Carta a JR – 1

Francisco Martins Rodrigues

Carta a JR – 1

17/2/1994

Caro Amigo:

Soube pelo OR do teu interesse em fazeres uma assinatura da P.O., pelo que aqui te mando o último número publicado (ele já me deu um cheque por um ano). Gostaria muito de conhecer a tua opinião sobre as posições defendidas na revista, nomeadamente sobre a questão da União Soviética, assunto sobre o qual fiz uma série de artigos de que te mando fotocópia. Talvez numa das tuas vindas a Lisboa se proporcione um encontro, que dizes?

Escrevo-te também para te propor colaboração numa iniciativa que vai explicada na circular junta: a edição de um livro pelo 20° aniversário do 25 de Abril, composto por depoimentos que retratem um pouco esse período para quem não o conheceu ou já o esqueceu. Se estiveres de acordo e entretanto não vieres tão cedo a Lisboa, poderias gravar um depoimento e enviar-me a cassete, ou então escrever um texto, até duas páginas dactilografadas. Fico a aguardar a tua resposta, tão breve como te seja possível.

Tenho grande satisfação em estabelecermos contacto. Aceita um abraço

Cartas a HN – 14

Francisco Martins Rodrigues

Carta a HN – 14

9/3/1999

Caro Camarada:

Espero que estejas de saúde, especialmente a tua mão. Algumas linhas, para pôr a escrita em dia. O teu artigo sairá na próxima P.O. Aproveitarei a tua autorização para fazer algumas condensações e pôr em destaque no título o concreto da tua proposta: um encontro de debate ideológico. Pode ser que, à força de insistir, se consiga motivar umas dezenas de camaradas para a ideia. Temos tido agora umas reuniões bastante concorridas (40 a 50 participantes) para tratar da comemoração do movimento popular do 25 de Abril. A ideia é pôr a falar numa sessão, para os jovens, sobretudo, alguns dos activistas das ocupações e manifestações daquela época. Será na tarde de 24, sábado. Vamos a ver o que se consegue. Peço que me devolvas o Apelo com as assinaturas que tiveres (mesmo que sejam só a tua e a do Z) até ao fim do mês. Tencionamos publicar e apresentá-lo numa conferência de imprensa, para incomodar os comemoradores oficiais, que preparam festas de espavento.

E quanto à Carta da Suíça, vamos ter alguma coisa? Se tiveres, manda até dia 20 o mais tardar. Ou recortes, se não tiveres artigo redigido. Para já, é tudo. Um abraço.

Carta a MF – 1

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MF – 1

6/6/1994

Caro Camarada:

Só agora respondo à tua carta porque só agora ficámos livres da tarefa do livro. O livro já foi posto à venda no dia 25 de Abril e está em distribuição nas livrarias. Chama-se “O Futuro Era Agora” e o teu depoimento foi incluído junto com mais cinquenta outros. Embora curto, o relato que nos mandaste focou aspectos importantes do movimento popular – o saneamento dos reaccionários nos quartéis e a intervenção do MFA no movimento da Reforma Agrária. Também recebemos a fotocópia do relatório sobre o 11 de Março mas daí não aproveitámos nada, por falta de espaço. O livro ficou com 230 páginas e acho que está a ser bem recebido. Da parte da imprensa ainda não tivemos nenhuma referência (a não ser uma nota curta no “Jornal de Letras”) mas as pessoas com sentimentos de esquerda têm-no apreciado. Fizemos uma venda no 25 de Abril e outra no 1º de Maio, com algum sucesso.

Devido ao interesse que mostraste em colaborar neste trabalho, venho propor-te que nos encomendes alguns exemplares que vejas que poderás vender aí na Suíça entre compatriotas. Nas livrarias está à venda a 2.400$00, mas nós, em venda directa através da «Política Operária» continuamos a fornecê-lo a 1.500$00. Junto dois prospectos de promoção. Se nos mandares um vale postal internacional nesse valor, com mais alguma verba para as despesas de correio, enviar-te-emos o livro na volta do correio.

