Francisco Martins Rodrigues
Carta a HN – 8
21/10/1996
Caro Camarada:
Estou a responder às tuas cartas de 3 e 6 de Setembro, desejando que te encontres de saúde e com a energia do costume. A P.O. 56 está na tipografia, esperamos poder fazer a distribuição amanhã. Como verás quando a receberes, houve desta vez acumulação de textos grandes, que nos obrigaram a retirar várias colaborações, entre elas o depoimento que enviaste. Fica para a próxima, tal como um artigo meu que tenho vindo a trabalhar, sobre o tema do Imperialismo. O Bitot é muito interessante e esclarecedor, mas no segundo livro dele, “Le Communisme n’a pas encore commencé” (que só existe em francês), apresenta, quanto a mim, uma forte incompreensão do fenómeno do imperialismo. O AN, embora lhe faça algumas críticas acertadas, na troca de cartas que publicamos nesta P.O., também acaba por lhe fazer algumas concessões e desvaloriza o trabalho de Lenine a este respeito. Espero por isso poder publicar na próxima P.O. um artigo claro sobre este assunto. Se se percebe a mecânica da concentração do capital mas se omite a espoliação e opressão dos países ricos sobre os países pobres, vamos por mau caminho. E muito fácil a quem vive na Europa esquecer-se que o avanço capitalista repousa sobre biliões de miseráveis do Terceiro Mundo.
Quanto ao depoimento-proposta que assinas em conjunto com o JM, ele retoma uma preocupação que já exprimiste anteriormente numa outra colaboração saída na P.O.: tomar medidas práticas para sair do impasse a que chegámos, atrevermo-nos a criar um núcleo orgânico, mesmo pequeno como seria esse Centro Marxista Popular, para tentar crescer a partir daí. Só posso apoiar a ideia e espero que a publicação do artigo desperte algumas vontades adormecidas. Tencionamos fazer até ao fim do ano um encontro com alguns camaradas e aí tentaremos ver a receptividade à ideia. Mais não te posso dizer, pois como deves ter constatado quando da vossa visita a Portugal, o problema actual do grupo P.O. é estar reduzido a tão poucas pessoas activas que fica esmagado só pelas tarefas da edição da revista, de um ou outro livro e da gestão da gráfica. Fizemos em Junho uma pequena reunião e os resultados não foram nada animadores, pois amigos que outrora já foram activos e agora estão desmobilizados só abrem a boca para pôr defeitos à P.O. e quando solicitados a colaborar no melhoramento, respondem que a sua vida não permite…
Enfim, creio que a atitude destas pessoas só se modificará quando algum acontecimento da luta de classes, nacional ou internacional, as sacuda do torpor e desânimo em que caíram. Há que confiar que gente nova também aparecerá, por força. Mas voltando ao teu artigo: proponho-me portanto incluí-lo na próxima P.O., fazendo alguns melhoramentos de redacção, desde que me dês autorização para isso. Para além das emendas que indicas na tua carta, eu aconselhar-te-ia, em futuros escritos, a usares mais a frase curta, porque as ideias encadeadas umas nas outras em frases muito extensas obrigam o leitor a muito maior atenção e daí até ao cansaço e ao pôr a leitura de lado vai só um passo…
A entrevista com a MM vem já neste número. Peço que lhe dês as minhas saudações e o pedido de que nos prepare um artigo sobre a condição da mulher trabalhadora na Suíça, como ela diz no fim da entrevista. Factos concretos, sem preocupações de teorizar muito. Pode ser bem interessante.
Assinatura P.O. — a tua assinatura está válida até ao nº 59, não precisas de te preocupar. Quando estiver prestes a caducar receberás um postal de renovação. Espero que nessa altura decidas assinar, caso contrário vou aí ajustar contas contigo.
Livro soviético sobre a religião — não sei do que se trata, lamento não te poder ser útil.
História do PC — já vem neste número um primeiro artigo, agora quero ver se mantenho a passada; material não me falta, com base na minha experiência. Vamos a ver se os artigos não ficam muito chatos, os leitores de hoje já pouco se interessam por essas histórias de outros tempos.
Dinossauro — o monstro sai da toca na próxima quinta-feira, para apresentar mais um trabalho: a novela “Kianda – O Rio da Sede”, do capitão Álvaro Fernandes, que foi pessoa muito em destaque na altura do Verão Quente de 75 pelo seu apoio à corrente da extrema-esquerda. São episódios da guerra colonial contados por quem lá esteve; a piada é ele dar alternadamente a luta vista do lado dos portugueses e do lado dos guerrilheiros. Pode ser que mais algumas cabeças deste país comecem a perceber que aquilo foi um crime colectivo em que não só o Salazar teve culpas. Agora que o ambiente por aqui é todo de regresso a África, creio que o livro é oportuno. Mando-te para já 3 exemplares, para tu e o Z angariarem por aí alguns compradores. As próximas edições Dinossauro ainda não se sabe quais são e quando são, tudo depende das massas, que estão curtas…
Jornais suíços — recebemos a batelada e vi que o Quotidien é progressista, mas para a próxima agradeço que mandes só os recortes do que te parecer mais útil para nós. Recebemos vários números do Solidarité mas só o que tu nos mandaste, não temos nenhuma assinatura.
Contraponto — Combinámos com o MV Vaz ele continuar em Paris a coligir os materiais, fazer e expedir pelo correio (o que ele diz que pode conseguir sem grande despesa), dando-nos a conhecer previamente o conteúdo de cada número. Aguardo agora notícias dele a este respeito, vou-lhe escrever.
Máquina de escrever eléctrica — Esse artigo está muito desclassificado nesta era dos computadores. Ainda não me informei mas vou saber e digo-te.
Marx e Engels em português — Conhecermos o seguinte, além do Capital . ——————- . Queres algum deles?
Por agora é tudo. Aceita um abraço