Cartas a HN – 16

Francisco Martins Rodrigues

Carta a HN – 16

25/9/2001

Caro Camarada:

Os acontecimentos estrondosos de 11 de Setembro puseram tudo em polvorosa, aí como aqui, certamente. E a P.O. também foi fortemente abalada, porque tivemos que nos pôr a escrever à pressa sobre as lições a tirar do que se passou e de que modo vai afectar a nossa actividade futura. Estamos a esforçar-nos por não deixar atrasar a saída da revista, que espero seja em meados de Outubro. Resulta daqui que uma boa parte dos materiais que estavam para entrar tiveram que ser metidos em carteira, entre eles o teu artigo.

De resto, eu estava para te escrever acerca do artigo, porque nos pareceu (não só a mim) que precisa de alguma reformulação. Estou inteiramente de acordo com a tese central que defendes – a urgência de uma educação política e filosófica do proletariado para que este tome consciência do poço em que está metido e se lance numa luta não só estreitamente económica mas sobretudo política e organizada em Partido – mas isto está dito de uma forma pesada, abstracta, demasiado alongada, que não convida o leitor a chegar até ao fim. Numa palavra, os poucos argumentos que desenvolves não correspondem à extensão do texto. Por isso te propomos que trabalhes o artigo um pouco mais, para publicação futura, ou, se isso não te for possível de imediato, que abordes outro tema. De uma maneira geral, acho que deverias escolher exemplos, casos concretos como ponto de partida para a tese que queres defender. É isso que desperta o interesse do leitor e lhe permite captar a mensagem que queres transmitir.

Sei que não levarás a mal esta crítica, já nos conhecemos o suficiente para trocar ideias em perfeita franqueza. Pelas razões já atrás expostas, o capítulo do Tom Thomas que te deste ao trabalho de traduzir também não será publicado, ao menos por agora. Falas na possibilidade de uma entrevista a uma camarada: manda a cassete quando quiseres. Quanto à “Voz do Trabalho”, está a dar os primeiros passos e, por agora, a preocupação principal é conseguir que a criança não morra à nascença. Todo o apoio ou divulgação que possas dar será bom, pois o núcleo redactorial luta com grandes dificuldades.

Trabalhos práticos: 1) Dirigimos uma carta ao Bloco, UDP, PSR, FER, MRPP e outros grupos da esquerda propondo um encontro urgente para se formar um comité unitário capaz de fazer agitação contra o assalto americano em preparação contra os árabes; não estamos optimistas quanto a respostas porque andam todos empenhados na porcaria das eleições autárquicas e não lhes sobeja tempo para se ocuparem de casos “menores” como este; além disso, receiam queimar-se como “extremistas” e perder votos nas eleições. A esta miséria chegou a esquerda.

2)      Estamos a convocar uma reunião de pessoas mais próximas de nós para ver se lançamos esse tal comité, mesmo que não envolva partidos. Será a 13 de Outubro.

3)      Dia 28 de Setembro vamos a uma concentração promovida pelo Conselho da Paz (revisa) frente à embaixada de Israel. Vamos a ver se aparecer gente. Os revisas, pelo mesmo motivo dos outros, estão encolhidos. Além disso, a sua crise interna tem-se agravado e estão com dificuldades de mobilização. Há em Lisboa uma luta acirrada entre os cunhalistas e o sector intelectual.

4)      Projectamos fazer em Novembro um encontro pelo aniversário da P.O., que gostaríamos de transformar num encontro anual de debate da nossa corrente. Já começámos a fazer convites mas por enquanto não sabemos o que se vai conseguir. O tema central, claro, teria que ser este do “antiterrorismo” dos maiores terroristas que já houve à face da terra, os americanos.

De tudo te darei mais notícias à medida que as coisas se confirmarem. Caro camarada, um abraço e votos de saúde  

Cartas a JM – 3

 

Francisco Martins Rodrigues

Carta a JM – 3

24/5/1986

Camarada:

Respondemos à tua carta de 3/3 que recebemos com muito atraso porque tinha ido para a Rua de São Tomé, donde já saímos há uns meses. Mudámo-nos para uma casa maior, mas onde trabalha exclusivamente a nossa empresa gráfica. Deves por isso dirigir toda a correspondência a (…).