Já agora, e como já foste em tempos assinante da “Política Operária”, envio como oferta o último nº publicado, com uma proposta para renovares a tua assinatura, que será uma forma de nos ajudares a continuar a nossa propaganda.

Caro camarada, mais uma vez obrigado pela tua colaboração e aceita um abraço

Cartas a JC – 1

Francisco Martins Rodrigues

Carta a LC – 1

26/2/1987

Caro J:

Claro que me lembro de ti e tive grande satisfação em receber a tua carta, por ver que não perdeste o norte, apesar destes anos de pausa, Quando se esteve envolvido na luta de classes, directa e brutal, sem disfarces, como foi o nosso caso no tempo da Pide, é muito difícil iludirmo-nos com histórias sobre a “importância de cada um viver a sua vida”. Viver a nossa vida, plenamente, é trabalhar por virar esta organização social, porque é isso que os tempos pedem. Ninguém pode escolher a época da sua vida e a nossa época tem esse problema em aberto, que lhe havemos de fazer? Se lhe virarmos costas, não nos libertamos de nada, estaremos apenas a desperdiçar a nossa vida. É por isso que eu não sinto a militância comunista como um sacrifício: faço aquilo de que realmente gosto e que me faz sentir vivo. Já há gente demais reduzida ao papel de joguetes cegos do capital, não tenho vontade nenhuma de lhe seguir o exemplo.

É claro que os nossos velhos planos de batalha estavam cheios de erros e isso contribuiu para muitas derrotas e para a actual fase de dispersão. Mas não serve de nada cairmos por isso no pessimismo e na amargura, lamentar “os anos perdidos”, como por aí se faz agora. A revolução é uma longa aprendizagem, não há outra forma de descobrir o caminho.

Se passares os olhos pelos números já publicados da nossa revista, verás as interrogações que nos colocamos e as respostas que procuramos. No eixo de tudo vejo esta ideia: a corrente ML revoltou-se com a passagem dos revisas para o campo da burguesia, mas teve medo de levar a crítica até ao fim e tentou salvar um pouco do compromisso operário-pequeno-burguês, que já vinha muito de trás. Foi um corte a 50%, que tentou combinar as ideias revolucionárias com um bocado da herança reformista. Por isso nos era impossível explicar a União Soviética de Staline, a IC, o maoísmo, a luta de classes em Portugal e no mundo. Por isso nos agarrávamos a citações e fórmulas feitas em vez de olharmos abertamente o presente e o passado com olhos marxistas. É muito estimulante poder fazê-lo agora. No “Anti-Dimitrov” (… poderá arranjar-to) comecei essa reflexão, que ainda está nos primeiros passos e que prosseguimos na revista.

Já deves saber pelo (…) o que somos: um pequeno grupo de propaganda que procura lançar as bases para um programa comunista e para um partido comunista, combinando a teoria e a prática. Edita- mos a revista, que é o nosso esforço principal, mas também vamos intervindo na acção política e sindical. (Começámos a publicar um pequeno jornal sindical, a “Tribuna Operária”). As condições actuais no nosso país não são nada favoráveis a este esforço, porque o movimento operário está amachucado pela derrota das ilusões de Abril (Povo-MFA) e a pequena burguesia intelectual atravessa uma fase de carreirismo, cinismo e descrença absoluta na classe operária. Mas isto não nos impede de reagrupar um núcleo de vanguarda que passe ao ataque quando a conjuntura mudar e possa formar uma corrente sólida capaz de influir nos acontecimentos.

No plano internacional, não descuramos nenhum contacto com grupos que se orientem num sentido semelhante ao nosso e já temos relações com comunistas dos EUA, Irão, Brasil, França, Itália. Todos fracos como nós, excepto os do Irão, mas todos dispostos a limpar o marxismo-leninismo de lixos reformistas. No que se refere à OCML de França, estamos interessados em conhecer melhor as suas análises e o seu percurso e encaramos a hipótese de uma deslocação minha a Paris para um debate organizado. Vamos estudar esses números da “Cause du Communisme” que mos envias, só conhecemos o “Partisan”, que recebemos regularmente.

