A greve de 1943

Francisco Martins Rodrigues

Mais de 50 mil operários em greve durante uma semana na região de Lisboa, pondo em xeque o governo de Salazar, dando nova autoridade política à classe operária e ao seu Partido Comunista e abrindo novos caminhos para a insurreição popular antifascista — eis o que significou a grande greve de 27 de Julho a 4 de Agosto de 1943.

Num relatório apresentado dois meses depois ao IV Congresso do Partido, o camarada José Gregório (Alberto) focava algumas lições desta greve que é oportuno relembrar.

 UNIDADE E COMBATIVIDADE OPERÁRIA

O traço marcante da greve, assinalava o relatório, foi a unidade e combatividade operária. Em Lisboa, Barreiro, Almada, Seixal, Alhos Vedros e também no norte, em S. João da Madeira, paralisaram todas as grandes empresas num movimento irresistível de unidade e solidariedade.

Milhares de operários largaram o trabalho e vieram para a rua, em manifestações e marchas da fome, que lançaram o pânico nos governantes.

Era a fome que assim levantava os operários. Protestavam contra a proibição governamental de aumentos de salários. Protestavam contra o racionamento e as bichas, enquanto os ricos tinham o que queriam e comboios carregados de géneros saíam para a Alemanha nazi. Contra as horas extraordinárias obrigatórias pagas sem aumento. Contra o novo desconto para o abono de família. Contra o espectáculo dos açambarcadores, mixordeiros, volframistas, industriais e governantes passeando-se em carros de luxo e amontoando milhões de contos nos bancos.

O PARTIDO

Uma greve destas não podia surgir espontaneamente. A indignação e o desejo de luta dos operários foram organizados e orientados pelo Partido. À frente do Comité de Greve estava o camarada Alfredo Diniz (Alex) do Comité Central. As células de empresa, que o Partido se lançara a criar e a fortalecer metodicamente desde 1941 no lugar das tradicionais e estéreis células de bairro, foram o alicerce de toda a luta.

O Partido dirigia porque tinha uma linha política justa. Os 9 pontos-programa, apresentados em Março, eram a alavanca unificadora das massas: derrubar o governo, instaurar um governo democrático de unidade nacional, impor as liberdades, castigar os fascistas e tubarões, abolir as leis corporativas, reconhecer a liberdade das colónias, realizar eleições livres para uma Assembleia Constituinte.

VITÓRIA OU DERROTA?

Ao fim de uma semana, os operários começaram a voltar ao trabalho sem terem imposto as suas reivindicações. As prisões em massa, os espancamentos e torturas, as empresas encerradas, os bairros operários sob ocupação militar, forçaram-nos a recuar.

Quer isto dizer que a greve foi derrotada? Não. A greve foi vitoriosa apesar dos sacrifícios, afirma o relatório de José Gregório:

—           porque saiu do âmbito económico inicial e se tornou numa grande luta política que abalou a ditadura salazarista;

—           porque trouxe a classe operária para o primeiro plano, atraiu para o seu lado grandes massas camponesas e de empregados e criou um novo alinhamento de forças;

—           porque impulsionou novas grandes lutas de massas e mostrou o verdadeiro caminho da vitória, para além das inúteis conspirações militares;

—           finalmente, porque arrancou a curto prazo a melhoria das condições de vida dos trabalhadores.

A grande greve de 1943, marco histórico do movimento operário e antifascista do nosso país, não desembocou na crise revolucionária que o fim da guerra mundial fazia prever. A política oportunista de Cunhal roubou ao Partido e ao proletariado os frutos desta grande luta. Noutros artigos estudaremos esta questão.

Bandeira Vermelha nº 142, 4 Out 1978

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