitorais, vejo que consideras ter havido excesso de rigidez ou sectarismo da nossa parte. Não julgo isso mas só de viva voz poderemos trocar ideias sobre o assunto. O caso é que quando se juntam for­ças muito pequenas, a tendência ê para a desconfiança e o conflito. Penso que os da LST/ER foram muito pouco leais em tudo isto. Mas já lá vai. Te­mos que olhar para a frente. Um abraço

Carta a FR (12)

21/10/1989

Caro Camarada:

Só agora respondo à tua carta de 17/8, mas não é por desinteresse. Meteram-se pelo meio as férias e também os muitos trabalhos com a Po­lítica Operária, que não são só literários, mas também técnicos, enfim, tu sabes como é…

Mandei-te um exemplar como oferta e gostava de conhecer a tua opinião sobre o nº 21 da PO, em particular sobre o comunicado quanto à amnistia. Nós não estamos de maneira nenhuma desinteressa- dos do assunto, mas vemos que a opinião que domi­na entre os presos e os ex-presos, Carlos Antunes, etc., é no sentido de não fazer ondas, para não prejudicar uma lei da amnistia que acham que está para breve. Nós temos defendido a necessidade de uma manifestação, mas já nos acusaram de estar a prejudicar os presos e neste momento não vemos condições para agitar o problema como gostaríamos. (…)

Um abraço amigo

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[i] Na altura sob detenção na cadeia de Caxias. (Nota de AB).

[ii] Órgão da SCR (Solidariedade Contra a Repressão). (Nota de AB).