Inteiramente de acordo em que publiquem artigos traduzidos da “PO”, o que aliás já lhes propusemos. Podes pois dar-lhes a tradução que fizeste para que eles corrijam a ortografia e mesmo suprimam partes que lhes pareçam de menos interesse para o leitor francês. Seguem junto as notas que pediste[i]. Publicámos no nº 8 da “PO” uma tradução condensada de um artigo do “Partisan”, seria bom mostrar-lhes. Mais importante que tudo: gostaria que te informasses junto do MV sobre o que é a OCPO, que criámos há cerca de dois anos e que nos dissesses em que aspectos estás interessado em colaborar. Ele pode dar-te diversos documentos, para teres uma ideia do que pretendemos e como funcionamos. Conheces “Para a história de uma cisão”? Ê um conjunto de cartas de diversos camaradas em que estão resumidas as razões da nossa ruptura com o PC(R). Também lhe podes pedir o Manifesto inicial da OCPO e outros documentos.

Para além da nossa correspondência, que espero se mantenha, seria muito bom termos uma discussão directa. Como a minha ida a Paris está por enquanto indefinida, seria muito bom se pudesses vir cá (em Junho seria o ideal). Diz-me como pensas que poderás colaborar na nossa actividade.

Uma forma de apoiares a revista, além da tradução de artigos, será enviares-nos algumas colaborações ou materiais para artigos, fazeres uma assinatura, angariares assinantes. Lutamos com grandes dificuldades financeiras, como calculas.

E por agora é tudo. Fico à espera de notícias tuas. Aceita um abraço do camarada

[i] NOTAS

Carlos Brito – líder parlamentar do PCP revisionista.

FP-25 (Forças Populares 25 de Abril) – grupo clandestino inspi rado nas ideias do “poder popular de base” que nos últimos 6 anos praticou uma série de atentados contra capitalistas, latifundiários, contra a NATO, etc. Desmantelado pela polícia, os seus activistas estão e ser julgados como “terroristas”, junta- mente com Otelo Saraiva de Carvalho, acusado de ser o “mentor” da organização.

ORA (Organização Revolução Armada) – grupo dissidente das FP-25 surgido em 1986 e que pretende dar continuidade às acções armadas “excitativas”.

SIS (Serviço de Informações de Segurança) – embrião de uma nova polícia política, que tem na chefia um colaborador da antiga PIDE de Salazar.

FAP (Frente de Acção Popular) – primeiro grupo maoista surgido em Portugal em 1964, de tendência guerrilheirista. Destruído pela polícia em 1966.

LUAR (Liga de União e Acção Revolucionária) – grupo armado surgido em 1968, liderado por socialistas radicais. Dissolveu-se algum tempo depois do 25 de Abril.

ARA (Acção Revolucionária Armada) – destacamento criado pelo PCP em 1970, levou a cabo atentados e sabotagens à guerra colonial.

BR (Brigadas Revolucionárias) – braço armado do PRP (Partido Revolucionário do Proletariado), de tendência anarquizante, actuaram no início dos anos 70.

 

[1] NOTAS

Carlos Brito – líder parlamentar do PCP revisionista.

FP-25 (Forças Populares 25 de Abril) – grupo clandestino inspi rado nas ideias do “poder popular de base” que nos últimos 6 anos praticou uma série de atentados contra capitalistas, latifundiários, contra a NATO, etc. Desmantelado pela polícia, os seus activistas estão e ser julgados como “terroristas”, junta- mente com Otelo Saraiva de Carvalho, acusado de ser o “mentor” da organização.

ORA (Organização Revolução Armada) – grupo dissidente das FP-25 surgido em 1986 e que pretende dar continuidade às acções armadas “excitativas”.

SIS (Serviço de Informações de Segurança) – embrião de uma nova polícia política, que tem na chefia um colaborador da antiga PIDE de Salazar.

FAP (Frente de Acção Popular) – primeiro grupo maoista surgido em Portugal em 1964, de tendência guerrilheirista. Destruído pela polícia em 1966.

