Carta de João Pulido Valente ao CMLP

João Pulido Valente

Carta ao CMLP

 

3/8/1966

Caros Amigos

Só agora tive oportunidade de contactar com vocês. Há aproximadamente um mês que fui transferido para Caxias. Durante esse tempo inteirei-me do comportamento perante a polícia de todos os camaradas presos, tendo actualmente um conhecimento profundo do comportamento dos camaradas mais responsáveis. Continuar a ler

RELATÓRIO AO CMLP

Francisco Martins Rodrigues

RELATÓRIO AO CMLP[i]

(s. d.)

Como não sei se foram recebidos os dois relatórios anteriores, repito a descrição do meu porte na PIDE, procurando ser o mais completo possível.

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Cartas a JV – 2

Francisco Martins Rodrigues

Carta a JV – 2

22/10/1989

Caro Amigo:

Já lá vai mais de um ano que não temos contacto. Isso foi devido em parte à perspectiva que chegou a haver de que um amigo nosso (…) pudesse passar por Paris (…) levar-lhe uma carta minha, perspectiva que infelizmente não chegou a concretizar-se. Eu, pela minha parte, também planeio periodicamente ir aí, mas acabo sempre por ter que adiar.

Espero que esteja a receber regularmente a nossa revista e que ela não tenha desapontado as suas expectativas quanto à discussão dos problemas postos ao marxismo pela falência das sociedades de Leste. Sem dúvida temos um desacordo fundamental quanto ao leninismo, o papel do partido político da classe operária, etc. Estou convencido de que a liquidação final do tipo de regime a que nos habituámos a chamar comunista e o que virá a seguir contribuirão para fazer avançar as polémicas em torno desta questão. Uma coisa me parece indiscutível: é que foi Lenine que chefiou a revolução real que até hoje levou mais longe a expropriação da burguesia e isso parece-me um bom critério para me considerar leninista.

Mesmo com atraso, tenciono fazer uma referência crítica aos seus livros que teve a gentileza de me oferecer e que levantam muitos problemas interessantes. Por correio separado mando três suplementos da PO com traduções em francês de alguns artigos nossos, o que talvez lhe permita levá-los ao conhecimento de camaradas franceses.

Sem mais por agora, envio as minhas saudações cordiais

Cartas a HN – 2

Francisco Martins Rodrigues

Carta a HN – 2

8/6/1995

Caro Camarada:

Depois duma autêntica corrida de semanas para dar a P.O. como pronta, venho pôr a correspondência em dia e agradecer a forma como correspondeu ao pedido de colaboração que lhe tinha feito. A entrevista sai neste número, assim como algumas das suas opiniões e sugestões na secção de Cartas, embora não seja possível na íntegra. Julgo que este n° 50 não desiludirá os leitores e amigos da revista Agora interrompemos, como habitualmente, durante o Verão e cá estaremos de novo em Outubro. Pensamos nessa altura, como se completam os dez anos sobre a saída do n° 1 da revista, promover um convívio-debate com amigos sobre os temas que hoje preocupam os comunistas em toda a parte: que fazer? por onde recomeçar? como avançar? Estou a ler os livros de Arenas que me ofereceu e creia que não lhes diminuo o valor. Será um dos meus trabalhos de Verão.

Espero que tenha recebido em boas condições os livros da Dinossauro que tinha pedido. Vi que enviou 10.000$, quantia muito superior ao custo, pelo que o inscrevemos no Clube Dinossauro com o saldo daquela importância em crédito. Também procuraremos fazer sair mais algum título por altura das “festas” de Outubro, ainda não sei o quê.

