Proposta de Manifesto – 1984 (8) Tarefas da revolução mundial

Francisco Martins Rodrigues

Tarefas da revolução mundial

Encerrado em derrota o segundo ciclo da revolução proletária mundial iniciado com a revolução russa, um novo ciclo começa a perfilar-se no horizonte.

Ê sua condição necessária a demarcação mais funda entre os interesses revolucionários do proletariado e os interesses reformis­tas da pequena burguesia. Hoje, quando as diversas correntes pequeno-burguesas conseguiram apagar por toda a parte essa linha de demarcação, apropriar-se do marxismo e meter o proletariado no campo “popular”, “democrático” e “patriótico”, a crítica da ideologia pequeno-burguesa em todas as suas variantes – revisio­nista, centrista, social-democrata – é a pedra de toque da nova corrente comunista.

O proletariado só se pode orientar com independência na con­fusão dos antagonismos sociais do mundo moderno se reconhecer duas grandes contradições de classe, que concentram todas as ou­tras: a contradição proletariado-burguesia e a contradição dos centros imperialistas entre si.

Assumiu uma agudeza sem precedentes a contradição entre os di­versos centros rivais da burguesia imperialista. Com a centrali­zação do capital financeiro, o avanço tecnológico e o surgimento das novas potências imperialistas que são a União Soviética e a China, exacerba-se como nunca a concorrência entre grupos monopo­listas, entre o sistema capitalista de mercado e o sistema do capi­talismo de Estado, entre o punhado das grandes potências (Estados Unidos, União Soviética, Japão, China, Alemanha Federal, etc.).

Dominada pelo monopólio nuclear dos dois supergrandes, esta contradição desdobra-se num jogo incessante de alianças, confli­tos e realinhamentos, em busca do domínio do mundo. Lutar pela conquista de mercados e fontes de matérias-primas cada vez mais vastos é a natureza inerente a todo o capitalismo, que torna inevi­táveis as guerras e a exportação da contra-revolução.

A ONU e outros organismos internacionais regulam estes confli­tos selvagens de acordo com a correlação momentânea de forças, mas não podem suprimi-los.

Entretanto, a contradição proletariado-burguesia invadiu todos os cantos do globo e tornou-se dominante em todas as formações so­ciais – no Ocidente como no Leste, como no “Terceiro mundo”. A apropriação capitalista de mais-valia governa toda a actividade económica mundial.

A grande diferença entre o ciclo de revoluções que fermenta no mundo e o anterior está na ampliação da presença da classe operária nos países outrora camponeses. Sob a acção revolucionária do capital financeiro, saltaram para uma nova forma de capitalis­mo dependente as sociedades feudais do Oriente e as sociedades tribais africanas. Cada vez mais, a luta dos povos oprimidos contra o imperialismo entra na órbita da luta mundial entre proletariado e burguesia.

A polarização das contradições de classe mundiais deixa para trás a época das revoluções nacional-democráticas conduzidas pela burguesia. Entaladas entre o imperialismo e as massas operárias e camponesas, as burguesias nacionais dos países dependentes perdem toda a capacidade revolucionária. A única saída que encontram pa­ra compensar a sua impotência face ao imperialismo é recorrer à sobre-exploração e a repressão sobre as massas, à venda da inde­pendência nacional, ao endividamento ruinoso.

Por isso a política “trimundista”, ao apostar no anti-imperialismo das burguesias nacionais, se saldou por um fracasso e se re­velou como um expediente demagógico do imperialismo chinês nas­cente. A revolução tomará forçosamente características diferen­tes segundo a correlação concreta das forças de classe em cada um dos países dependentes, mas só a classe operária pode conduzi-la a bom êxito, em luta contra a sua própria burguesia.

A contradição entre os centros imperialistas rivais conduz à guerra. A contradição entra o proletariado e a burguesia conduz à revolução. Só o avanço da causa da revolução proletária pode deter as guerras e massacres imperialistas e a ameaça duma terceira guerra mundial nuclear. Só na medida em que o proletariado de cada país se liberte das cadeias do reformismo e do nacionalis­mo e da chantagem pacifista e faça progredir a sua luta revolucio­nária pelo socialismo, pode o mundo ser conduzido para fora do caos imperialista.

A tarefa invariável dos comunistas é pois dirigir em cada país os golpes do proletariado contra a sua própria burguesia, pela conquista do poder de Estado, libertando-se das armadilhas “nacio­nais”, que poupam a burguesia a pretexto da luta contra o imperialismo, e das armadilhas “populares” intermédias oferecidas pela pequena burguesia como último recurso para desviar a marcha da revolução.

Só no decurso do processo revolucionário, conduzido pelo prole­tariado com inteira independência, pode este operar um reagrupamento das forças sociais intermédias em torno de si e aprofundar ininterruptamente a revolução, e isto tanto nos Estados Unidos como na União Soviética, em Portugal como na Nicarágua ou na Ín­dia.

A luta revolucionária independente do proletariado exige a concentração dos seus golpes contra o imperialismo norte-americano, como seu inimigo principal à escala internacional.

Embora os Estados Unidos e a União Soviética sejam as duas superpotências inimigas dos povos e da revolução, iguais no plano militar, a vantagem no plano financeiro, tecnológico, comercial, vai toda para o campo do imperialismo norte-americano. A preten­são da União Soviética a disputar-lhe a chefia do mundo através do apoio aos movimentos nacionais burgueses e pequeno-burgueses saldou-se até agora pelo fracasso. O capital financeiro norte-ame­ricano penetra mesmo já profundamente nos países do Comecon.

A entrada recente da China na cena das potências imperialistas deslocou ainda mais a vantagem para o campo norte-americano, que ganhou um aliado poderoso.

Aos comunistas não basta rejeitar a linha revisionista, que serve a União Soviética na sua disputa com os Estados Unidos, e a linha social-democrata, lacaia dos Estados Unidos contra a União Soviética £ necessário rejeitar também a linha centrista que, a pretexto de pôr as duas superpotências em pé de igualdade, favore­ce de facto a que é indiscutivelmente mais forte, o imperialismo norte-americano.

Contra os Estados Unidos, bastião da contra-revolução no mundo, sustentáculo de regimes fascistas e racistas, tem que ser dirigido o golpe principal da luta operária. Na medida em que esse golpe siga uma linha proletária revolucionária e se emancipe do democratismo burguês, ele será também um golpe no social-imperialismo, res­tringirá a sua influência e ajudará a cavar a sua sepultura.

No centro dos esforços da nova corrente comunista tem que estar a reconstituição da Internacional Comunista. Só com esse passo será finalmente liquidada a infiltração nacionalista e reformista que levou à dissolução da IC, como já levara anteriormente à de­sagregação da II Internacional. Hoje, mais do que no tempo de Marx, os interesses do comunismo só podem prevalecer na medida em que rompam a barreira das fronteiras nacionais, dentro das quais o proletariado fica manietado pela burguesia. A recusa do PC da China e posteriormente do PT da Albânia a avançar para a recons­tituição da IC é mais uma prova do seu centrismo.

A Internacional não renascerá contudo por simples proclamação.

Não depende dum acto de vontade mas da clarificação da linha co­munista na época actual. Para esse objectivo devem convergir os esforços dos partidos e grupos comunistas, a fim de, através dum processo de contactos em pé de igualdade, elaborarem as bases do programa da nova Internacional.

Teses apresentadas por FMR à I Assembleia da Organização Comunista Política Operária (OCPO)