Cartas a JV – 11

Francisco Martins Rodrigues

Carta a JV – 11

9/2/1994

Caro Amigo:

Agradeço os jornais e documentos que tens mandado.. A P.O. deve vir hoje da tipografia e ficamos com um breve período de pausa, para respirar e sobretudo ler material que se vai acumulando. O teu reparo sobre o homossexualismo chegou quando se estava a fechar a redacção e ainda deu para o metermos em carta do leitor. Aguardemos as reacções. Se queres que te diga, nunca nos dedicámos a discutir muito o assunto e creio que existem opiniões diferentes entre nós. Talvez a tua carta nos obrigue a discutir o problema. A posição que saiu no artiguinho que referes não pretendeu obviamente dizer que a homossexualidade seja uma doença, mas apenas apontar o seu florescimento nas prisões como um dos índices da situação degradante em que os presos se encontram, privados duma vida sexual normal. Não concordas?

Por cá, a situação económica agrava-se lentamente, embora não tanto como alguns previam. O desemprego oficial é de 6% mas este número tem pouco a ver com a realidade. Será 8%, 10%? O funcionalismo público vai fazer a segunda greve no espaço de um mês, porque o governo pretende dar-lhe um aumento de 0% a 2%, omitindo a inflação, ou seja, um “aumento” negativo. Dos sectores operários há algumas acções de protesto, mas até agora dispersas. As duas centrais estão a radicalizar a linguagem mas não mais do que isso, é só para absorver o descontentamento. Qualquer delas, mas sobretudo a UGT, estão escandalosamente vendidas às verbas da Comunidade, a pretexto dos cursos de formação profissional, e ficam na dependência do governo para embolsar as massas. De modo que berram muito mas arrastam os pés e procuram dispersar as lutas. É a modernização que chega à ocidental praia lusitana.

Será que nos encontramos na sessão do aniversário da Batalha em 26 deste mês? Eu vou lá. Abraços meus,  da Ana e da Beatriz, para ti e para a S.

Cartas a HN – 17

Francisco Martins Rodrigues

Carta a HN – 17

9/2/2002

Velho H

Tenho aqui duas cartas tuas recentes e vou tentar responder às questões que colocas e dar-te algumas notícias.

Teu artigo – Parece-me extenso mas ainda não tive oportunidade de o estudar. Vou ler e dir-te-ei depois o que penso.

Curso de marxismo em Bruxelas – O MV já me falou com interesse desse curso onde esteve há dois anos, julgo. Leio aqui o jornal desse partido, que é de facto radical, dentro da área dos “revisas duros”, muito mais consistente por exemplo do que o Avante do meu amigo Cunhal. De qualquer modo, sendo claramente anti-imperialistas, não temos dúvidas de que são reformistas e que têm uma ideia muito sinistra do que seja o socialismo. Isso basta para sabermos que não são do nosso campo. Terá interesse o curso? Eu, se tivesse disponibilidade, ia assistir, pela curiosidade de ver como expõem as questões centrais do marxismo e até para activar as objecções e críticas do nosso lado. Nesta época de deserto quase total no campo do marxismo, tudo o que proporcione debate e luta de ideias pode ser frutuoso. Era bem bom se tu ou o Manuel, ou os dois, redigirem um comentário sobre o que viram, o que vos pareceu aceitável e o que acham errado, etc. Era uma boa malha para a PO. Agora tu é que verás se compensa a deslocação, a despesa e o tempo gasto.

Voz do Trabalho – São naturais as tuas preocupações com o andamento do projecto. De facto, as coisas têm patinado um bocado, houve uma doença e ausência do M (já voltou), afastamento (temporário?) dos elementos ligados ao Bloco de Esquerda e que se meteram a fundo na campanha eleitoral deles (e agora já estão metidos noutra) e uma certa indefinição sobre o carácter da folha, com discussões sobre se devia ser mais política ou mais dedicada às lutas económicas.

Por tudo isto a correspondência, os envios do jornal, etc., têm andado um bocado ao deus-dará. Saiu em Dezembro o n° 4 (que pelos vistos não recebeste) e está a sair o n° 5. Vou fal ar com eles para transmitir as tuas preocupações e pedir que te enviem exemplares do 4 e do 5.