Também nós lamentamos muito o atraso em estabelecermos um contacto mais estreito. Quando o ZB esteve aí a trabalhar no Verão, mandámos um telegrama para a tua antiga morada a propor um encontro, mas veio devolvido com a indicação de “desconhecido”. O B chegou a procurar-te lá mas não conseguiu nenhuma informação a teu respeito. De modo que ficámos à espera que desses notícias. Actualmente, o B já regressou e a possibilidade de contacto entre nós será precisamente nas tuas férias, se te deslocares a Portugal. Seria muito importante conseguir discutir um bocado.

Tínhamos inicialmente a nossa 3ª Assembleia anual marcada para 27/28 de Junho, mas devido ao período eleitoral que se aproxima e que vai exigir de nós algum esforço, resolvemos adiá-la para Outubro. Não será por isso viável a tua participação na assembleia (supomos que vens em Agosto?) mas isso não impedirá de fazermos umas reuniões de debate, conheceres uns tantos camaradas e aperceberes-te melhor da situação por cá, do que é a OCPO e do que andamos a fazer. As condições de trabalho para uma força comunista revolucionária são neste momento péssimas em Portugal, devido ao ambiente de desmoralização que atravessa o movimento operário e a debandada reformista geral, que também já mina as fileiras do PC(R) e UDP. Cá vamos resistindo e tentando abrir espaço, baseados no debate teórico da PO e nalguma actividade sindical. O que é importante é não darmos o flanco a tendências de capitulação e aguentarmos o tempo que for preciso até a onda virar. Penso que temos um núcleo capaz de aguentar e furar.

Tudo isto teremos que discutir calmamente para tu saberes até onde deve ir a tua ligação à OCPO e o que poderás fazer em apoio deste projecto. É claro que o ideal seria tu fixares-te aqui em Portugal mas possivelmente não terás segurança de emprego. Assuntos para discutir, diz-nos rapidamente quando pensas chegar aqui e como nos poderemos encontrar. Um sítio aonde te poderás dirigir é à empresa, na Rua Frof. Sousa da Câmara, 166, Lis- boa (às Amoreiras-Campolide). Se houver desencontro, deverás ligar para … (empresa) ou para minha casa, …. Quanto aos materiais que pedes, fizemos seguir uma encomenda que já deves ter recebido, com factura junta. O valor do teu cheque foi de 5.520$00. Da “Tribuna Comunista” só enviámos o nº 9, com as resoluções da 2ª Assembleia; como os outros tratam de questões internas, não achámos bom enviá-los pelo correio. Poderas lê-los aqui, assim como obteres toda a informação sobre a nossa vida. Quanto ao jornal “Tribuna Operária”, não registámos a assinatura que pedes porque tem por enquanto uma saída irregular. Está agora para sair um nº que te enviaremos.

Enviamos junto um manifesto que distribuímos aqui e a que alguns jornais se referiram, propondo uma coligação eleitoral de esquerda. Não tivemos força para aglutinar os pequenos grupos de esquerda nesta coligação, como seria de prever. Os revisas, assim que souberam das negociações, trataram de ganhar um dos grupos (trotskista) oferecendo-lhe lugar nas suas listas; os outros dispersaram-se, por sectarismo de grupo e rivalidades, mas fundamentalmente por recearem aparecer a disputar publicamente espaço à esquerda do PCP. Enfim, estamos muito crus em todos os sentidos e somos ainda muito poucos para dar batalha a sério ao reformismo. Mas estamos na brecha.

No plano internacional, temos contacto com alguns partidos e grupos comunistas que romperam ou estão a romper com a corrente albanesa, cada vez mais amorfa. Contudo, também nessa frente as perspectivas são de uma luta prolongada, com poucas vitórias e curto prazo.

É tudo por agora. Ficamos a espera de notícias tuas, e sobretudo que nos apareças por aí um dia destes para discutirmos um bom bocado. Um grande abraço

 

PS – Se passares em Paris, poderias contactar o MV (conheces?). Mora na (…) Paris.