Cartas a HN – 1

Francisco Martins Rodrigues

Carta a HN – 1

19/3/1995

Caro Amigo:

A sua carta foi uma agradável surpresa. Não é todos os dias que nos chegam saudações tão amigas e calorosas como a sua. O nosso pequeno núcleo editor da P.O. conta com apoios e colaborações preciosas mas infelizmente escassas e, ao longo destes dez anos que já levamos de caminho, cada vez mais escassas. Vivem-se tempos em que o comunismo não está na moda e as pessoas arredam-se de nós, umas por preconceito, outras intimidadas com a campanha da comunicação social, todas achando-nos mais ou menos excêntricos ou antiquados, por teimarmos em dizer coisas óbvias. Mais saborosa por isso a sua carta, que espero não seja a última.

Pelo que me relata fico com uma ideia dos baldões que deve ter sofrido, aliás como quase todos os aderentes dos grupos ML. Foi uma corrente de ideias que não vingou, embora tenha dito muita coisa acertada e desempenhado um certo papel durante a agitação de 74/75; tendo sido um dos seus iniciadores no nosso país, custa- me reconhecê-lo mas não posso deixar de o fazer.

O mal de partida (em que tenho a minha pesada parte de responsabilidade) foi pensar-se que a crítica à degeneração evidente da URSS devia traduzir-se pelo apoio incondicional ao período anterior (Staline) e aos que mantinham essa bandeira: a China, primeiro, a Albânia, depois. Ora, isso continha um compromisso no qual se deixou ir por água abaixo a capacidade de crítica marxista radical com que tínhamos partido e nos fomos cegando aos poucos, até que a corrente ML se desagregou no meio duma confusão tremenda, que não teria sido inevitável, mesmo que houvesse um recuo temporário.

Houve, é claro, os estragos causados pelos oportunistas. Houve quem fizesse muita trampolinice com o marxismo-leninismo enquanto se julgou que era produto com saída assegurada no mercado, que permitia agrupar umas tantas pessoas, fazer uns comícios e ganhar o apoio de algum país “socialista”. Isto aplica-se a quase todos os grupos, uns em maior, outros em menor grau. Quando veio a derrota do movimento e a desilusão, os que mais se tinham destacado em declarações inflamadas contra a burguesia e o imperialismo sentiram-se obrigados a renegar bem alto, para terem direito a sentar-se à mesa…

Mas misérias destas são inevitáveis em período de agitação, todo o processo revolucionário tem os seus parasitas. Pior foi a falta de lucidez marxista dos sinceros marxistas (e aqui contra mim falo). Tardámos muitíssimo em compreender as chamadas sociedades socialistas, em saber combinar a defesa intransigente das revoluções que lhes deram origem (russa, mas também chinesa, cubana, etc.) com uma crítica igualmente intransigente aos regimes que delas resultaram. Não percebemos que esses regimes eram transitórios, híbridos, e, como tal, iriam desaguar no grande rio do capitalismo. Tardámos em compreender que o fracasso dessas revoluções não foi culpa dos comunistas ou devido a traição deste ou daquele dirigente, mas porque as condições de atraso desses países não lhes permitiam dar o salto que os explorados e os comunistas desejavam. Marx já tinha dito que não se podia esperar a transformação comunista antes de se passar pela explosão produtiva que o capitalismo traz e o próprio Lenine fartou-se de fazer avisos sobre as limitações da revolução bolchevique, que foram depois considerados pessimistas.