Af, Leo – Numa reunião de redacção da PO, em Novembro, foram feitas algumas criticas a artigos que eles tinham escrito: o do Leo sobre o 11 de Setembro, e o do Af sobre um subsídio de Natal igual para todos. Os camaradas reagiram mal às críticas e não quiseram alterar os artigos. Depois disso não vieram a mais reuniões. Lamentamos e esperamos que reconsiderem. São poucos os que participam no colectivo e não gostamos de ver camaradas afastarem-se mas não podemos prescindir de discutir abertamente as colaborações de cada um.

 Entrevista Argentina – É pena que não se consiga. Como verás na PO 83, que aí chegará dentro de uma semana, juntámos um comentário vindo do Brasil com um artigo que a Ana fez a partir de textos que nos chegaram pela Internet. O assunto ainda talvez mereça mais análise na próxima PO.

(…)

Leituras – Não conheço nenhum dos dois livros que estás a ler sobre a I Internacional e o movimento operário francês. Também não prevejo tão cedo disponibilidade para me dedicar ao assunto. São tantos os livros, artigos, etc. que vão ficando para trás que às vezes desespero, mas sou obrigado a fazer opções todos os dias entre o que gostaria e o que posso fazer.

PO – Vais recebê-la por estes dias. Tem uma declaração do colectivo sobre as eleições, justificando por que não votamos, a política que vai ser seguida já está feita pelas “instâncias superiores”    e os partidos  são  os comissários políticos ás ordens de Bruxelas. A possibilidade de mudança não está no voto, está na intervenção directa dos trabalhadores, e essa é que tem faltado de há bastantes anos para cá, etc.

Galiza – Nos dias 13-15 Fevereiro reúne-se na Galiza uma Cimeira dos ministros da Justiça e do Interior da UE para tratar da “segurança”. Os camaradas galegos do NÓS Unidade Popular (que vieram ao nosso encontro de Dezembro) organizam uma contracimeira nos mesmos dias, com debates e manifestações. Vão estar presentes 2 ou 3 camaradas nossos para intervir no terceiro dia, sobre questões laborais. Mando-te aqui o último número que recebemos do jornal do partido ML deles, para teres uma ideia. São pelo menos bastante activos.

Por agora é tudo. Um abraço e até breve  

Cartas a HN – 8

Francisco Martins Rodrigues

Carta a HN – 8

21/10/1996

Caro Camarada:

Estou a responder às tuas cartas de 3 e 6 de Setembro, desejando que te encontres de saúde e com a energia do costume. A P.O. 56 está na tipografia, esperamos poder fazer a distribuição amanhã. Como verás quando a receberes, houve desta vez acumulação de textos grandes, que nos obrigaram a retirar várias colaborações, entre elas o depoimento que enviaste. Fica para a próxima, tal como um artigo meu que tenho vindo a trabalhar, sobre o tema do Imperialismo. O Bitot é muito interessante e esclarecedor, mas no segundo livro dele, “Le Communisme n’a pas encore commencé” (que só existe em francês), apresenta, quanto a mim, uma forte incompreensão do fenómeno do imperialismo. O AN, embora lhe faça algumas críticas acertadas, na troca de cartas que publicamos nesta P.O., também acaba por lhe fazer algumas concessões e desvaloriza o trabalho de Lenine a este respeito. Espero por isso poder publicar na próxima P.O. um artigo claro sobre este assunto. Se se percebe a mecânica da concentração do capital mas se omite a espoliação e opressão dos países ricos sobre os países pobres, vamos por mau caminho. E muito fácil a quem vive na Europa esquecer-se que o avanço capitalista repousa sobre biliões de miseráveis do Terceiro Mundo.