 

Carta a RB (1)

Francisco Martins Rodrigues

Carta a RB – 1

17/10/2000

Caro Camarada:

Com grande atraso respondo à sua carta. Tentei contactá-lo pelo e-mail mas não seguiu, deu a indicação de erro. Este é no entanto o indicativo que nos deu na sua carta. Por favor diga o que há.

Fizemos recensão na PO 74 do livro de Peter Robinson que nos enviou. Por acaso conhece ou pode obter-nos o livro “Portugal, the impossible revolution”, de Phil Mailer, Londres. 1977? Vimos uma referência elogiosa a esta obra e gostaríamos de a conhecer. Sempre que tiver publicações inglesas que ache interessantes por favor mande-nos pois gostamos de estar informados e dar a conhecer aos leitores o que se vai publicando lá fora. Espero que tenha entretanto recebido o livro “Abril traido” que lhe faltava.

A propósito dos 15 anos de publicação da PO vamos realizar uma sessão- debate no dia 4 de Novembro, com a participação de João Bernardo, marxista português radicado no Brasil, e de João Ricardo, trotskista brasileiro. Em 2 (ou 9) de Dezembro faremos outra sessão, para que convidámos o Samir Amin e o Tom Thomas. Se por acaso estiver em Lisboa numa dessas datas, fica já convidado. A PO 76. que receberá dentro de dias. traz a informação do local. etc.

Aceite as nossas saudações

Cartas a MV – 44

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (49)

5/6/1994

Caríssimo:

Com a P.O. na tipografia, venho pôr em dia a correspondência. Desde já. para te
tranquilizar: tenho recebido os teus cartões (o relato sobre o 25 de Abril parisiense sai na P.O. nas Cartas do leitor), assim como o vale de 10.000$. Enviei o livro para os cinco nomes que  indicaste.

Perguntas porque não inclui o livro depoimentos do Guinot, Vanzeller, Brochado, etc. Não
foi por falta de os contactarmos, mas por falta de tempo para irmos à procura deles de gravador na mão. Foi assim que arrancámos muitos dos testemunhos, à má fila. Todos se mostravam interessados na ideia mas quando chegava a hora de falar para o gravador ou de escrever, cortavam-se. O BC foi um dos primeiros que convidei mas nunca chegou a dispor-se. O R a mesma coisa. O G quando viu o livro ficou arrependido de não ter contado
a sua história, o B também. O Zé Cigano não respondeu ao nosso convite e agora soube
que tem andado cá pelo país e não nos procurou. É parecido contigo… O V não sei onde
pára. A propósito, disseram-me há dias que o Zé Machado morreu, não sei se de acidente ou de doença súbita.

O livro está a sair razoavelmente mas em venda directa, na nossa área! A distribuidora já o
colocou nas livrarias, está à venda na Feira do Livro, mas, sem referências na grande imprensa, prevejo uma venda fraca. Saiu uma nota curtíssima no
Expresso, outra no Diário de Notícias e uma pequena crítica no Jornal de Letras. Nada mais. O crítico do Público, apesar de muito namorado, não se dignou mencionar. Amanhã vou ao Porto a uma sessão da lançamento nortenha na cooperativa “Gesto”, vamos a ver se a imprensa do Norte diz alguma coisa. Temos que compreender que os rapazes da imprensa fiquem embaraçados com este tipo de literatura, são “guerras” que já não interessam, agora que estamos em plena revisão da história.

Não sei se acompanhaste, mas o 20° aniversário aqui foi dominado pela reavaliação “objectiva da guerra colonial, do Marcelo Caetano, da PIDE… num retorno desbragado da velha direita, dando-se ares de vítima dos “excessos revolucionários”. Não é só aí que andam ocupados em saber se a morte do Luís XVI foi injusta ou se o Pétain foi um “patriota”. Aqui segue-se a moda. De modo que a produção dinossáurica aparece quase como uma obscenidade, a silenciar. Deixa- os andar…

Quanto a novos títulos Dinossauro, julgo que de imediato não podemos pensar nisso,
temos que digerir primeiro o rombo económico desta edição. Apesar de a composição e
montagem serem feitas com o nosso trabalho militante, a despesa da tipografia é brutal. Coisas que tu conheces de sobra.