LUAR (Liga de União e Acção Revolucionária) – grupo armado surgido em 1968, liderado por socialistas radicais. Dissolveu-se algum tempo depois do 25 de Abril.

ARA (Acção Revolucionária Armada) – destacamento criado pelo PCP em 1970, levou a cabo atentados e sabotagens à guerra colonial.

BR (Brigadas Revolucionárias) – braço armado do PRP (Partido Revolucionário do Proletariado), de tendência anarquizante, actuaram no início dos anos 70.

 

Cartas a LC (6)

Francisco Martins Rodrigues

Carta a LC – 6

9/2/1994

Caro Camarada:

Espero que a tua saúde vá melhor e que a tua situação no trabalho esteja estabilizada. Tenho recebido o teu material com regularidade. A lista dos 99 é uma óptima ajuda para a propaganda do livro [O futuro era agora], vamos mandar prospectos a todos eles. Fica descansado que os endereços ficam aqui reservados, só para usar em propaganda dos nossos materiais.

O livro tem estado a sair razoavelmente, foi muito bem recebido entre as pessoas de esquerda, mas a grande imprensa não disse praticamente nada, devem achar que são assuntos escabrosos, para esquecer. Está à venda nas livrarias e na Feira do Livro, vamos a ver se rompemos o bloqueio pouco a pouco. Mandámos os dois exemplares como disseste, um para o teu endereço e outro para tua filha, espero que tenham chegado em condições. Quanto aos teus comentários e notícias para a P.O., desta vez não deu para fazer uma carta de Hamburgo, por falta de espaço. Mas espero que continues porque queremos manter a secção no próximo número (agora só voltamos a sair em Setembro, por causa do intervalo das férias).

Se vieres a Lisboa em Agosto, telefona para o (…)  para entrarmos em contacto  e trocarmos umas impressões. Um abraço.

 

Carta a RB (1)

Francisco Martins Rodrigues

Carta a RB – 1

17/10/2000

Caro Camarada:

Com grande atraso respondo à sua carta. Tentei contactá-lo pelo e-mail mas não seguiu, deu a indicação de erro. Este é no entanto o indicativo que nos deu na sua carta. Por favor diga o que há.

Fizemos recensão na PO 74 do livro de Peter Robinson que nos enviou. Por acaso conhece ou pode obter-nos o livro “Portugal, the impossible revolution”, de Phil Mailer, Londres. 1977? Vimos uma referência elogiosa a esta obra e gostaríamos de a conhecer. Sempre que tiver publicações inglesas que ache interessantes por favor mande-nos pois gostamos de estar informados e dar a conhecer aos leitores o que se vai publicando lá fora. Espero que tenha entretanto recebido o livro “Abril traido” que lhe faltava.

A propósito dos 15 anos de publicação da PO vamos realizar uma sessão- debate no dia 4 de Novembro, com a participação de João Bernardo, marxista português radicado no Brasil, e de João Ricardo, trotskista brasileiro. Em 2 (ou 9) de Dezembro faremos outra sessão, para que convidámos o Samir Amin e o Tom Thomas. Se por acaso estiver em Lisboa numa dessas datas, fica já convidado. A PO 76. que receberá dentro de dias. traz a informação do local. etc.

Aceite as nossas saudações

Cartas a MV – 44

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (49)

5/6/1994

Caríssimo:

Com a P.O. na tipografia, venho pôr em dia a correspondência. Desde já. para te
tranquilizar: tenho recebido os teus cartões (o relato sobre o 25 de Abril parisiense sai na P.O. nas Cartas do leitor), assim como o vale de 10.000$. Enviei o livro para os cinco nomes que  indicaste.

Perguntas porque não inclui o livro depoimentos do Guinot, Vanzeller, Brochado, etc. Não
foi por falta de os contactarmos, mas por falta de tempo para irmos à procura deles de gravador na mão. Foi assim que arrancámos muitos dos testemunhos, à má fila. Todos se mostravam interessados na ideia mas quando chegava a hora de falar para o gravador ou de escrever, cortavam-se. O BC foi um dos primeiros que convidei mas nunca chegou a dispor-se. O R a mesma coisa. O G quando viu o livro ficou arrependido de não ter contado
a sua história, o B também. O Zé Cigano não respondeu ao nosso convite e agora soube
que tem andado cá pelo país e não nos procurou. É parecido contigo… O V não sei onde
pára. A propósito, disseram-me há dias que o Zé Machado morreu, não sei se de acidente ou de doença súbita.