Quanto ao depoimento-proposta que assinas em conjunto com o JM, ele retoma uma preocupação que já exprimiste anteriormente numa outra colaboração saída na P.O.: tomar medidas práticas para sair do impasse a que chegámos, atrevermo-nos a criar um núcleo orgânico, mesmo pequeno como seria esse Centro Marxista Popular, para tentar crescer a partir daí. Só posso apoiar a ideia e espero que a publicação do artigo desperte algumas vontades adormecidas. Tencionamos fazer até ao fim do ano um encontro com alguns camaradas e aí tentaremos ver a receptividade à ideia. Mais não te posso dizer, pois como deves ter constatado quando da vossa visita a Portugal, o problema actual do grupo P.O. é estar reduzido a tão poucas pessoas activas que fica esmagado só pelas tarefas da edição da revista, de um ou outro livro e da gestão da gráfica. Fizemos em Junho uma pequena reunião e os resultados não foram nada animadores, pois amigos que outrora já foram activos e agora estão desmobilizados só abrem a boca para pôr defeitos à P.O. e quando solicitados a colaborar no melhoramento, respondem que a sua vida não permite…

Enfim, creio que a atitude destas pessoas só se modificará quando algum acontecimento da luta de classes, nacional ou internacional, as sacuda do torpor e desânimo em que caíram. Há que confiar que gente nova também aparecerá, por força. Mas voltando ao teu artigo: proponho-me portanto incluí-lo na próxima P.O., fazendo alguns melhoramentos de redacção, desde que me dês autorização para isso. Para além das emendas que indicas na tua carta, eu aconselhar-te-ia, em futuros escritos, a usares mais a frase curta, porque as ideias encadeadas umas nas outras em frases muito extensas obrigam o leitor a muito maior atenção e daí até ao cansaço e ao pôr a leitura de lado vai só um passo…

A entrevista com a MM vem já neste número. Peço que lhe dês as minhas saudações e o pedido de que nos prepare um artigo sobre a condição da mulher trabalhadora na Suíça, como ela diz no fim da entrevista. Factos concretos, sem preocupações de teorizar muito. Pode ser bem interessante.

Assinatura P.O. — a tua assinatura está válida até ao nº 59, não precisas de te preocupar. Quando estiver prestes a caducar receberás um postal de renovação. Espero que nessa altura decidas assinar, caso contrário vou aí ajustar contas contigo.

Livro soviético sobre a religião — não sei do que se trata, lamento não te poder ser útil.

História do PC — já vem neste número um primeiro artigo, agora quero ver se mantenho a passada; material não me falta, com base na minha experiência. Vamos a ver se os artigos não ficam muito chatos, os leitores de hoje já pouco se interessam por essas histórias de outros tempos.

Dinossauro — o monstro sai da toca na próxima quinta-feira, para apresentar mais um trabalho: a novela “Kianda – O Rio da Sede”, do capitão Álvaro Fernandes, que foi pessoa muito em destaque na altura do Verão Quente de 75 pelo seu apoio à corrente da extrema-esquerda. São episódios da guerra colonial contados por quem lá esteve; a piada é ele dar alternadamente a luta vista do lado dos portugueses e do lado dos guerrilheiros. Pode ser que mais algumas cabeças deste país comecem a perceber que aquilo foi um crime colectivo em que não só o Salazar teve culpas. Agora que o ambiente por aqui é todo de regresso a África, creio que o livro é oportuno. Mando-te para já 3 exemplares, para tu e o Z angariarem por aí alguns compradores. As próximas edições Dinossauro ainda não se sabe quais são e quando são, tudo depende das massas, que estão curtas…

Jornais suíços — recebemos a batelada e vi que o Quotidien é progressista, mas para a próxima agradeço que mandes só os recortes do que te parecer mais útil para nós. Recebemos vários números do Solidarité mas só o que tu nos mandaste, não temos nenhuma assinatura.

Contraponto — Combinámos com o MV Vaz ele continuar em Paris a coligir os materiais, fazer e expedir pelo correio (o que ele diz que pode conseguir sem grande despesa), dando-nos a conhecer previamente o conteúdo de cada número. Aguardo agora notícias dele a este respeito, vou-lhe escrever.

Máquina de escrever eléctrica — Esse artigo está muito desclassificado nesta era dos computadores. Ainda não me informei mas vou saber e digo-te.