O Tom Thomas mandou-me a declaração e concorri ao pedido de subsídio para a edição do livro dele sobre Ecologia (o subsídio é apenas para a tradução) mas sem esperança nenhuma de ver dinheiro daí. Esse livro é uma das nossas hipóteses de edição
próxima, embora receemos a falta de interesse do grande público, se a imprensa não disser
qualquer coisa favorável (e não vai dizer, decerto). Mais lá para diante, pensava na hipótese de dar uma redacção unificada e melhorada aos muitos artigos que tenho publicado na P.O. sobre o fracasso das revoluções deste século. Assunto a pensar melhor. Enfim, as Edições, por enquanto vão a meio gás, até por falta de mão-de-obra para assegurar ao mesmo tempo a P.O.

Neste número da P.O. incluímos umas teses sobre as eleições do Parlamento Europeu,
acerca das quais gostava de conhecer a tua opinião. Temos discutido muito pouco o assunto Europa e só temos algumas ideias gerais. O panorama das candidaturas de “esquerda” é lamentável, é tudo reformismo, sem quaisquer rasgos de radicalismo. Frutos da época.

Vou enviar-te os 5 exemplares pedidos do livro e espero que a tua editora brilhe no
mercado da poesia. Um abraço, até breve.

 

Cartas a MV – 29

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (34)

15/4/1992

Caríssimo:

Agora que a P.O. 34 foi para o correio, já posso pôr a correspondência em dia. Estás recomposto do desastre de ter perdido a bagagem? E de saúde, tudo bem? Eu continuo na maior.

P.O. – Espero que já tenhas recebido os 2 exemplares pedidos da P.O. 33. Da P.O. 34 seguiram 5 para a tua morada, mais um para o “Albatroz”. Como deves observar, estamos com dificuldade para fazer avanços teóricos. Falta de tempo, falta de gente. Aproveitei as tuas notas sobre o Amazonas e pus o teu nome a assinar comigo um artigo sobre o assunto. Correcto? Agora fico à espera de mais produção tua para o próximo nº, até 15 de Maio. Não esqueças!

Caso Joel Lamy – Fiz um artigo na P.O. 34 e enviei-lhe um postal para a prisão.

Marrocos – Com os materiais que me enviaste, fiz cartas às “forças vivas” cá da terra, desde o presidente da República, Assembleia, Amnistia Internacional, agência Lusa, jornais, denunciando as torturas, etc. e pedindo divulgação. Silêncio sepulcral! Ninguém disse nada, deve haver recomendações para não desfeitear sua majestade o torcionário em vésperas de visita (ainda não foi marcada data). Entretanto, recebi mais correspondência de Marrocos e vou fazer mais uma circular, a ver se furo o bloqueio.

Albatroz – suponho que estejas a lutar para o pôr na rua. Não escrevi nenhuma colaboração porque também não me deste um ultimatum com uma data precisa, e a tendência é para ficar à espera do último prazo. Francamente, também não estou a ver o que interesse mais para os teus leitores. Dá-me um palpite. Diz-me o que há.

Assinatura – Talvez tenhas recebido um aviso de fim de assinatura, enviado pelos nossos zelosos serviços administrativos. Não ligues.

PC(R) – seguem junto recortes do “Expresso” e da “Sábado” com entrevistas do Eduardo Pires, sobre a dissolução do partido. Lamentável. A “Sábado” tem umas declarações minhas, muito truncadas e com a cara do Tomé!

Situação política – Da situação internacional não digo nada; tu é que tens obrigação de me informar. A situação nacional está bastante repugnante: só se fala de altos negócios, corrupções, e intriguinhas políticas reles. As velhas famílias de tubarões, Mello, Champalimaud, Espírito Santo estão a refazer os seus impérios graças às privatizações. O governo, que andou uns anos a subornar os eleitores com concessões, para garantir a vitória nas eleições, agora está a pôr as contas em dia: aumento de preços e de impostos, tecto salarial. As pessoas não protestam; queixam-se, lamentam-se, e daí não passam.