Como não chegámos a uma visão de conjunto, coerente, do que eram essas sociedades, oscilámos entre posições igualmente erradas – uns desculpando tudo o que vinha da “pátria do socialismo”, outros considerando-a como “o inimigo principal dos povos”, outros ainda convencendo-se de que a China “boa” jamais seguiria as pisadas da URSS, etc. Foi preciso a derrocada do “campo socialista” para olharmos todo o processo com maior distanciamento e frieza. Agora que se fechou o parêntese, verifica-se que era Marx que tinha razão e que os marxistas não lhe deram ouvidos. Escrevo um pouco sobre tudo isto num artigo que Fiz para a próxima P.O. e que espero que leia. Temos muito orgulho na nossa P.O., em que andamos a batalhar desde 1984, mas não temos ilusões de que o nosso trabalho nestes dez anos no campo do marxismo-leninismo tenha sido alguma coisa do outro mundo. Temos progredido muito mais devagar do que seria necessário. E nestes períodos de refluxo da revolução que se pode aproveitar melhor o tempo para fazer balanços e traçar ideias gerais úteis num próximo ascenso, mas os nossos balanços e programas estão muito inacabados. Se daqui amanhã rebentasse uma nova grande comoção proletária e popular neste país (do que estamos bem livres pelos anos mais chegados…), os comunistas iam ver-se outra vez em palpos de aranha: como assegurar no partido comunista uma boa combinação de centralismo com democracia? como fugir à inevitável tendência de apodrecimento do movimento sindical? como explorar em nosso proveito a farsa das eleições burguesas? como evitar a hegemonia pequeno- burguesa sobre as massas proletárias? como conduzir o movimento revolucionário a fazer frente à repressão burguesa e a encaminhar-se para a conquista revolucionária do poder? como fazer vingar uma autêntica democracia proletária que não se deixe cair sob a pata da burocracia?

Já se sabe que estes problemas são para resolver na luta, não em gabinete, mas é preciso que os erros do passado estejam devidamente apontados e “catalogados”, para evitar que o movimento os repita por falta de conhecimentos. Uma das manifestações mais duras que encontrei do atraso do marxismo no nosso país e na nossa extrema-esquerda foi ver a ingenuidade arrogante com que militantes nascidos no calor da luta achavam que o caminho se descobre espontaneamente e olhavam desconfiados para as minhas preocupações “teoricistas” e “livrescas”. Enquanto o nosso movimento operário for dominado por esse culto da ignorância não poderá ir muito longe. Falta-nos ainda muito para chegar a algo que se possa chamar a “fusão do marxismo com o movimento operário”.

É claro que é preciso acompanhar o sentir do movimento, manter laços com ele, aprender com as suas lutas e nesse aspecto o balanço do nosso grupo também é modesto. Como somos um grupo reduzido (mais reduzido agora do que quando começámos), temos dificuldade em estar presentes nas lutas que se travam e em fazer agitação nos meios operários. A esse propósito, não sei se tem alguma disponibilidade para recolher alguma entrevista ou depoimento de trabalhadores emigrados aí na Suíça, seria uma boa ajuda para nós. Temos aí em Genève um camarada que já nos tem obtido algumas colaborações interessantes mas há muito tempo que não dá sinal de vida.

Para além da revista, cuja distribuição é outra luta que enfrentamos a cada número, lançámo-nos no ano passado no campo da edição de livros. Junto um catálogo para lhe dar a conhecer o que já fizemos e o que temos em preparação. Fora disso, há intervenções no plano sindical, na luta contra o racismo (que vai crescendo a olhos vistos), mas tudo em escala muito incipiente.

Agradeço muito a oferta do livro “Fin del capitalismo”, de que nunca tinha ouvido falar; vou lê-lo atentamente e passá-lo aos outros camaradas do comité de redacção para se analisar da vantagem e possibilidade duma edição portuguesa.

Não sei se esta carta, escrita a correr, lhe deixa alguma impressão de pessimismo, mas se for esse o caso, não se preocupe; é jeito meu ver mais os erros do que os acertos. No balanço final, sou firmemente optimista quanto à inevitabilidade de deitarmos para o lixo o capitalismo e passarmos a viver como seres humanos, em comunismo. E esse de facto o único assunto que me interessa, de há uns 50 anos para cá.

Aceite as minhas saudações calorosas.