Marx e Engels em português — Conhecermos o seguinte, além do Capital . ——————- . Queres algum   deles?

Por agora é tudo. Aceita um abraço

Cartas a HN – 5

Francisco Martins Rodrigues

Carta a HN – 5

10/12/1995

Caro Camarada:

Chegou aqui há 15 dias uma carta tua de 17 de Setembro. Crises dos Correios… Espero que tudo por aí esteja a correr bem. Aqui, apesar do golpe[i] que tivemos, as coisas não vão mal. Já conseguimos recuperar uma parte do dinheiro e esperamos que até ao fim do mês entre outra parte. Temos trabalho e vamos com a empresa por diante, que é o nosso ganha-pão para poder manter a P.O. Foi hoje para a tipografia o n° 52, que devem receber aí dentro de uma semana. Desta vez não tem colaboração do comité regional de Genève mas espero que no próximo número haverá alguma coisa. Põe-te em campo com o Z e arranjem-nos alguma coisa; por exemplo, mais uma entrevista com emigrantes; não é preciso ser pessoa com as nossas ideias, basta que conte coisas concretas e interessantes sobre a sua vida aqui em Portugal, porque emigrou, o que tem a dizer sobre o tratamento dado aos emigrantes pelas autoridades suíças, como está o desemprego aí, condições de trabalho, etc. Também pedimos recortes da imprensa daí que tenham coisas aproveitáveis para a P.O. Estamos a pensar dedicar o n° seguinte da P.O. à questão do desemprego e gostaríamos de ter elementos sobre a situação, sobretudo na Europa.

Neste n° carregámos sobretudo na questão das tropas para a Bósnia e nas eleições. Em qualquer destes assuntos, a nossa posição é mal aceite pela maioria das pessoas da área da esquerda, acham-nos “sectários”, “esquerdistas”, etc. É por isso que não conseguimos romper o isolamento, mas que lhe havemos de fazer? Temos que dizer aquilo que achamos mais justo, do ponto de vista dos interesses a longo prazo do proletariado. Esperemos que algum dia mais pessoas reconheçam isso. Sobre estes dois pontos em concreto: Não às tropas para a Bósnia e abstenção eleitoral, gostaríamos de conhecer as vossas opiniões.

Foi pena que o nosso conhecimento tenha sido em condições tão desagradáveis, devido ao golpe que nos foi dado e que quase fez abortar a festa de aniversário que pretendíamos ter. Haja confiança que no 20° aniversário será melhor… Abraços.

[i] Desfalque financeiro na empresa gráfica que sustentava a “Política Operária”. (Nota de AB)

Cartas a JM – 12

Francisco Martins Rodrigues

Carta a JM – 12

20/2/1991

Caro Z.:

Recebemos a tua carta e mandámos a revista para a pessoa que nos indicaste.

Como vão aí as coisas sobre o Golfo? Mando-te um boletim duma comissão em que estamos a trabalhar. Também um boletim “Denúncia” contra a repressão.

Será desta vez que mandas uma colaboração sobre a situação dos emigrantes na Suíça? Se não convier meter o teu nome, põe-se um pseudónimo. Ela que venha, sairá na PO 29. Recebeste o nº 28?

(…) Abraços de nós todos para ti, para a V e para os júniores. Até breve

 

 

Cartas a JM – 8

Francisco Martins Rodrigues

Carta a JM – 8

30/3/1989

Camarada:

Temos estranhado bastante não receber qualquer resposta tua às nossas cartas de 20/11 e de 3/1. Tenho ligado várias vezes (…) mas não consigo contactar-te. Peço que escrevas ou melhor que telefones urgentemente a dar notícias.

Como verás pelos recortes que junto, entrámos numa frente com dois grupos trotskistas para concorrer às eleições para o Parlamento Europeu. Vamos aproveitar o tempo de antena para dizer umas coisas. Temos muito interesse em falar sobre a situação dos emigrantes. Todo o material que nos possas enviar é da máxima importância. O melhor de tudo seria se pudesses meter umas férias e vires cá, mas se puderes gravar imagens ou declarações para a rádio ou televisão já ajuda.