 Em 21 de Março houve uma manifestação de protesto da CGTP; não chegou a mil pessoas. Um fiasco como nunca se tinha visto. Acho que já ninguém espera nada da CGTP. Quanto à UGT, além de furar as reivindicações, anda envolvida em casos mafiosos de roubos, que comentámos na última P.O., mas as pessoas verificam que é aceite pelo poder e portanto aceitam-na! De referir apenas uma boa e longa greve do Metro, com uma unidade fora do vulgar e contrariando inclusive decisões amarelas das duas centrais. Protestos há, sim, mas de sectores da burguesia que estão a ser atropelados pela integração europeia: professores, agricultores, magistrados, pequenos industriais… Os estudantes animaram o ambiente durante umas semanas com os seus protestos contra as restrições de acesso à Universidade e o aumento das propinas, mas é sol de pouca dura. Para onde vamos? Se a recessão europeia comprometer os planos de ajuda ao capitalismo nacional, as falências das pequenas e médias empresas podem tomar um ritmo assustador, e não sei como conseguirá o poder reintegrar toda a gente que está a ser mandada para a rua: têxteis, calçado, metalurgia, etc. Por enquanto o desemprego ainda não assusta. Seja o que deus quiser.

Os dissidentes social-democratas do PCP (Judas, Barros Moura) vão constituir um grupo político. Será a semente dum PS “de esquerda”, mais vocacionado para receber a herança do PCP quando o velho arrumar as botas? Em princípio, parece ter um espaço, mas não lhes vejo genica para isso. Por nós, seria bom que se metessem todos a negociantes e não viessem criar novas expectativas em alguns trabalhadores. O terreno da esquerda está quase todo varrido. Agora só falta nós tomarmos posse dele…

Quando cá vieres temos que trocar ideias sobre a hipótese duma revista não partidária, de esquerda, para penetrar mais longe do que a P.O., que continuaria, mais vocacionada para o debate ideológico. Não sei se estás a ver a ideia. Só falta dinheiro e gente… Um abraço, até breve.  

Cartas a MV – 24

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (28)

29/8/1991

Caro M:

Espero que a vida te corra bem e as férias melhor ainda.

Que me dizes às notícias da URSS? Vamos preparar uns comentários para a próxima PO mas receio que não tenham o sumo necessário em assunto de tanta envergadura. Não poderás mandar-nos daí algum comentário teu, assim como papéis da esquerda esquerdista sobre o assunto? O PCP aqui está agitado e o Judas parece desta vez ter-se decidido a disputar a chefia ao velho. Talvez vá sair um pecepezinho “renovador”. Fiz um depoimento para o “Expresso”, vamos a ver o que publicam, segue cópia para veres o tom que lhe dei.

Como te disse na carta anterior, vamos fazer um encontro no sábado 21 de Setembro (e não domingo como tinha dito antes). Se te calhasse estares em Lisboa nessa data era bem bom. Dá um jeito!

Vi referências num dos 3 papéis que ne mandaste a uma revista “Marxisme Aujourd’hui” de que é director o Pierre Broué. Poderias obter-me um exemplar para ver como é? Gosto de ler toda a papelada de esquerda que me envias. Agora é que é o período das cem flores, mas não se vê nada a desabrochar. Um abraço

Cartas a MV– 23

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (27)

25/7/1991

Caríssimo:

Tenho recebido pontualmente as jornaladas que me vais mandando e que me servem de respiradouro. 0 Monde Diplo é-me muito útil, como creio já te ter dito. Ainda só passei os olhos pelo livro do Tom Thomas, que me faz inveja por não ser capaz de me abalançar a põr em livro as minhas reflexões. Adiante.

A menção feita ao texto da haitiana no “Albatroz” pode não ter sido muito feliz, mas não me parece grave. Julgo que fiquei chocado pelo contacto com algo directo sobre esse país, de que é raríssimo aparecer algo por aqui. Poderá ter havido uma concessão da vossa parte, mas não me parece que a revista tenha perdido por isso.

Nós cá estamos a preparar a PO 31, que vai cair em cima de mais uma fogosa batalha eleitoral. Prevemos uma assembleia da reduzida organização que somos para 22 Setembro. Queres cá vir? Seria óptimo.