Carta a CF – 3

Francisco Martins Rodrigues

Cartasa CF – 3

14/6/1989

Caro Amigo:

Obrigado pela sua boa carta. Creio que não tem dúvida de que a minha proposta para uma eventual colaboração sua na P.O. não teve outro objectivo do que animar o debate entre revolucionários, para tentarmos sair do impasse a que chegámos (não no terreno da acção de mascas mas no terreno dos programas politicos). Nós na P.O., pelo facto de nos considerarmos marxistas-leninistas, não pretendemos ter respostas feitas para a crise actual. Sabemos sim algumas perguntas a que é necessário encontrar resposta. Já ê alguma coisa…

No que se refere aos movimentos nos países de Leste, sou mais pessimista do que V. Acho que se enquadram num renascimento da democracia burguesa. Pode ser que daqui a uns anos dêem um salto e redescubram a luta pelo socialismo mas, para já…

Após receber a sua carta verifiquei que, por lapso, a encomenda com as revistas já tinha sido enviada para a sua morada. Recebeu-a? Aceite as minhas saudações

Cartas a JC – 1

Francisco Martins Rodrigues

Carta a LC – 1

26/2/1987

Caro J:

Claro que me lembro de ti e tive grande satisfação em receber a tua carta, por ver que não perdeste o norte, apesar destes anos de pausa, Quando se esteve envolvido na luta de classes, directa e brutal, sem disfarces, como foi o nosso caso no tempo da Pide, é muito difícil iludirmo-nos com histórias sobre a “importância de cada um viver a sua vida”. Viver a nossa vida, plenamente, é trabalhar por virar esta organização social, porque é isso que os tempos pedem. Ninguém pode escolher a época da sua vida e a nossa época tem esse problema em aberto, que lhe havemos de fazer? Se lhe virarmos costas, não nos libertamos de nada, estaremos apenas a desperdiçar a nossa vida. É por isso que eu não sinto a militância comunista como um sacrifício: faço aquilo de que realmente gosto e que me faz sentir vivo. Já há gente demais reduzida ao papel de joguetes cegos do capital, não tenho vontade nenhuma de lhe seguir o exemplo.

É claro que os nossos velhos planos de batalha estavam cheios de erros e isso contribuiu para muitas derrotas e para a actual fase de dispersão. Mas não serve de nada cairmos por isso no pessimismo e na amargura, lamentar “os anos perdidos”, como por aí se faz agora. A revolução é uma longa aprendizagem, não há outra forma de descobrir o caminho.

Se passares os olhos pelos números já publicados da nossa revista, verás as interrogações que nos colocamos e as respostas que procuramos. No eixo de tudo vejo esta ideia: a corrente ML revoltou-se com a passagem dos revisas para o campo da burguesia, mas teve medo de levar a crítica até ao fim e tentou salvar um pouco do compromisso operário-pequeno-burguês, que já vinha muito de trás. Foi um corte a 50%, que tentou combinar as ideias revolucionárias com um bocado da herança reformista. Por isso nos era impossível explicar a União Soviética de Staline, a IC, o maoísmo, a luta de classes em Portugal e no mundo. Por isso nos agarrávamos a citações e fórmulas feitas em vez de olharmos abertamente o presente e o passado com olhos marxistas. É muito estimulante poder fazê-lo agora. No “Anti-Dimitrov” (… poderá arranjar-to) comecei essa reflexão, que ainda está nos primeiros passos e que prosseguimos na revista.

Já deves saber pelo (…) o que somos: um pequeno grupo de propaganda que procura lançar as bases para um programa comunista e para um partido comunista, combinando a teoria e a prática. Edita- mos a revista, que é o nosso esforço principal, mas também vamos intervindo na acção política e sindical. (Começámos a publicar um pequeno jornal sindical, a “Tribuna Operária”). As condições actuais no nosso país não são nada favoráveis a este esforço, porque o movimento operário está amachucado pela derrota das ilusões de Abril (Povo-MFA) e a pequena burguesia intelectual atravessa uma fase de carreirismo, cinismo e descrença absoluta na classe operária. Mas isto não nos impede de reagrupar um núcleo de vanguarda que passe ao ataque quando a conjuntura mudar e possa formar uma corrente sólida capaz de influir nos acontecimentos.