 Vou continuar a tentar ligação pelo telefone (…). Peço que comuniques connosco. Recebeste a revista nº 18? Como vão as tuas actividades? Um abraço

 

Cartas a EL – 4

Francisco Martins Rodrigues

Carta a EL – 4

2/2/1996

Caro Amigo:

Agradecemos os votos para o novo ano, assim como o texto sobre as greves em França, que nos pareceu esclarecedor. Embora não podendo publicá-lo na íntegra, fizemos uma condensação que vem no próximo n° da P.O., a sair dentro de uma semana. Sempre que puder mandar-nos recortes da imprensa ou outros materiais interessantes da esquerda, será uma boa ajuda para a nossa revista. Esperamos que esta continue a agradar-lhe e continuamos abertos às críticas esugestões que a sua leitura lhe suscite.

Com as nossas saudações

 

Cartas a MV – 54

Francisco Martins Rodrigues 

Carta a MV (57)

22/2/998

Meu caro.

A PO 63 seguiu já há dias, deves ter recebido. Vão agora 2 exemplares de cada dos
últimos livros editados pela Dinossauro. Se precisares mais, diz. Estamos a racionar um pouco porque fizemos só 500 de cada, para cortar despesas e agora arranjámos um novo distribuidor a quem vamos entregar 400 de cada, pouco sobra para a distribuição interna. Mandei já 3 exemplares, salvo erro, ao Tom Thomas.

Agora estou a pedir com urgência e premência peças de teatro, poesias ou outros
textos do Brecht, para considerarmos a hipótese de editar um volume por ocasião do centenário que está a passar. Aqui está praticamente tudo esgotado. Podias escolher algumas coisas dele que achasses mais explosivas e mandar-nos? Soube que as obras dele em França foram em grande parte lançadas por uma editora Arche, deves conhecer. Claro que a ideia é fazer traduções sem pedir direitos, se não torna-se incomportável. Não me deixes pendurado![1]

Tenho visto pelas fotos , apelo e outros materiais que tens enviado que a luta dos
desempregados está aí a aquecer. Já não veio a tempo de meter na PO. Eu traduzi e condensei um extenso artigo do Courant Altematif. E a propósito: porque não preparamos o Contraponto 4 com materiais sobre o desemprego na Europa? Nada mais actual. Deves ter muitos elementos. O que é preciso é decidir depressa porque os meses passam.

Na próxima PO publicaremos uma carta do Claude Bitot, que mandou para o
Monde Diplomatique e de que eles só transcreveram uma parte. E uma boa resposta a essa canzoada que por aí a ganir contra os horrores do comunismo. Só num ponto discordo dele e di-lo-ei na revista: é absurdo criticar os bolcheviques por terem tomado a cabeça da revolução e terem tentado levá-la o mais longe possível. Nesse ponto é que o homem descarrila. Como se a opção não fosse entre isso ou traírem as massas que queriam pão, terra e sovietes. As coisas correram mal não por culpa deles mas porque a revolução não dava para mais.

Junto devolvo uma carta para ti que abri por não saber que era pessoal. Um abraço

——————-

[1] Veio a ser editado nesse ano de 1998 pela Dinossauro o livro Brecht. Poesia – Textos – Teatro, “selecção de poesias, textos e peças de teatro radiofónico de um dos mais importantes e influentes autores do século XX”, segundo o catálogo editorial. (Nota de AB)..

 

 

Cartas a MV – 52

Francisco Martins Rodrigues 

Carta a MV (55)

5/11/997

Caríssimo:

Estava justamente para te escrever porque os teus materiais têm chegado em barda, em tal ritmo que ficam muitos para leitura posterior. Não me posso queixar.

A PO seguiu, deves ter recebido depois do teu último bilhete. Como terás visto, acabei por fazer um breve resumo da tua nota sobre as rodriguices[1]. Falei com o Carretas, que não me pareceu muito empenhado numa guerra com essas bandas; e pela nossa parte, pareceu-me que à quase totalidade dos leitores seria impossível apreender o sentido da polémica. Conservei por isso o que me pareceu essencial: o elogio da peça e a crítica aos críticos. Tu dirás se achas bem Metemos também uma pequena recensão sobre o Albatroz e ainda a nota sobre o José Manuel Manuel Fernandes[2].