O relatório da comissão de investigação sobre o Golfo é aqui completamente desconhecido e como o assunto aquece de novo vamos publicar um resumo na próxima PO. Manda mais sobre isto se tiveres. Além disso, podes mandar mais sobre tudo.

Um abraço

O Futuro Era Agora

Agora em https://www.marxists.org/portugues/tematica/livros/futuro/index.htm

O Futuro Era Agora
O movimento popular do 25 de Abril

Edições Dinossauro


Primeira Edição: 1994
Coordenador: Francisco Martins Rodrigues

Colaboraram na recolha e tratamento dos textos : Ana Barradas; Angelo Novo; António Barata; António Castela; Beatriz Tavares; Filipe Gomes e Rogério Dias Sousa

Capa: António Barata

Transcrição e HTML: Fernando Araújo.

Direitos de Reprodução: © Edições Dinossauro


Índice

capa
Baixe o livro em pdf

Os 580 dias

Prefácio

Cronologia

Molotovs no Palácio de Cristal, Rogério Dias de Sousa

O mestre disse que a Pide tinha fugido, Maria Luísa Ernesto

As perdizes, Cândido Ferreira

Durante três dias mandámos no quartel, Manuel Figueira

Toda a gente empenhada em mudar a vida, Jorge Falcato Simões

Obrigámos o Jaime Neves a recuar, Manuel Monteiro

Da JUC para a fábrica, Berta Macias

O assalto à esquadra das Antas, José Carretas

Sindicalismos em conflito, Custódio Lourenço

Foi a minha universidade, Maria de Lurdes Torres

A “revolução” no Estado Maior, António S

Autogestão na Sogantal, José Maria Carvalho Ferreira

Assobiámos o Spínola no 25 de Abril, Amílcar Sequeira

Um jornal diferente, Júlio Henriques

Sem o 25 de Abril seria uma patetinha, Helena Faria

Revistar os carros da polícia, Luís Chambel

Meu saudoso PREC, João Azevedo

Despertar dum sindicato, Vítor Hugo Marcela

Ambição era tomar o poder, Joaquim Martins

Alegria e candura, José Manuel Rodrigues da Silva

Tudo era tratado na comissão, Maria da Graça Duarte Silva

O “Che” a falar na praça, pendurado num eléctrico, Paulo Esperança

Alegria nos arrabaldes, Fernando Dias Martins

Confrontos nas ruas do Porto, Alberto Gonçalves

Os partidos não me diziam grande coisa, Maria Amélia da Silva

Passámos de caçados a caçadores, António José Vinhas

Não soubemos explorar a crise de poder, Mariano Castro

O único perigo era para a direita, Vitorino Santos

Primeiros passos da Reforma Agrária

Fazer frente aos pcs não era pêra doce, José Paiva

Lisboa – Luanda, Orlando Sérgio

Foi uma descoberta, Bárbara Guerra

Reunião de prédio, Pedro Alves

O Pires Veloso dormia na cave, José Guedes Mendes

A militância era uma festa, Nela

Os soldados não ligavam aos oficiais, Manuel Borges

Vivi por antecipação a derrocada, Helena Carmo

Sempre atrasados, José Manuel Vasconcelos Rodrigues

Uma estranha liberdade, Rita Gonçalves

Falharam os três D, Mário Viegas

O povo à porta do quartel a pedir armas, José Manuel Ferreira

Despertei no 25 de Novembro, Altamiro Dias

O povo em armas? Uma fraude, Tino Flores

Como entrei nas “catacumbas”, “Brezelius”

Andei a vasculhar a sede da PIDE, Avelino Freitas

Comecei a pensar no que poderia vir, Maria da Glória R. Borges

Dormir ao relento à porta da fábrica, Maria Luísa Campina Segundo

O poder parecia tão próximo…, Fernando Reis Júnior

Um cabo-verdiano em Lisboa, Álvaro Apoio Pereira

Os polícias de braços no ar, António Castela

Uma burguesa entre operários, Marta Matos

Recordando o soldado Luís, Valdemar Abreu

Greve aos bilhetes, João Marques

Falar de Abril

25 de Abril: transformações nas escolas e nos professores, Eduarda Dionísio….