O livro está a sair razoavelmente mas em venda directa, na nossa área! A distribuidora já o
colocou nas livrarias, está à venda na Feira do Livro, mas, sem referências na grande imprensa, prevejo uma venda fraca. Saiu uma nota curtíssima no
Expresso, outra no Diário de Notícias e uma pequena crítica no Jornal de Letras. Nada mais. O crítico do Público, apesar de muito namorado, não se dignou mencionar. Amanhã vou ao Porto a uma sessão da lançamento nortenha na cooperativa “Gesto”, vamos a ver se a imprensa do Norte diz alguma coisa. Temos que compreender que os rapazes da imprensa fiquem embaraçados com este tipo de literatura, são “guerras” que já não interessam, agora que estamos em plena revisão da história.

Não sei se acompanhaste, mas o 20° aniversário aqui foi dominado pela reavaliação “objectiva da guerra colonial, do Marcelo Caetano, da PIDE… num retorno desbragado da velha direita, dando-se ares de vítima dos “excessos revolucionários”. Não é só aí que andam ocupados em saber se a morte do Luís XVI foi injusta ou se o Pétain foi um “patriota”. Aqui segue-se a moda. De modo que a produção dinossáurica aparece quase como uma obscenidade, a silenciar. Deixa- os andar…

Quanto a novos títulos Dinossauro, julgo que de imediato não podemos pensar nisso,
temos que digerir primeiro o rombo económico desta edição. Apesar de a composição e
montagem serem feitas com o nosso trabalho militante, a despesa da tipografia é brutal. Coisas que tu conheces de sobra.

O Tom Thomas mandou-me a declaração e concorri ao pedido de subsídio para a edição do livro dele sobre Ecologia (o subsídio é apenas para a tradução) mas sem esperança nenhuma de ver dinheiro daí. Esse livro é uma das nossas hipóteses de edição
próxima, embora receemos a falta de interesse do grande público, se a imprensa não disser
qualquer coisa favorável (e não vai dizer, decerto). Mais lá para diante, pensava na hipótese de dar uma redacção unificada e melhorada aos muitos artigos que tenho publicado na P.O. sobre o fracasso das revoluções deste século. Assunto a pensar melhor. Enfim, as Edições, por enquanto vão a meio gás, até por falta de mão-de-obra para assegurar ao mesmo tempo a P.O.

Neste número da P.O. incluímos umas teses sobre as eleições do Parlamento Europeu,
acerca das quais gostava de conhecer a tua opinião. Temos discutido muito pouco o assunto Europa e só temos algumas ideias gerais. O panorama das candidaturas de “esquerda” é lamentável, é tudo reformismo, sem quaisquer rasgos de radicalismo. Frutos da época.

Vou enviar-te os 5 exemplares pedidos do livro e espero que a tua editora brilhe no
mercado da poesia. Um abraço, até breve.

 

Cem vítimas do fascismo

Francisco Martins Rodrigues

Distribuído no 1º de Maio de 1994

O regime de Salazar-Caetano foi ou não fascista? A PIDE foi ou não
uma organização de assassinos? Estas parecem ser as grandes questões
em debate, neste 209 aniversário do 25 de Abril. Para avivar a memória
dos “distraídos”, recordamos os nomes de cem vítimas, extraídos de um
folheto publicado em 1974 pela Associação de Ex-Presos Anti-Fascistas.
Com uma pergunta: os que se sacrificaram pela liberdade merecem
o espectáculo vergonhoso a que se assiste de reabilitação do
fascismo?
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Cartas a MV – 43

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (49)

5/5/1994

M:

Com que então, de férias outra vez! Ainda vais ser sujeito a um inquérito do colectivo! Espero que tenhas voltado com as baterias bem carregadas para mais produção
literária.