Agora espero uma Carta de Paris para o nº 62, que já começa a dar os primeiros passos. Tem que estar pronto antes do fim deste mês de Novembro, para recuperar o atraso do anterior. A regularidade da publicação tem sido ponto de honra nosso desde o princípio e não quero agora começar a ceder. Para o próximo número estou a preparar uma última resposta ao AN; mesmo que ele volte a responder não continuarei esta polémica, porque vai saltitando de tema para tema e porque usa um estilo acintoso que me é desagradável. Não quero entrar por esse caminho e parece-me já ter evidenciado as mazelas da sua cabeça. Além disso, ele aumenta sempre o tamanho das respostas, de tal modo que ameaça inundar a revista. Neste último, tivemos que guardar metade do artigo. Sai no próximo.

Tenciono também continuar o tema “Europa – o eclipse da revolução”, agora num plano mais actual, tentando responder à interrogação: actividade comunista em Portugal, hoje, o que pode ser? Com sindicatos? Com parlamento? Como fazer para que as reivindicações diárias concorram para acumular forças revolucionárias? Francamente, não sei onde está a resposta, é só para explorar o assunto. O facto é que, dando o balanço às minhas experiências “comunistas” até hoje, só vejo acumulação de forças reformistas, não revolucionárias, e isso tem a ver com a concepção geral dos métodos de luta, não pode ser atribuído apenas às inclinações oportunistas dos Cunhais ou Arrudas.

Estamos a preparar aceleradamente dois Dinossauros: a “Breve história do indivíduo”, do Thomas, agora em revisão final da tradução, e um texto de um professor do Senegal sobre a situação em África (umas 80 páginas) que me pareceu interessante e que ele me autorizou a editar[3]. Não vai ter venda nenhuma, mas é a nossa modesta contribuição para a Expo’98. Diz lá das boas sobre o imperialismo europeu. Assim que estiver pronto, mando-te.

Para o próximo Contraponto não sei se estás já a coligir algo. Proponho-me traduzir o artigo que me mandaste do Michael Lõwy sobre as ideias do Che. Achas bem? Diz-me se tens planos e não te descuides. Quanto ao abaixo-assinado a Estocolmo, acho bem gozado mas ficaria talvez mais eficaz se um pouco mais condensado. Meteste-lhe talvez ideias demais, e a piada sobre Aljubarrota parece-me uma excrescência. Mesmo a boca sobre o Nobel ao Egas Moniz talvez já desvie as atenções do essencial: temos valores pujantíssimos que o mundo não reconhece. Queremos um Nobel! Achas que os brasileiros devem vir na lista? A mim parece-me que o chauvinismo lusitano exige é um prémio para um dos nossos, estão-se marimbando para o Amado ou o Melo Neto. Foi de propósito que não mencionaste o Saramago e o Lobo Antunes? Ao que percebi, vai acesa a guerra e o Saramago promove-se descaradamente. Avança com o apelo Albatroz; mas não me peças para o traduzir, tem uma série de expressões que não domino, além de que é indecente, tu, um português de Guimarães, quereres que eu te traduza os teus texots do francês. Se isso se sabe por aqui, ficas queimado de vez.

Atenção à mudança de telefone e fax, mudámo-nos para a rua (…). . Os Douradores e o Ferragial[4] acabaram! Até breve, um abraço

—————-

[1] Referência ao jornalista José Manuel Rodrigues da Silva, ao tempo editor do Jornal de Letras, que fizera uma recensão sobre a peça ”Bolero”, acabada de encenar por José Carretas. (Nota de AB)

[2] Jornalista então editor do jornal Público. (Nota de AB)

[3] Crise africana. Alternativas, de Bernard Founou-Ttchuigoua, ed. Dinossauro, 1998. (Nota de AB)

[4] Anteriores locais de trabalho da Política Operária. (Nota de AB)

Cartas a MV – 44

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (49)

5/6/1994

Caríssimo:

Com a P.O. na tipografia, venho pôr em dia a correspondência. Desde já. para te
tranquilizar: tenho recebido os teus cartões (o relato sobre o 25 de Abril parisiense sai na P.O. nas Cartas do leitor), assim como o vale de 10.000$. Enviei o livro para os cinco nomes que  indicaste.