No plano internacional, não descuramos nenhum contacto com grupos que se orientem num sentido semelhante ao nosso e já temos relações com comunistas dos EUA, Irão, Brasil, França, Itália. Todos fracos como nós, excepto os do Irão, mas todos dispostos a limpar o marxismo-leninismo de lixos reformistas. No que se refere à OCML de França, estamos interessados em conhecer melhor as suas análises e o seu percurso e encaramos a hipótese de uma deslocação minha a Paris para um debate organizado. Vamos estudar esses números da “Cause du Communisme” que mos envias, só conhecemos o “Partisan”, que recebemos regularmente.

Inteiramente de acordo em que publiquem artigos traduzidos da “PO”, o que aliás já lhes propusemos. Podes pois dar-lhes a tradução que fizeste para que eles corrijam a ortografia e mesmo suprimam partes que lhes pareçam de menos interesse para o leitor francês. Seguem junto as notas que pediste[i]. Publicámos no nº 8 da “PO” uma tradução condensada de um artigo do “Partisan”, seria bom mostrar-lhes. Mais importante que tudo: gostaria que te informasses junto do MV sobre o que é a OCPO, que criámos há cerca de dois anos e que nos dissesses em que aspectos estás interessado em colaborar. Ele pode dar-te diversos documentos, para teres uma ideia do que pretendemos e como funcionamos. Conheces “Para a história de uma cisão”? Ê um conjunto de cartas de diversos camaradas em que estão resumidas as razões da nossa ruptura com o PC(R). Também lhe podes pedir o Manifesto inicial da OCPO e outros documentos.

Para além da nossa correspondência, que espero se mantenha, seria muito bom termos uma discussão directa. Como a minha ida a Paris está por enquanto indefinida, seria muito bom se pudesses vir cá (em Junho seria o ideal). Diz-me como pensas que poderás colaborar na nossa actividade.

Uma forma de apoiares a revista, além da tradução de artigos, será enviares-nos algumas colaborações ou materiais para artigos, fazeres uma assinatura, angariares assinantes. Lutamos com grandes dificuldades financeiras, como calculas.

E por agora é tudo. Fico à espera de notícias tuas. Aceita um abraço do camarada

[i] NOTAS

Carlos Brito – líder parlamentar do PCP revisionista.

FP-25 (Forças Populares 25 de Abril) – grupo clandestino inspi rado nas ideias do “poder popular de base” que nos últimos 6 anos praticou uma série de atentados contra capitalistas, latifundiários, contra a NATO, etc. Desmantelado pela polícia, os seus activistas estão e ser julgados como “terroristas”, junta- mente com Otelo Saraiva de Carvalho, acusado de ser o “mentor” da organização.

ORA (Organização Revolução Armada) – grupo dissidente das FP-25 surgido em 1986 e que pretende dar continuidade às acções armadas “excitativas”.

SIS (Serviço de Informações de Segurança) – embrião de uma nova polícia política, que tem na chefia um colaborador da antiga PIDE de Salazar.

FAP (Frente de Acção Popular) – primeiro grupo maoista surgido em Portugal em 1964, de tendência guerrilheirista. Destruído pela polícia em 1966.

LUAR (Liga de União e Acção Revolucionária) – grupo armado surgido em 1968, liderado por socialistas radicais. Dissolveu-se algum tempo depois do 25 de Abril.

ARA (Acção Revolucionária Armada) – destacamento criado pelo PCP em 1970, levou a cabo atentados e sabotagens à guerra colonial.

BR (Brigadas Revolucionárias) – braço armado do PRP (Partido Revolucionário do Proletariado), de tendência anarquizante, actuaram no início dos anos 70.

 

[1] NOTAS

Carlos Brito – líder parlamentar do PCP revisionista.

FP-25 (Forças Populares 25 de Abril) – grupo clandestino inspi rado nas ideias do “poder popular de base” que nos últimos 6 anos praticou uma série de atentados contra capitalistas, latifundiários, contra a NATO, etc. Desmantelado pela polícia, os seus activistas estão e ser julgados como “terroristas”, junta- mente com Otelo Saraiva de Carvalho, acusado de ser o “mentor” da organização.