O livro O futuro era agora saiu. No dia 25 de Abril, lá estávamos nós com a nossa banquinha, na Rua Augusta, cheia de multidão, a apresentar o nosso produto. Vendemos duas dúzias de exemplares, porque as grandes massas estavam mais interessadas nas quinquilharias dos africanos e chineses e no espectáculo de canções que ia decorrer no Terreiro do Paço.

Depois, fizemos o lançamento formal, com todo o aparato (caro como fogo!), no Clube dos
Jornalistas; apareceram umas dezenas de amigos, mas jornalistas, só um! Vendemos mais
umas dezenas de exemplares. A seguir, veio o desfile do 1º de Maio (menos concorrido este
ano), em que distribuímos um panfleto que te mando junto e depois, fizemos um lanche de
confraternização. Vendemos mais umas dezenas de exemplares. Entretanto, negociei com
um distribuidor, que vai colocar o livro nas livrarias e ando a bater à porta dos críticos
literários dos jornais, para ver se se dignam fazer a sua recensão. É assim a vida. Tu
conheces bem este calvário, não é? Enfim, como só imprimimos mil exemplares e vem aí a
Feira do Livro, estou convencido de que, pouco a pouco, há-de ir saindo e que salvamos a
despesa.

E o trabalho em si? A nós, que andámos em corrida contra relógio, a coligir os
depoimentos, a cronologia, etc., deu-nos uma grande satisfação fazê-lo e reencontrar coisas
importantes que já não lembrávamos. O livro saiu limpinho e, apesar de alguns erros, não
nos envergonha. Pelas primeiras reacções, acho que a mensagem vai ser recebida, mas, é
claro, no círculo restrito dos que não se envergonham do 25 de Abril. Este ano, os festejos
do 20º aniversário foram “apimentados” com entrevistas a tudo o que é reaccionário;
tivemos que gramar os salazaristas a darem os seus arrotos contra o “populismo”, a
descolonização, os capitães.

A emulação entre as televisões para conseguirem mesas redondas mais chamativas levou a SIC (do Balsemão) a pôr o parvo do Tengarrinha a dialogar com um pide, com o entrevistador cheio de respeito a recolher as opiniões do “senhor inspector” (que foi justamente o chefe do bando que me torturou em 1966, um Óscar Cardoso, que no ano seguinte foi para Angola como chefe dos “Flechas”). A coisa foi tão sórdida que causou uma reacção geral de indignação, protestos, declarações em massa de ex-presos na rádio e na imprensa, mas, como seria de esperar, acabou por ser tudo capitalizado pelo PS, o arauto da democracia pluralista. Dei dois depoimentos para a TSF e um para o Expresso, mas foram de tal modo “sintetizados” que quase não ficou nada além do meu nome! Foi na sequência desta onda de protestos que fizemos o folheto das Cem Vítimas, que foi bastante bem recebido pelos manifestantes no 19 de Maio e se esgotou em menos de uma hora.

E que tal aí as comemorações pascácias do Prado Coelho e companhia? Estiveste
lá? Sempre conseguiste espalhar o teu papel? Foste preso como desordeiro?

Mandei-te um pacote com 5 exemplares do livro e, mais recentemente, um
exemplar, oferta para ti do editor. Recebeste? Já deste uma vista de olhos? Como creio que
te disse no bilhete que acompanhava os 5 exemplares, o teu texto teve que ser amputado
das partes que já não se referiam ao PREC, porque foi essa a norma que adoptámos para
manter a unidade do tema. Tivemos que fazer o mesmo com muitos outros testemunhos e
um trabalho diabólico de condensação das entrevistas gravadas. De qualquer modo, acho
que a tua colaboração fecha muito bem o conjunto dos textos.
Apesar de termos procurado
compor um mosaico representativo das diversas áreas da “extrema esquerda” da época, há
um peso excessivo de udps. Teria sido preciso mais tempo para chegarmos a outra gente,
mas mesmo assim os anarquistas não têm de que se queixar. O amigo V não saiu
porque me mandou um artigo quase à última hora, e em francês, para eu traduzir!! Disse-lhe que assim não dá, não sei se ficou zangado. Também já não tivemos braços para
considerar a tua justa sugestão de enumerarmos os filmes produzidos sobre o assunto.
Mais grave foi a falta de testemunhos de assalariados rurais e camponeses pobres, mas no
prazo que nos demos, não foi possível ir à busca deles. Fica para a edição do 25º
aniversário!