25 de Novembro: como a esquerda foi encurralada, Francisco Rodrigues

Autonomia dos trabalhadores, Estado e mercado mundial, João Bernardo

Brandos costumes & maus hábitos antigos, Manuel Vaz

Siglas

Bibliografia


Cartas a MV – 21

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (24)

20/2/1991

Velho M:

Estou aplicadamente a responder e a ausência não é de tantos meses como dizes; a minha última foi em Novembro, nada mau. Tenho recebido um rio de bilhetes, recortes, jornais, até um livro (“Mon ami le roi”). E também as tuas duas colaborações: a última, curta, saiu no PO 28 (por gralha não foi mencionada como “Carta de Paris”); a outra colaboração, com notas e discordâncias sobre a carta aos comunistas americanos já está composta e ere para sair no caderno cor-de-rosa deste nº 28 mas a acumulação de mate­riais sobre o Golfo obrigou a pô-la de parte. Sairá no próximo nº.

Creio que não tens razão nos teus receios a que deitemos demasiadas coisas pela borda fora. Julgo haver na tua visão sobre a URSS ainda uma carga antiga (quanto ao poderio, ao social-imperialismo, etc.) que me parece (que nos parece a nós aqui) desmentida pelos aconte­cimentos recentes. Eu acho a perspectiva que damos hoje nesta PO so­bre a degenerescência e apodrecimento do regime soviético muito mais marxista-leninista do que a que herdámos dos chineses, albaneses, etc. Sem dúvida, o assunto precisa de mais discussão e a tua carta aju­dará a essa reflexão. Esteve cá um dos dirigentes do MU americano e travámos debates, inconclusivos mas amigáveis. Eles prometeram publicar no seu jornal uma resposta à nossa resposta, dentro de alguns meses. Quando a tivermos mandar-te-ei; possivelmente publicaremos.

Golfo: temos estado desesperadamente a tentar agitar as águas pantanosas do consenso pró-americano nesta terra, como verás pela PO 28 e por uma folha da CCIG[i] que aqui te mando junto. Estamos de novo associados com os trotskistas da FER, porque foram os únicos a condenar sem reservas a agressão imperialista americana. Hoje esti­vemos mais uma vez com uma exposição de painéis na Rua augusta e dis­tribuindo comunicados. Suscita uma enorme atenção e discussões por vezes acaloradas, com opiniões fascistóides a vir ao de cima a cada passo. Depois de amanhã vamos fazer nova concentração frente à embai­xada americana, mas não espero mais de duas centenas. Mando-te também fotocópia de alguns artigos que tenho publicado na imprensa, é pos­sível que algum vá repetido; tenho um artigo no “Público” à espera que saia, sobre o “anti-americanismo primário” (a desculpa prefe­rida dos nossos intelectuais vendidos) mas está difícil de sair, desconfio que as minhas hipóteses no “Público” vão acabar.

Recebi o artigo que te mandei “Lisboa a sono solto” tra­duzido em francês, mas não percebi porquê, porque não me voltaste a dizer nada sobre o Albatroz” que iria sair e para o qual te man­dei esta colaboração. São dificuldades financeiras, suponho? Há perspectivas de sair a breve prazo? O V afinal sempre te dá alguma ajuda? Diz-me alguma coisa sobre isto.

Ficámos aqui muito satisfeitos por ter chegado a resposta de Serfaty[ii] e a confirmação de que recebeu a encomenda com a PO. Te­mos estado a enviar-lhe a PO regularmente, espero que a receba. Vou decifrar o texto elaborado pelos presos sobre os recentes acontecimentos em Marrocos, talvez se possa publicar algo no próximo nº. Foi pena não ter chegado quinze dias antes; fiz um pequeno artigo sobre o assunto com base nas notícias dos Jornais, que saiu na PO 28.

Quem apareceu aqui com alguns manifestos mais radicalizados sobre a cruzada do Golfo ainda foram os anarquistas, temos algumas pontas para alguns, procurando vias de colaboração nesta frente. E aí, depois das manifestações que informaste, amainou o ambiente?

Ainda não li a tua intervenção no congresso sindical, che­gou aqui ontem, depois te direi algo.