ORA (Organização Revolução Armada) – grupo dissidente das FP-25 surgido em 1986 e que pretende dar continuidade às acções armadas “excitativas”.

SIS (Serviço de Informações de Segurança) – embrião de uma nova polícia política, que tem na chefia um colaborador da antiga PIDE de Salazar.

FAP (Frente de Acção Popular) – primeiro grupo maoista surgido em Portugal em 1964, de tendência guerrilheirista. Destruído pela polícia em 1966.

LUAR (Liga de União e Acção Revolucionária) – grupo armado surgido em 1968, liderado por socialistas radicais. Dissolveu-se algum tempo depois do 25 de Abril.

ARA (Acção Revolucionária Armada) – destacamento criado pelo PCP em 1970, levou a cabo atentados e sabotagens à guerra colonial.

BR (Brigadas Revolucionárias) – braço armado do PRP (Partido Revolucionário do Proletariado), de tendência anarquizante, actuaram no início dos anos 70.

 

Cartas a PA – 1

Francisco Martins Rodrigues

Carta a PA (1)

22/11/1984

Amigo A.

Não tenho recebido notícias tuas e não sei se me conseguiste obter alguns dos livros que te tinha pedido, é natural que as tuas ocupações não te deixem tempo para respirar, mas temos que procurar manter contacto.

Tenho uma novidade que não sei como receberás, saí do PC(R) ontem mesmo, outros camaradas, entre eles o ZB e o JME, antigos dirigentes do partido, também saíram ou foram demitidos. Não foi uma decisão leviana, como calculas, mas fomos forçados a ela pela campanha de perseguições a que vínhamos sendo sujeitos desde há ano e meio. O conflito gira à volta de nós exigirmos que se levasse à prática a viragem à esquerda decidida pelo 4º congresso, de Março 83, e o CC estar a encostar-se cada vez mais aos elementos direitistas. Actualmente, todos os elementos “esquerdistas” estavam metidos em células de base, marginalizados e sujeitos a uma série de ataques. Já não nos davam o mínimo espaço para travar uma luta interna, os atropelos ao centralismo democrático por parte do CC eram diários e, em nome do perigo de fraccionismo, impunham-se as proibições mais absurdas à discussão, mesmo só dentro das células.

Lima das coisas que mais contribuiu para a agudização do conflito era um estudo que tenho andado a fazer sobre o 7º congresso da IC, reavaliando o relatório de Dimitrov e a linha de Staline nos anos 30-50 como fontes donde nasceu o revisionismo. Consegui acabá-lo, com grande dificuldade, e ontem mesmo o entreguei ao CC, para ver se é capaz de o criticar com o mínima de seriedade. É absurdo tentar congelar a crítica rnarxista-leninista em nome dos “princípios”, como vem fazendo o CC. Está a conduzir o PC(R) a um definhamento desastroso, no que têm graves responsabilidades, na minha opinião, o PTA e o PC do Brasil.

Gostaria que lesses o meu estudo e me desses uma opinião. Eu e outros camaradas que se afastaram ou foram afastados neste processo estamos dispostos a dar corpo organizada à nossa corrente de ideias. Somos marxistas-leninistas, queremos um partido comunista em Portugal e não nos resignamos à confusão, impotência e esvaziamento de ideias a que se chegou. A acusação de “anarco-trotskismo” que nos é feita não tem pés nem cabeça.

Gostaria de saber o que pensas disto tudo e se estás disposto a continuar a corresponder-te comigo, Isso depende naturalmente da tua atitude face ao PC(R). Poderias dar opinião sobre o meu estudo e outros materiais que temos em preparação, obteres aí livros e jornais, dares-nos contactos para grupas ou organizações estrangeiras, contactares camaradas da emigração, etc. Duma coisa te posso dar a certeza; vamos fazer um trabalho sério para renovar a corrente marxista-leninista, crítico, revolucionário, e virado para os operários avançados. Vamos fazer um trabalho preparatório para reorganizar o partido comunista no nosso país.