Agora conto com o teu empenho em promoveres o livro aí junto do pessoal portuga.
Mando junto duas folhas de propaganda, que te podem ajudar a vender a mercadoria. As
eventuais receitas revertem, tal como as da P.O., para o teu fundo de maneio, claro.

O Albatroz 10 chegou aqui já depois de estar distribuída a P.O. 44 e, com a corrida
em que nos metemos com o livro, teve que ficar para trás. Conto tratar da sua distribuição
junto com a próxima P.O., no fim deste mês. É um bocado tarde mas, francamente, não
estamos com disponibilidades para mais. O colectivo cá continua e, apesar de
conseguirmos mais um ou outro colaborador para a revista, gente para trabalhar é que não se arranja. Estamos no osso, esfalfados, e sem tempo para trabalharmos e pensarmos
temas de fundo.
Se puderes mandar-nos alguma colaboração até dia 20 de Maio, será uma
boa ajuda: não tens nada para dizer sobre as eleições para o Parlamento Europeu?

Mando também junto cópia de uma carta que envio hoje ao Tom Thomas. Será que
o podes contactar para acelerar a passagem da declaração que aí lhe pedimos? Ou tens
para nos sugerir algum outro texto que fosse interessante nós traduzirmos e editarmos pelo Dinossauro? A condição para nos candidatarmos ao subsídio é termos na nossa mão uma autorização escrita do autor até dia 30 de Maio e as obras devem obedecer a certos
critérios, como podes verificar pela folha do regulamento cuja cópia envio. Devido ao aperto do prazo, pensámos que o mais viável seria o livro do Thomas, que todos nós achámos interessante e adequado para dar uma pedrada nas teias de aranha ecológico-folclóricas cá do burgo. Diz o que pensas disto, mas depressa!

 

 

Cartas a MV – 42

Francisco Martins Rodrigues

Carta a MV (48)

9/2/1994

Caro M.:

Uma gripe que derrubou toda a gente lá em casa por alturas do fim do ano e depois a lufa-lufa da P.O. (vem hoje da tipografia) levaram-me a adiar sucessivamente a correspondência. Tenho recebido uma série de cartões teus a que só agora respondo, assim como o Albatroz 10. O teu comentário sobre a manif. da escola laica sai nesta
P.O. A nossa secção gráfica agradece a bolsa das cores que ofereceste e que lhes é muito útil.

Também recebi o teu desabafo sobre a militância do V, mas não estranhes, porque a partir de agora e até às legislativas (Outubro 95) vais ver mais gente a abraçar a “causa sagrada” do PS. Já se nota uma disputa acesa para lançarem a fateixa a todos os ex-esquerdistas que por aí andam desasados. Há umas semanas, na série de debates organizada pelo Museu República e Resistência (dependente da Câmara Municipal de Lisboa e portanto do PS), pude ouvir o “educador” Arnaldo Matos lançar um apelo a todos os que pertenceram a grupos maoístas para se encontrarem e debater experiências, para ver como ajudar a “esquerda democrática” a correr com o cavaquismo. Fez várias piscadelas de olho descaradíssimas em direcção ao PS e ao Soares. Em poucos dias, foi entrevistado em várias revistas e na televisão, repetindo, junto com as suas bacoradas “marxistas”, os mesmos acenos. Na apresentação da grande iniciativa do Soares para Maio, o controverso congresso “Portugal – Que Futuro?”, ele lá estava na primeira fila, junto com os pcs, udps, mdps, etc. Para mim, o homem está a soldo do Mário Soares para ver se recupera orlas da esquerda que por aí andam perdidas e metê-las na “grande frente democrática”.

