Francisco Martins Rodrigues
A crise do comunismo
Não é só em Portugal que os operários estão reduzidos a servir de força de apoio dos reformistas e liberais. A crise das ideias comunistas é internacional. A burguesia conseguiu convencer os operários de que no mundo de hoje já não há lugar para a revolução proletária e para o marxismo-leninismo. Argumentos para isso não lhe faltam:
- as revoluções guiadas pelas ideias do comunismo, a começar pela revolução russa, mudaram a face do mundo e arrancaram um quarto da Humanidade ao atraso e à miséria feudais, mas hoje, nos países ditos “socialistas”, a classe operária é explorada e não dispõe do poder nem de liberdade. Daqui a conclusão de que a ditadura do proletariado seria uma utopia, a servir de capa para novos regimes tirânicos. O capitalismo sobrevive a guerras, crises e revoluções e cria um arsenal produtivo cada vez mais poderoso. Portanto, poderia haver esperança em que o avanço tecnológico acabe por fazer entrar a Humanidade numa nova era de -abundância e liberdade sem necessidade de revolução.
- a classe operária moderna é já muito diferente do proletariado a que Marx atribuíra a missão de coveiro do capitalismo, ganhou melhores condições de vida e entrelaça-se com a massa crescente dos técnicos e empregados. Isto seria a prova de que está a nascer uma nova classe operária, que poderia conquistar através de reformas os seus direitos essenciais.
- os camponeses tomam em todo o mundo o caminho das cidades, os povos coloniais ganharam a independência. Teriam portanto desaparecido as duas grandes forças que Lenine considerava como os aliados revolucionários do proletariado.
- finalmente, o poder das multinacionais, a ameaça nuclear, os novos meios de comunicação, a revolução nos hábitos sociais, ligaram estreitamente todos os continentes num mesmo destino comum. Seria necessário portanto substituir a ideia marxista da revolução mundial e do internacionalismo proletário pelo entendimento e pelo diálogo entre as nações.
Não é difícil mostrar que a propaganda burguesa se apoia em factos reais para vender conclusões falsas.
Todos sabem que o avanço tecnológico e a estabilidade dos Estados Unidos, da Europa, do Japão, da União Soviética, repousam sobre a miséria, a fome e o terror da África, da Ásia e da América Latina. As possibilidades ilimitadas de bem-estar criadas pela indústria moderna são canalizadas para a produção de armas de destruição massiva. O progresso acentua a ditadura dos países ricos sobre os países pobres. O fim do colonialismo, louvado como uma grande conquista, deu lugar a regimes tirânicos de novas burguesias corruptas.
Apresenta-se o quadro duma nova classe operária próspera e culta e privilegiada, para esconder a miséria das grandes massas proletárias do mundo inteiro, sujeitas a uma exploração desenfreada e ao desemprego, manipuladas pela nata dos especialistas e burocratas que falam em seu nome.
Condena-se a falta de liberdades nos países de Leste como se no Ocidente não houvesse ainda maior abundância de regimes opressores, sustentados pelas “democracias”. Condena-se o “totalitarismo” do Leste como fruto do socialismo, para esconder que a tirania nesses países se desenvolveu precisamente sobre a decadência do socialismo, da ditadura do proletariado e do poder soviético. Apresentam-se os regimes parlamentares como modelo de democracia para fazer esquecer que servem de instrumento ao poder absoluto do grande capital e à acumulação de lucros fabulosos.
Renova-se a esperança numa via social-democrata de transição gradual para o socialismo, como se os governos social-democratas não tivessem produzido até hoje apenas bons negócios para a finança e massacres de operários. Espalha-se a esperança na paz e igualdade entre as nações através da ONU, como se a ONU não fosse governada pelas grandes potências. Acena-se com o programa de “desarmamento geral e completo”, como se não fosse à sua sombra que tem prosseguido o armamento geral e completo de todos os países do globo.
Contudo, num ponto há que dar razão aos adversários do marxismo. Não há hoje país nenhum em que exista um partido comunista, autenticamente marxista, capaz de conduzir a classe operária à revolução. Os partidos que se dizem comunistas utilizam o apoio operário para praticar um evolucionismo reformista vulgar. A crise do movimento marxista é um facto indesmentível. A crise do pensamento marxista também. As suas diversas escolas, do revisionismo soviético à “ortodoxia” albanesa, encobrem a ausência de respostas para as aspirações da classe operária com pedaços duma teoria dogmática e fossilizada. Nada resta do poder crítico e revolucionário que em tempos fez a força demolidora do marxismo.
Donde vem esta crise do movimento operário revolucionário e das ideias do comunismo? Ela vem de facto das novas condições do mundo moderno, sobretudo daquelas que a burguesia procura esconder.
Teses apresentadas por FMR à I Assembleia da Organização Comunista Política Operária (OCPO)