Seja o que for que pensares do sucedido, peço que me escrevas a dar a tua opinião. Se tiveres algum dos livros de que te falei, peço que mo envies. Se pensas vir a Portugal proximamente, gostaria de conversar contigo.

Um abraço

Cartas a MV – 52

Francisco Martins Rodrigues 

Carta a MV (55)

5/11/997

Caríssimo:

Estava justamente para te escrever porque os teus materiais têm chegado em barda, em tal ritmo que ficam muitos para leitura posterior. Não me posso queixar.

A PO seguiu, deves ter recebido depois do teu último bilhete. Como terás visto, acabei por fazer um breve resumo da tua nota sobre as rodriguices[1]. Falei com o Carretas, que não me pareceu muito empenhado numa guerra com essas bandas; e pela nossa parte, pareceu-me que à quase totalidade dos leitores seria impossível apreender o sentido da polémica. Conservei por isso o que me pareceu essencial: o elogio da peça e a crítica aos críticos. Tu dirás se achas bem Metemos também uma pequena recensão sobre o Albatroz e ainda a nota sobre o José Manuel Manuel Fernandes[2].

Agora espero uma Carta de Paris para o nº 62, que já começa a dar os primeiros passos. Tem que estar pronto antes do fim deste mês de Novembro, para recuperar o atraso do anterior. A regularidade da publicação tem sido ponto de honra nosso desde o princípio e não quero agora começar a ceder. Para o próximo número estou a preparar uma última resposta ao AN; mesmo que ele volte a responder não continuarei esta polémica, porque vai saltitando de tema para tema e porque usa um estilo acintoso que me é desagradável. Não quero entrar por esse caminho e parece-me já ter evidenciado as mazelas da sua cabeça. Além disso, ele aumenta sempre o tamanho das respostas, de tal modo que ameaça inundar a revista. Neste último, tivemos que guardar metade do artigo. Sai no próximo.

Tenciono também continuar o tema “Europa – o eclipse da revolução”, agora num plano mais actual, tentando responder à interrogação: actividade comunista em Portugal, hoje, o que pode ser? Com sindicatos? Com parlamento? Como fazer para que as reivindicações diárias concorram para acumular forças revolucionárias? Francamente, não sei onde está a resposta, é só para explorar o assunto. O facto é que, dando o balanço às minhas experiências “comunistas” até hoje, só vejo acumulação de forças reformistas, não revolucionárias, e isso tem a ver com a concepção geral dos métodos de luta, não pode ser atribuído apenas às inclinações oportunistas dos Cunhais ou Arrudas.

Estamos a preparar aceleradamente dois Dinossauros: a “Breve história do indivíduo”, do Thomas, agora em revisão final da tradução, e um texto de um professor do Senegal sobre a situação em África (umas 80 páginas) que me pareceu interessante e que ele me autorizou a editar[3]. Não vai ter venda nenhuma, mas é a nossa modesta contribuição para a Expo’98. Diz lá das boas sobre o imperialismo europeu. Assim que estiver pronto, mando-te.

Para o próximo Contraponto não sei se estás já a coligir algo. Proponho-me traduzir o artigo que me mandaste do Michael Lõwy sobre as ideias do Che. Achas bem? Diz-me se tens planos e não te descuides. Quanto ao abaixo-assinado a Estocolmo, acho bem gozado mas ficaria talvez mais eficaz se um pouco mais condensado. Meteste-lhe talvez ideias demais, e a piada sobre Aljubarrota parece-me uma excrescência. Mesmo a boca sobre o Nobel ao Egas Moniz talvez já desvie as atenções do essencial: temos valores pujantíssimos que o mundo não reconhece. Queremos um Nobel! Achas que os brasileiros devem vir na lista? A mim parece-me que o chauvinismo lusitano exige é um prémio para um dos nossos, estão-se marimbando para o Amado ou o Melo Neto. Foi de propósito que não mencionaste o Saramago e o Lobo Antunes? Ao que percebi, vai acesa a guerra e o Saramago promove-se descaradamente. Avança com o apelo Albatroz; mas não me peças para o traduzir, tem uma série de expressões que não domino, além de que é indecente, tu, um português de Guimarães, quereres que eu te traduza os teus texots do francês. Se isso se sabe por aqui, ficas queimado de vez.