Por aqui podes ver como os chefes social-democratas estão a dar tudo por  conseguirem a
maioria em 95. E têm razão em se esforçar porque sondagens recentes continuam a dar o primeiro lugar ao Cavaco na preferência dos eleitores. Apesar da crise, dos despedimentos, do “aumento” negativo nos salários, de escândalos diversos e feios. Por aí vês como o PS é “amado” pela grande massa e como precisa de angariar nomes e apoios, seja onde for. O caso do teu amigo V é só um no meio da enxurrada.

Houve recentemente umas oportunidades de intervenção pública. Falei na série de palestras do Museu República e Resistência (Dezembro) sobre o maoísmo em Portugal. Estava bastante gente, interessada, e as perguntas e respostas prolongaram-se por um bom bocado. No dia seguinte, falou a Ana sobre a revolução chinesa e a mulher, também com bastante interesse. Noutros dias falou o Arnaldo, o Pacheco Pereira (hoje PSD) e o Pedro
Baptista (hoje plataformista).

Há dias estive noutro debate no Porto, organizado pela Amnistia Internacional, sobre
a Democracia, com o Mário Brochado Coelho e uma professora Helena Vilaça. Houve bastante controvérsia e estive entretido a deitar abaixo as bacoradas “pós-modernistas” do rapaz da Amnistia e a falar para espectadores embasbacados sobre a luta de classes e a ditadura da burguesia. Muito estimulante.

Fui também convidado para entrar num debate na RTP1 sobre Mao mas recusei-me e acho que fiz bem porque só faltava mandarem-me pôr de gatas para ter direito à palavra Os teus amigos Louçã, Arnaldo e Baptista é que não se importaram e lá estiveram a palestrar. Falo nisso na P.O., tu verás.

Albatroz – O A fez uma recensão na P.O. Por mim, gostei particularmente da lista das malfeitorias mitterrandistas. Achei a parte poético-literária demasiado extensa para o meu gosto. Estava à espera de mais sumo político. Mas não faças caso, já sabes que eu sou obcecado. Tu disseste num dos teus bilhetes que nos enviarias 20 exemplares para ensaiarmos alguma distribuição mas até agora não chegaram. Desististe?

20º aniversário do 25 de Abril – Todos os estados-maiores partidários afiam o dente para capitalizar aquilo que lhes convém da data. Entre nós, temos andado a debater a possibilidade da edição de um livro que coleccione depoimentos, artigos e materiais diversos, no sentido de mostrar à nova geração que os 19 meses da “bagunça”
foram os mais criadores da nossa história moderna e de contrastar as iniciativas avançadas desse período com a pasmaceira derrotada em que hoje vivemos. Será que podes dar a tua colaboração a esta ideia, com materiais originais ou outros já anteriormente editados e que tivesse interesse dar a conhecer? Será que nos podes indicar
pistas, nomes a contactar, dar sugestões de trabalho, etc.? Podes enviar dados para a cronologia e a bibliografia? O problema aqui vai ser a escassez do tempo para coligir os materiais e pôr o livro na rua até ao 25 de Abril. Responde rapidamente, por favor, para sabermos se podemos contar com algo da tua parte.

Tenho continuado a receber o “Courrier”. Há semanas, em resposta a uma pergunta tua, dizia que, se pagas a assinatura não vale a pena, porque pouco colhemos desta revista. Recebeste essa minha carta?

Tomámos nota e vamos passar a mandar directamente 5 exemplares da P.O. para a Lusophone. Vou-lhes escrever a anunciar o envio, o preço de venda de 15 francos e a dizer que tratem de tudo contigo.

Recebi 5 novas edições albatrosianas de poesia. Tomáramos nós ser capazes de lançar livros a este ritmo! Mas as edições Dinossauro estão em marcha, o livro sobre o 25 de Abril será o primeiro. E se tu viesses para cá uns meses ajudar a organizar o livro?

Enviei o disco “Obrigado Otelo” para o assinante que me tinha pedido, agora gostava de saber o preço para lho cobrar, não há razão para lhe oferecermos um disco que certamente te custou dinheiro a ti. E, para já, é tudo.

Por aí, tudo bem? Abraços.