Perguntas porque não inclui o livro depoimentos do Guinot, Vanzeller, Brochado, etc. Não
foi por falta de os contactarmos, mas por falta de tempo para irmos à procura deles de gravador na mão. Foi assim que arrancámos muitos dos testemunhos, à má fila. Todos se mostravam interessados na ideia mas quando chegava a hora de falar para o gravador ou de escrever, cortavam-se. O BC foi um dos primeiros que convidei mas nunca chegou a dispor-se. O R a mesma coisa. O G quando viu o livro ficou arrependido de não ter contado
a sua história, o B também. O Zé Cigano não respondeu ao nosso convite e agora soube
que tem andado cá pelo país e não nos procurou. É parecido contigo… O V não sei onde
pára. A propósito, disseram-me há dias que o Zé Machado morreu, não sei se de acidente ou de doença súbita.

O livro está a sair razoavelmente mas em venda directa, na nossa área! A distribuidora já o
colocou nas livrarias, está à venda na Feira do Livro, mas, sem referências na grande imprensa, prevejo uma venda fraca. Saiu uma nota curtíssima no
Expresso, outra no Diário de Notícias e uma pequena crítica no Jornal de Letras. Nada mais. O crítico do Público, apesar de muito namorado, não se dignou mencionar. Amanhã vou ao Porto a uma sessão da lançamento nortenha na cooperativa “Gesto”, vamos a ver se a imprensa do Norte diz alguma coisa. Temos que compreender que os rapazes da imprensa fiquem embaraçados com este tipo de literatura, são “guerras” que já não interessam, agora que estamos em plena revisão da história.

Não sei se acompanhaste, mas o 20° aniversário aqui foi dominado pela reavaliação “objectiva da guerra colonial, do Marcelo Caetano, da PIDE… num retorno desbragado da velha direita, dando-se ares de vítima dos “excessos revolucionários”. Não é só aí que andam ocupados em saber se a morte do Luís XVI foi injusta ou se o Pétain foi um “patriota”. Aqui segue-se a moda. De modo que a produção dinossáurica aparece quase como uma obscenidade, a silenciar. Deixa- os andar…

Quanto a novos títulos Dinossauro, julgo que de imediato não podemos pensar nisso,
temos que digerir primeiro o rombo económico desta edição. Apesar de a composição e
montagem serem feitas com o nosso trabalho militante, a despesa da tipografia é brutal. Coisas que tu conheces de sobra.

O Tom Thomas mandou-me a declaração e concorri ao pedido de subsídio para a edição do livro dele sobre Ecologia (o subsídio é apenas para a tradução) mas sem esperança nenhuma de ver dinheiro daí. Esse livro é uma das nossas hipóteses de edição
próxima, embora receemos a falta de interesse do grande público, se a imprensa não disser
qualquer coisa favorável (e não vai dizer, decerto). Mais lá para diante, pensava na hipótese de dar uma redacção unificada e melhorada aos muitos artigos que tenho publicado na P.O. sobre o fracasso das revoluções deste século. Assunto a pensar melhor. Enfim, as Edições, por enquanto vão a meio gás, até por falta de mão-de-obra para assegurar ao mesmo tempo a P.O.

Neste número da P.O. incluímos umas teses sobre as eleições do Parlamento Europeu,
acerca das quais gostava de conhecer a tua opinião. Temos discutido muito pouco o assunto Europa e só temos algumas ideias gerais. O panorama das candidaturas de “esquerda” é lamentável, é tudo reformismo, sem quaisquer rasgos de radicalismo. Frutos da época.

Vou enviar-te os 5 exemplares pedidos do livro e espero que a tua editora brilhe no
mercado da poesia. Um abraço, até breve.