Atenção à mudança de telefone e fax, mudámo-nos para a rua (…). . Os Douradores e o Ferragial[4] acabaram! Até breve, um abraço

—————-

[1] Referência ao jornalista José Manuel Rodrigues da Silva, ao tempo editor do Jornal de Letras, que fizera uma recensão sobre a peça ”Bolero”, acabada de encenar por José Carretas. (Nota de AB)

[2] Jornalista então editor do jornal Público. (Nota de AB)

[3] Crise africana. Alternativas, de Bernard Founou-Ttchuigoua, ed. Dinossauro, 1998. (Nota de AB)

[4] Anteriores locais de trabalho da Política Operária. (Nota de AB)

Cartas a MV – 33

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (39)

10/1/1993

Caro Camarada:

Passaste o Ano Novo numa boa? Espero que esteja tudo bem contigo, que tenhas recebido a minha carta de 10 de Dezembro e que estejas a redigir uma Carta de Paris para publicar na próxima P.O.. Aceita-se colaboração até 20 de Janeiro!

Por aqui, tudo sereno. O sol português, que não falha mesmo no Inverno, tem um efeito calmante sobre as lutas de classes. Estive ontem no Porto, convidado pelos estudantes para um debate na Faculdade de Direito da Universidade Católica (!), sobre «O futuro da esquerda». Participaram também o Barros Moura (Plataforma de Esquerda, ex- PCP), Alberto Martins (PS) e Alda de Sousa (PSR). Apesar do tipo de público, passei o tempo a falar de comunismo, derrubamento da ordem social estabelecida, crimes do capitalismo e sua condenação histórica, mentira das liberdades burguesas parlamentares e das soluções reformistas, etc. Só queria que visses os olhos esbugalhados dos moços, era a primeira vez na vida que ouviam tais coisas. É claro que daqui a uma semana já esqueceram tudo, mas ficaram a saber que os tais «dinossauros» comunistas existem mesmo. E os nossos amigos reformistas meteram os pés pelas mãos e ficaram – sobretudo o Alberto Martins – incomodados. Também te mando o artigo que saiu há um mês no «Público» sobre os rivais de Cunhal-

No campo internacional, depois do panorama desolador que te dei na última carta, vieram notícias melhores: no Irão, o Mansoor Hekmat fundou um novo Partido Comunista Operário cujas posições, expostas num boletim em inglês, «International», nos parecem sólidas. Transcrevemos um extracto na próxima P.O. O MLP dos EUA realizou o seu 4º Congresso, no qual se debateram as divergências e se admite a probabilidade de não poderem continuar como partido, mas se afirmam dispostos a preservar uma plataforma marxista-leninista e um núcleo coeso. Veremos.

Publicamos na próxima P.O. um resumo-comentário do livro de Tom Thomas sobre Ecologia, que nos pareceu arejado e bem esgalhado. Ele chegou a tomar conhecimento da crítica que fizemos ao outro livro dele? Deu alguma opinião? Podes mandar-me o endereço dele para eu lhe escrever directamente a ver se ele quer colaborar na P.O.? Do Serfaty, não veio até agora qualquer resposta à carta que lhe mandei. Ou está muito ocupado ou não se quer comprometer connosco. E o «Albatroz»? No teu último cartão dizes que está em preparação. Fico à espera.

É tudo por agora. Aceita um abraço.