Quanto ao resto da nossa actividade, segue como normalmen­te, isto é, reduzida a um punhado de “fanáticos” e por isso cheia de deficiências, mas cá vamos. Eu canalizo as minhas fúrias para os jornais; enquanto mas publicarem… Ontem mandei um depoimento para o “Independente” (da direita) sobre o maoísmo.

Um abraço, até breve

 

[i] Comissão Contra a Intervenção no Golfo (CCIG), ver comunicado em https://ephemerajpp.com/2014/12/07/comissao-contra-a-intervencao-no-golfo-ccig/. (Nota de AB)

[ii] Tratava-se do marroquino Abraham Serfaty (1926 -2010), militante e activista político, que foi preso durante o reinado autoritário do rei Hassan II. Esteve quinze meses num cárcere subterrâneo, tendo cumprido dezassete anos de prisão.  Em parte graças a uma campanha internacional a seu favor, foi libertado e viveu oito anos de exílio em França, antes de regressar a Marrocos, onde faleceu. (Nota de AB)

 

Cartas a MV – 16

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (21)

8/5/1989

Caro M:

Respondo às tuas cartas de 30/3 e 16/4. Estranho muito não teres mais uma vez recebido a P.O. Será que não está ninguém em casa da R durante o dia e o correio deita a encomenda fora? Enviei-te mais 4 ex. da PO 18 e 10 ex. da PO 19, espero que já tenhas recebido, assim co­mo a minha carta de 30/3 e alguns papéis da PER.

A candidatura está a andar. Compreendo que seria difícil a tua deslocação. Se pudesses en­viar-nos imagens (vídeo) da vida dos imigrantes aí para incluirmos no tempo de antena da TV se­ria bem bom. Quaisquer sugestões ou tópicos para metemos nos programas rádio e TV serão de grande valor, mas seria precise mandares com urgência.

Tenho recebido livros e jornais teus. O ZM telefonou há dias, está tudo bem mas difi­culdades financeiras impedem-no de ir a Paris.

A tradução francesa do Anti-Dimitrov está pronta, vou fazer uma revisão e depois edita-se. Tudo tão lento! Quando isto acalmar escrevo uma carta mais detalhada. Tivemos aqui um encontro com camara­das da Voie Prolétarienne. Confusos, pareceu-me.

Carta a MV (22)

15/5/1989

Camarada:

Um acrescento à minha carta de dia 8. Peço-te que nos informes rapidamente se tiveste conhecimento de que tenha estado alguma banca em nome da FER na festa da “Lutte Ouvrière” que se realizou em 15, 14 e 15 (acaba hoje). Isto porque nós aqui afirmámos não que­rer participar mas não temos a certeza de que os grupos trotskistas com que estamos a cola­borar na FER não nos preguem a partida de ir usar o nome da FER. Diz alguma coisa rapida­mente se puderes. E se puderes mandar algum vídeo sobre situação dos imigrantes em França mete-o no correio sem demora, para ver se ain­da incluímos no programa que estamos a prepa­rar para a campanha eleitoral.

Vamos fazer aqui um almoço anti-Salazar no dia 28 de Maio, está a haver uma recupera­ção descarada do fascismo. O Varela Gomes dis­cursa, eu se calhar também. Queres cá vir?

Um abraço

 Carta a MV (23)

14/6/1989

 Caro Camarada:

Só uma carta breve para te informar da nosso saída da frente da Esquerda Revolucionária que disputa as eleições ao Parlamento Europeu. Foi uma decisão difícil porque sabemos o descrédito que arrasta em torno da esquerda, mas não tivemos outra alternativa porque os nossos só­cios trotskistas são desleais em extremo e estavam a violar todos os acordos assinados, procurando servir-se de nós como muleta para a propaganda do seu “partido” em formação e para apresentar uma oposição moderada, reformista, que não correspondia nada ao que pretendíamos desta campanha. Como não tínhamos força para os meter na ordem (a Frente é legalmente propriedade deles), tivemos que sair. Envio comunicados e em breve poderás ver na PO 20 a análise que fazemos do incidente.

De resto, a nossa “guerra” conti­nua. E tu? Não tens mandado jornais nem livros. Não te esqueças de nós. Um abraço